Miguel Guimarães sublinhou que o executivo de António Costa já há muito que deveria ter preparado as camas para as unidades de cuidados intensivos (UCI), as contratações de médicos e enfermeiros, reformados ou não, e as próprias estruturas de apoio separado a doentes infetados com o novo coronavírus e aos não Covid-19.
Segundo o último boletim da Direção Geral da Saúde (DGS), divulgado sábado, Portugal contabiliza pelo menos 2.544 mortos associados à covid-19 em 144.341 casos confirmados de infeção.
Miguel Guimarães indicou, por outro lado, ser "absolutamente essencial" reforçar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) no Orçamento de Estado (OE) para este ano e para o próximo, salientando que a verba adicional de 200 milhões de euros, já anunciada pelo executivo, é "pouco".
"As medidas específicas estão lá, é evidente, mas a verdade é que, aquilo que é o orçamento em si, apesar de ser maior do que o de 2020, os 200 milhões de euros anunciados para o SNS é pouco e seria necessário mais numa altura crítica como esta, em que os desafios que temos são urgentes. Não para o ano, mas para já", sustentou.
"É muito importante começar a reforçar a saúde pública. Se se começar a ter menos infetados haverá menos doentes internados nos hospitais e nas UCI. Estamos com muitos doentes e vamos ter muitos mais na próxima semana em internamentos e nas UCI e a capacidade que existe não serve. Os doentes 'não covid' começam a ficar para trás", alertou.
Segundo Miguel Guimarães, Portugal ainda não conseguiu recuperar os doentes "não covid" da primeira vaga da epidemia, algo que não se consegue de um momento para o outro nem em um dois ou três meses.
"As camas para doentes 'não covid' já estão a ser novamente ocupadas por doentes 'covid' e os doentes 'não covid' começam outra vez a ficar para trás. Se a situação se agravar, se se tornar mais grave do que na primeira vaga, vamos ter um problema muito sério com os doentes 'não covid', com um aumento muito sério de morbilidade. É um efeito colateral da pandemia que se poderia ter evitado se utilizássemos todo o sistema de saúde", declarou.
O bastonário da OM lembrou que, atualmente, o SNS dispõe de 19.000 camas de internamento e mais cerca de 13.000 no setor social e privado, pelo que existe uma capacidade fora do sistema de saúde público que, neste momento, podia ser alocada ao SNS, tal como no capital humano.
Por outro lado, acrescentou, o SNS conta com cerca de 29.000 médicos, mais os 10.000 em formação, enquanto no setor social e privado há outros 15.000.
"Existe uma reserva do país que pode e deve ser utilizada e rapidamente posta em prática de forma coordenada", defendeu, salientando que as 202 camas de reforço anunciadas pelo executivo para as UCI "vão ser perdidas nalgum outro sítio, ou nos internamentos, ou nos blocos operatórios, onde for".
"A não ser que façam novas alas, novas estruturas físicas, 202 camas para as UCI significa que ou se faz tudo de novo, que é impossível no tempo revisto pelo Governo, ou se juntam nos hospitais os dois tipos de doentes. É uma área importante porque estamos numa situação que é crítica", acrescentou.
Para Miguel Guimarães, contratar médicos e enfermeiros reformados, por outro lado, é "importante", mas desde que sejam encaminhados para os serviços de saúde pública para evitar o contacto direto com os doentes, podendo, aí sim, dar uma ajuda significativa. "E nem é preciso contratar muitos".
"Temos falta de recursos para esta pandemia, não para uma situação normal. O que a ministra [da Saúde, Marta Temido] queria que fosse feito, todos os contactos em 24 horas, é impossível sem meios e pessoal adequados. O anúncio da contratação de reformados é importante, mas é para já, na próxima segunda-feira, não daqui a uma ou duas semanas. Podemos chegar aos cinco mil casos diários, ou até mais, e isto demora a começar a diminuir", alertou.
Em relação ao reforço de médicos, nomeadamente aos estudantes que se encontram no final do curso de medicina, Miguel Guimarães defendeu que podem ser também encaminhados para os serviços de saúde pública, mas não para as UCI, uma vez que podem ajudar mas, sobretudo "na atual situação caótica", "não estão preparados.
"Mas podem ajudar a nível de saúde pública, nos rastreios, nos contactos e na luta para quebrar as cadeias de transmissão", acrescentou, salientando que o reforço de médicos para as UCI anunciado pelo governo tem por base os que estão a acabar a especialidade.
"Os médicos a contratar para as UCI são aqueles que acabam a especialidade, ou seja, são médicos que estão já no último ano ou completaram-na, e já estão a trabalhar nas UCI, pelo que não é propriamente um reforço, mas sim pessoas que já lá estão a trabalhar. Estes médicos que o Governo vai contratar, são, grosso modo, os internos que acabaram a especialidade e vão ficar a trabalhar no SNS. É positivo? É positivo. Mas não é um reforço de capital nos cuidados intensivos da parte dos médicos", explicou.