PCP diz que pandemia veio agravar ou colocar a nu problemas na Cultura

A audição 'As respostas inadiáveis no setor da Cultura', promovida hoje online pelo PCP serviu para o partido reforçar a ideia de que a pandemia da covid-19 apenas veio "agravar ou colocar a nu" situações já existentes no setor.

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Lusa
14/04/2020 20:26 ‧ 14/04/2020 por Lusa

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Covid-19

 

"A Cultura vive uma situação de emergência há largos anos e o surto epidémico apenas veio agravar ou colocar a nu uma série de situações nas Artes, Cultura e Património no nosso país", afirmou a deputada do PCP Ana Mesquita, no final da audição pública, que juntou profissionais do setor da Cultura.

A deputada salientou que esta é "uma análise que o PCP tem feito e os testemunhos ouvidos hoje vêm confirmar".

Rui Galveias, do Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (CENA-STE), alertou que "o setor está parado, bloqueado e no mais profundo risco de pobreza, desmontagem e destruição".

"As medidas devem ser para as pessoas estarem salvaguardadas e o Governo não está a fazer isso", defendeu, referindo que nos últimos tempos "chegou ao sindicato gente de todo o lado", sobretudo técnicos.

Segundo um inquérito promovido pelo CENA-STE, cujos dados foram divulgados no dia 03 de abril, a perda de trabalho afeta 98 pessoas em cada 100 na área da Cultura.

Em termos financeiros, para as 1.300 pessoas que responderam ao questionário, as perdas por trabalhos cancelados somam dois milhões de euros, apenas no período de março a maio deste ano, o que corresponde a um valor médio, por trabalhador, de cerca de 1.500 euros.

A diretora do Teatrão, companhia de Coimbra, Isabel Craveiro, defendeu que "deveria aproveitar-se para exigir ao ministério e à DGArtes o mapeamento das situações de trabalho deste setor, para cruzar com os números sindicato".

 Isabel Craveiro alertou para o "desconhecimento do tecido cultural do país" por parte de quem decide, "que o Ministério da Cultura e a Direção-Geral das Artes [DGArtes] demonstram quando tomam decisões", defendendo a "necessidade urgente de mapeamento do território e do tecido do setor do teatro".

O Teatrão saiu recentemente de uma "situação calamitosa". Considerada elegível, mas fora dos apoios bianuais 2020/2021 da DGArtes, a companhia "foi repescada nos apoios quadrienais e vinha de falta de apoio há quatro anos".

"Estamos ainda a pagar salários em atraso e sobrevivemos com apoio do município", contou a encenadora, lembrando a "intermitência do trabalho" naquela área.

Na música, defendeu o músico Tiago Santos, a situação provocada pela pandemia da covid-19 "vem trazer ao de cima a enorme precariedade e a enorme desigualdade que existe entre os vários tipos de carreiras".

"Para lá dos consagrados, a grande maioria está em situação de abandono. Entre os muitos músicos fora dessa ribalta encontramos muitos com problemas graves de vidas penhoradas e em suspenso por causa de dívidas que foram acumulando ao longo dos anos, à segurança social e fiscais diversas", partilhou.

Os músicos, alertou, estão "com trabalho parado e tudo cancelado até outubro", e "a perspetiva do futuro negro que se adivinha impede condições mínimas para uma pessoa poder criar de forma livre e desenvolver o seu trabalho".

Tiago Santos salientou que "as medidas do Governo não correspondem às necessidades dos trabalhadores" e "acentuam as desigualdades que já existiam".

No cinema, "tal como na música, situações mais graves são para os trabalhadores a recibos verdes", alertou o produtor de cinema Pedro Duarte, referindo que "não há outro mecanismo que permita contratar os profissionais".

"Nas Artes sente-se muito fortemente a injustiça que são os recibos verdes", disse, referindo que, tal como noutras áreas, no cinema "há pessoas com situações aflitivas, porque tudo foi cancelado".

"Temos pessoas que no imediato não estão com a corda na garganta, mas vão estar", garantiu.

Pedro Duarte disse que "não houve nenhuma iniciativa do Governo de apoio ao cinema até este momento", já que "o fundo de emergência de apoio à cultura não abrange o cinema".

Além disso, "as medidas anunciadas pela RTP deixaram o setor sem palavras, porque é a RTP é assumir que não faz o seu trabalho no resto do ano".

Em representação do Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia (STARQ), Jacinta Bugalhão alertou para esta "área do património cultural [em que] os problemas estruturais [são] de tal maneira gritantes que numa situação destas vêm ao cinema de uma forma dramática".

"De repente e por via desta pandemia, deixámos de fazer parte da Cultura. O património cultural deixou de existir, assim parece no discurso pelos responsáveis", afirmou.

Com problemas "semelhantes aos das Artes em geral, nomeadamente a questão da precariedade laboral", neste setor "não houve propriamente paragem de atividade, porque tem trabalhado com a construção civil, que continua a trabalhar, como muitos outros".

"A maioria dos meus colegas está nas obras a trabalhar, em condições muitas vezes muito negativas e muito deficientes", alertou.

Com a livraria "fechada há um mês e sem grande perspetiva para abrir", Francisco Reis da Poetria, no Porto, falou numa "coocorrência completamente desleal" no setor livreiro, onde "a lei do preço fixo não é cumprida".

À espera do anúncio de medidas para o setor por parte do Ministério da Cultura, as livrarias independentes criaram a Rede de Livrarias Independentes (RELI), que será em breve formalizada como associação.

"A RELI tem debatido questões que queremos ver resolvidas, a bem de uma Cultura de todos, para todos", referiu, dando como exemplo apoios no envio de livros ou a participação por parte das autarquias, para cedência de espaços, pós-pandemia.

O artista plástico Pedro Penilo, em representação do Manifesto em Defesa da Cultura, reforçou que "a crise epidémica põe a nu as fragilidades imensas em todos os setores, mas particularmente no setor da atividade cultural", sendo "a paralisação completa da atividade", o problema especifico que se enfrenta agora.

No final da audição, Ana Mesquita defendeu a necessidade de "agilizar o acesso de trabalhadores independentes aos apoios" e que, na área da Cultua, o Governo "devia proporcionar resposta de apoio direto, não concursal e sem contrapartidas".

"Tem de haver cuidado, por parte do Governo, nas medidas a ser tomadas, que deem resposta a todas as particularidades que o setor abrange. Há situações comuns a todos e também situações particulares em cada uma das áreas, e têm de ser tidas em conta nas respostas a dar", referiu.

A pensar no período pós-pandemia, o PCP defende que as "medidas do futuro e construção da saída passam por questões estruturais e por um Plano Nacional para as Artes e para a Cultura e uma estruturação de Serviço Público de Cultura efetiva".

"Tem de haver descentralização cultural a sério. Em todo o território nacional todas as pessoas terem acesso a toda a cultura. E tem de haver plano firme de combate à precariedade laboral e aos recibos verdes", disse.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já provocou mais de 120 mil mortos e infetou quase dois milhões de pessoas em 193 países e territórios.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

Em Portugal, segundo o balanço feito hoje pela Direção-Geral da Saúde, registam-se 567 mortos, mais 32 do que na segunda-feira (+6,%), e 17.448 casos de infeção confirmados, o que representa um aumento de 514 (+3%).

Portugal, onde os primeiros casos confirmados foram registados no dia 02 de março, encontra-se em estado de emergência desde de 19 de março e até ao final do dia 17 de abril.

 

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