"As autoridades da Generalitat valenciana [governo regional de Valência] vulneraram o direito à vida e à integridade física de centenas de pessoas e puseram em risco milhares por não lhes ter prestado informação acessível e a tempo sobre a natureza e o nível da catástrofe", diz a Amnistia Internacional num comunicado com as conclusões de um relatório que divulgou hoje sobre as cheias de 29 de outubro, que provocaram 227 mortos na província de Valência.
A investigação realça, por outro lado, "a falta de coordenação" entre os diferentes níveis de governo (local, autonómico e central) nos primeiros dias após as inundações e "a falta de um foco baseado nos direitos humanos, contando com a participação efetiva das vítimas", o que "contribuiu para uma sensação de abandono" das populações.
"Esta gestão negligente constitui, portanto, uma violação do direito à informação, conforme à jurisprudência do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que estabelece que a obrigação do Estado de salvaguardar vidas inclui a obrigação de informar adequadamente a população sobre qualquer emergência potencialmente mortal", lê-se no relatório da ONG.
"O Estado espanhol, nos seus distintos níveis, não cumpriu com as suas obrigações internacionais de direitos humanos e, portanto, é necessária uma prestação de contas, através de investigações exaustivas que garantam verdade, justiça e reparação às vítimas", afirma, citado no comunicado da ONG, o autor do relatório e investigador da Amnistia Internacional Daniel Canales.
O documento realça que era responsabilidade "direta e inequívoca" do governo regional, liderado pelo Partido Popular (PP, direita) "adotar as medidas necessárias para alertar a população e garantir a sua proteção".
Quanto ao Governo central (uma coligação de esquerda liderada pelos socialistas), "não exerceu a faculdade que lhe reconhece a Lei Nacional de Proteção Civil para assumir a gestão da emergência", aponta a organização.
Para a Amnistia Internacional, a responsabilidade internacional do Estado espanhol neste tipo de emergências "é unitária" e "não pode ser iludida alegando o desenho institucional interno ou a divisão de competências".
O relatório da ONG analisa, por outro lado, "as consequências desestabilizadoras" nos "direitos humanos das pessoas afetadas" da desinformação e informação falsa associada às cheias que circulou, sobretudo nas redes sociais, no dia do temporal e seguintes.
A este propósito, considera que a melhor forma de prevenir as consequências negativas da desinformação numa situação como esta é a criação pelas autoridades de um sistema fiável e rápido de informação precisa.
Nas conclusões do relatório, a Amnistia Internacional deixa 14 recomendações aos governos regional e central, ao Ministério Público e aos municípios.
Entre essas recomendações estão a promoção de investigações penais sobre as cheias de 29 de outubro, a revisão dos sistemas de comunicação e avisos à população ou o desenvolvimento de "planos de formação em emergências".
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