Fundada em 1958 no concelho de São João da Madeira, distrito de Aveiro, esta foi escola estatal que obteve melhores resultados entre os 514 estabelecimentos públicos e privados analisados pela Agência de Notícias de Portugal, terminando o ano letivo de 2018/2019 com uma média de 13,29 valores entre os 155 exames nacionais realizados pelos seus alunos.
Num edifício modesto muito mais silencioso do que era habitual antes de a pandemia de covid-19 obrigar 750 dos seus estudantes a terem aulas em casa, a diretora da escola, Anabela Brandão, diz-se "cheia de saudades dos miúdos" e está ansiosa por partilhar com eles a notícia de que ocupam o primeiro lugar num 'ranking' em que só são superados por colégios privados.
Garantindo que as notas dos seus alunos "não são inflacionadas", como acredita ser tendência em estabelecimentos privados, a professora não hesita em apontar a principal razão desse sucesso: "Ao fim de 12 anos de estudo, parece que tudo está condicionado ao exame nacional, mas a vida de um aluno dentro da escola é muito mais do que isso. Dentro deste ambiente controlado, tentamos dar-lhes todas as experiências possíveis para que adquiram competências e aptidões que lhes permitam, quando saírem da escola, traçar os caminhos que quiserem e concretizar os seus sonhos".
Na prática, isso passa por envolver alunos e professores em projetos de ciência, tecnologia, arte, política, o que abrange desde campeonatos internacionais de robótica, olimpíadas de matemática ou biologia, competições de cálculo mental ou ilustração, até campanhas contra a discriminação racial, aplicações telefónicas como a que indica a ocupação das praias em contexto de covid-19 e ações de caráter cívico e político como a que há duas semanas lhes um prémio no concurso "Euroescola" - que, promovido pelo Parlamento Europeu em parceria com outras entidades portuguesas, levará agora 24 estudantes de São João da Madeira à sede do órgão deliberativo da União Europeia, em Estrasburgo.
"Ainda no outro dia, o agrupamento inteiro envolveu-se numa atividade com a Estação Espacial Internacional e os alunos estiveram a comunicar com os astronautas", acrescenta Anabela Brandão com uma vaidade só atenuada pela máscara respiratória, explicando que, pela interligação entre várias disciplinas e diferentes turmas, essas iniciativas têm sempre o mérito de envolver os participantes em "algo diferente" do programa oficial.
"Como estes projetos geralmente têm muito sucesso, os miúdos ficam muito mais motivados para a escola e para a aprendizagem", o que lhes confere competências novas para "voltarem ao currículo e continuarem a estudar".
Fátima Pais é uma das docentes que, ao longo dos anos, tem coordenado vários projetos paralelos ao currículo oficial, sobretudo na área da tecnologia, e diz que essa dinâmica reflete "uma cultura de escola" empenhada em exercitar as capacidades práticas dos jovens em vez de se limitar a divulgar a teoria.
"As melhores médias vêm do ensino privado, mas quando os alunos acabam o curso o que conta é quem teve preparação para a vida", defende a docente, sem ocultar alguma desilusão por o sistema atual valorizar muito mais o resultado de um exame nacional "realizado num único dia" do que toda a classificação obtida pelo aluno ao longo de todo o ano letivo.
Mesmo temendo que, no final do presente ano escolar, o ensino à distância leve a que se inflacionem ainda mais os resultados do privado e faça com que "quem dá notas de forma justa seja ultrapassado", Fátima Pais continuará a seguir um modelo de que se orgulha.
"Esta escola fervilha de atividade porque nós acreditamos que não é só com as matérias tradicionais que se pode ensinar e aprender. Acreditamos no trabalho de equipa. Um projeto de Matemática pode ir buscar componentes ao Português, ao Inglês, à Físico-Química, e o que aqui praticamos há muitos anos é o cruzamento entre as diferentes áreas, para que a aprendizagem seja mais significativa e não haja compartimentação dos saberes", descreve.
Exemplo concreto de um talento que evolui com a prática é o domínio da oralidade e a capacidade de argumentação: "Ao desenvolverem um projeto, os alunos precisam de comunicar. Isso é logo uma competência que está a ser desenvolvida e, se calhar, nem está no 'receituário' das disciplinas".
Diogo Cruz assiste à conversa calado, mas quando conta à Lusa todos os projetos paralelos em que já esteve envolvido na Serafim Leite percebe-se porque é que as professoras depositam grandes expectativas na sua média anual de 19,3 valores. Só em 2019, o jovem de 17 anos do Curso de Ciências e Tecnologia participou em diferentes olimpíadas, no concurso nacional de leitura, em projetos de voluntariado como o banco alimentar, na competição "Euroescola" e no programa "Erasmus+", que lhe proporcionou viagens a Itália e à Alemanha em trabalhos sobre ambiente e desigualdade social.
Com colegas de Economia e Artes desenvolveu ainda a aplicação "Beach Clean Party", que organiza festas cujo objetivo é proceder à limpeza de praias, e, analisando a carga horária que toda essa atividade representou de esforço adicional, faz da experiência um balanço convicto: "Eu era uma pessoa muito envergonhada e o teatro ajudou-me a conseguir expressar-me. O Parlamento Jovem também me ajudou nessa componente comunicativa e, na técnica, o Laboratório de Programação fez-me entender que o que aprendemos tem aplicabilidade e pode usar-se em diversas áreas na vida real. Não ter estas atividades era tirar-me um dos meus pilares-base".