"Foi uma das coisas bonitas que eu tive o privilégio de viver. Vivíamos um pouco fechados na nossa triste condição de exilados. Exilados, políticos e portugueses", recordou à agência Lusa, numa altura em que se assinalam os 50 anos os acontecimentos do Maio de 68 em França.
José Mário Branco, nascido no Porto, em 1942, exilou-se em França em 1963, depois de perseguido pela PIDE, por se opor ao regime ditatorial de Salazar e a uma participação na guerra colonial, e só regressou a Portugal depois da revolução de Abril.
Em França viveu intensamente os acontecimentos de 1968, iniciados com revoltas estudantis e que se estenderam aos operários, envolvendo milhões de trabalhadores em protestos que paralisaram o país.
José Mário Branco recorda que, com outros cantores portugueses e artistas franceses - "músicos, atores, poetas declamadores, instrumentistas, mimos, bailarinos" - percorreu o país para "divertir e dar força" aos trabalhadores que ocuparam escolas, fábricas, bairros e pracetas.
"E foi aí que eu e outros artistas portugueses começámos a sair da nossa concha de exilados, e conhecemos muitos artistas franceses e de outras nacionalidades. E daí surgiram algumas afinidades artísticas", relembra o músico, citando por exemplo a criação da cooperativa artística Groupe Organon, com quem chegou a gravar.
"Estávamos fechados nos nossos grupos, na nossa luta contra a ditadura, etc.. O Maio de 68 veio rebentar com essas paredes todas", disse.
Cinquenta anos depois, José Mário Branco considera que aquele movimento foi gigantesco e "muito espontâneo", e que é difícil de prever que se repita.
"Este tipo de explosões é um bocado como as erupções dos vulcões. Sabe-se lá quando é que 'a coisa' de repente vai rebentar e começar a deitar lava. Não é muito previsível. Havia de facto uma degradação dos salários, uma degradação das condições de vida dos trabalhadores em geral. Mas isso há tantas vezes, há situações ainda piores e não há 'maios de 68' por causa disso", opinou.