Femicídios. Pelo menos quatro mulheres mortas durante o confinamento

O Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR alerta para "um elevado número de ameaças de morte contra mulheres em contexto de violência doméstica" durante os três meses de confinamento no país. Para a associação, é agora imperativo "estender temporalmente" as novas medidas contra a violência doméstica implementadas no início da pandemia.

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Mafalda Tello Silva
10/11/2020 08:30 ‧ 10/11/2020 por Mafalda Tello Silva

País

Violência doméstica

O Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta) - que publica, todos os anos, os dados de mulheres assassinadas noticiados pela imprensa em Portugal - realizou um relatório "referente a femicídios, tentativas de femicídios e ameaças de morte", divulgados na comunicação social, durante o período do primeiro confinamento no país, que decorreu entre março e maio

Segundo esta análise, de 1 de março a 31 de maio, foram reportados quatro femicídios e nove tentativas de femicídios, sendo que destes, três femicídios e três tentativas de femicídios ocorreram durante o período em que esteve em vigor o primeiro Estado de Emergência, de 18 de março a 3 de maio, e que implicou o confinamento obrigatório.

"Nos quatro femicídios praticados entre março e maio, a vítima e ofensor mantinham uma relação de intimidade e o crime foi cometido no interior da residência", é detalhado.

Ainda durante estes três meses, verificou-se, sublinha o órgão da associação, "um elevado número de ameaças de morte contra mulheres em contexto de violência doméstica", tendo sido contabilizado um total de 33 ameaças de morte, 18 destas, durante o período em que vigorou o Estado de Emergência.

Contudo, comparando com o período homólogo de anos anteriores, as tentativas de femicídios mantêm-se, em média, "relativamente semelhantes" e o número de mulheres assassinadas por razões de género, "aparentemente", diminuiu. "No entanto, importa referir que estes dados devem ser analisados com cautela uma vez que, no período temporal abrangido por este relatório, foi dado um especial destaque à cobertura jornalística da pandemia, o que pode, em certa medida, ter ocultado o registo mediático dos femicídios em Portugal", adverte o observatório.

Notícias ao MinutoFemicídios e tentativas de femicídios em Portugal ocorridos entre os meses de março e maio, de 2004 a 2020. © Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR

Mesmo assim, de acordo com dados obtidos pelo Notícias ao Minuto junto das autoridades, o número de denúncias de violência doméstica também diminui entre março e maio, em comparação com o ano passado, designadamente, menos 918 denúncias reportadas à PSP e menos 397 à GNR.

Quanto à informação sobre os femicídios, em particular, ainda que esta seja insuficiente para compreender o real impacto da pandemia e do isolamento social no contexto de violência doméstica, o Observatório de Mulheres Assassinadas deixa algumas conclusões que não devem ser menosprezadas, sobretudo, num momento em que foi decretado novo Estado de Emergência no país.

Conclusões e recomendações

De acordo com o relatório, o número de femicídios pode ter diminuído devido ao "medo vivenciado por muitas mulheres neste período de confinamento obrigatório" que poderá ter levado a que algumas vítimas se esforçassem para "ser mais complacentes em relação às exigências do agressor durante o período em que estiveram obrigadas a permanecer fechadas em casa", diminuindo assim, consequentemente, o risco de femicídio, que geralmente aumenta com as separações dos casais. 

"Estan poderá ter sido uma das estratégias de sobrevivência adotada com a finalidade de se tentarem proteger, a si e aos/às filhos/as, da violência dentro de casa e, também, dos perigos da contaminação do vírus na eventual tentativa de abandoarem as relações violentas", é frisado. 

Por outro lado, é também ressaltado que, durante a pandemia, foram implementadas várias medidas para a prevenção da violência doméstica com o objetivo de "facilitar o acesso das vítimas a serviços de apoio", o que também pode evitado que "mais mulheres tivessem sido assassinadas durante este período".

"Portugal foi dos países que mais medidas implementou no sentido de assegurar a proteção às vítimas de violência doméstica (...). Não temos dúvidas de que estas medidas, aliadas ao bom trabalho que já tem vindo a ser feito pela Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica contribuíram para a segurança de muitas vítimas", sublinhou fonte oficial da UMAR, em declarações ao Notícias ao Minuto

Contudo, para o futuro, o observatório da UMAR é claro e refere "que existe uma preocupação em manter e ampliar todas as linhas  de apoio e  proteção  às mulheres  vítimas  de  violência mesmo após o período pandémico", recomendando que as novas medidas de combate à violência doméstica decretadas pelo Governo "sejam estendidas temporalmente". O organismo sugere ainda que seja "definido um plano de prevenção do femicídio a médio longo prazo considerando os efeitos da pandemia Covid-19 e alerta: "Será fundamental manter um olhar atento para o período de pós-confinamento já que as mulheres terão mais oportunidades de se separar dos parceiros abusivos e voltar à vida ativa na sociedade, o que poderá constituir um fator de risco". 

A acrescer aos fatores de risco, é ainda referido que as consequências do stress familiar provocado pela pandemia, "nomeadamente em termos de severidade e frequência de situações de violência doméstica", podem não se ter feito sentir em tão curto prazo.

"É  também  importante  continuar  a  investir  num  olhar  atento  e  especializado sobre  o femicídio e violência doméstica de forma a que se possam adquirir conhecimentos essenciais para a identificação de políticas para a sua prevenção, que possam ser aplicados para evitar, ao máximo possível, todas as formas de violência de género", concluiu a referida fonte. 

Nota: Para este relatório, foi considerado o período global de três meses - março a maio - visto que, em Portugal, uma grande parte da população entrou em isolamento voluntário, mesmo antes da declaração do primeiro Estado de Emergência e que, após o término do confinamento obrigatório, as restrições à mobilidade foram levantadas de forma extremamente gradual, tendo a população no geral continuado a manter-se em isolamento durante o mês de maio.

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