Pai Natal em teletrabalho. É "melhor do que nada" mas falta o contacto

Este ano, o 20.º consecutivo em que se veste de Pai Natal, Severino teve de adaptar-se aos novos tempos. Também ele, o Pai Natal mais famoso do país, está em teletrabalho. Não é a mesma coisa, mas graças à sua versatilidade continua, mesmo à distância, a conquistar e fazer sorrir os mais pequenos. Foi numa manhã atarefada que fomos espreitar o seu escritório. O barulho que tão bem conhece do Centro Comercial Colombo, sua residência fixa, dá agora lugar ao silêncio e à solidão de quatro paredes.

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Ana Lemos
02/12/2020 11:30 ‧ 02/12/2020 por Ana Lemos

País

Pandemia

O dia promete ser longo. Às 9h30, Severino Moreira está quase pronto para a jornada de videochamadas das 10h às 18h. Apesar de este ano não poder estar na sua residência fixa há já 20 anos, a praça central do Centro Comercial Colombo, em Lisboa, os preparativos e cuidados são exatamente os mesmos. Ainda que à distância, não descura nenhum pormenor. São três as (grandes) malas de viagem onde transporta todos os seus apetrechos: “Ainda ontem fui comprar spray para o cabelo”. Embora a sua longa barba seja branca, o cabelo comprido é grisalho e, para “criar uma figura mais homogénea para encarnar a personagem”, nada pode faltar.

Já vestido a rigor com o seu fato preferido, e o mais completo de três que mandou fazer há uns anos, Severino mostra-nos o seu novo espaço em modo teletrabalho. Num pequena sala está a sua poltrona e um fundo verde (croma), onde são projetados quatro cenários. No chão, entre a poltrona e a mesa do computador, tem uma almofada onde se ajoelha para dar abraços virtuais às crianças. Um improviso que criou entretanto para se sentir “mais próximo” delas.

Do lado esquerdo da poltrona, numa pequena mesinha, tem um globo para perguntar onde moram os meninos, um carrinho e uma boneca que faz de conta que está a compor, um livro de histórias e, claro, o seu sininho que toca por vezes no início das chamadas acompanhado pelo famoso ‘Ho!Ho!Ho!’. Se uns ajudam a iniciar a conversa, outros desbloqueiam um contacto mais tímido. Mas, diga-se, na maioria das videochamadas, o encanto ao ver o Pai Natal é tal, que Severino não precisa de recorrer a nenhum dos brinquedos. Basta um ‘olá’ seguido de uma gargalhada, e os sorrisos surgem naturalmente.

Em teletrabalho desde o passado dia 16 de novembro, Severino Moreira, que para quem não conhece é um habitué nas redes sociais, confessa que esta adaptação custou “muito menos” do que chegou a pensar e, ao fim de dois/três dias de videochamadas, tudo se tornou “fácil e intuitivo”. A verdade, desabafa, é que “acabei por ser resgatado por esta tecnologia porque, ao contrário do que eu próprio suponha, é possível transparecer calor humano”. E o facto de não estar na sua morada habitual permitiu-lhe chegar a outros meninos: “Ainda no outro dia falei com uma criança da Madeira”.

“O que é diferente é o meio do contacto, agora a mensagem que passo, a minha entrega, isso é igual porque sinto-os na mesma”

Apesar da tristeza que assume por estar “muito habituado ao contacto físico”, o Pai Natal garante que “há emoções na mesma”. “Há dias apareceu-me um casal que tinha marcado dois tempos para dois filhos e o segundo era treta. Tinham tirado fotografias comigo há 15 anos e queriam mostrá-las… Chorei compulsivamente. Sou muito emotivo e estas situações enchem-me o coração”.

Do que está a sentir mais falta este ano? "Da presença das crianças, sem dúvida, (...) mas também, é curioso, sinto muito a falta dos adultos porque muitos acarinham-me, estimulam-me, abraçam-me... Já são muitos anos e gera-se uma cumplicidade carinhosa que conforta. Também sinto falta disso".

Mas se a distância imposta pela pandemia separou fisicamente o Pai Natal das crianças, há outras vantagens só possíveis nestes tempos diferentes que vivemos. Afinal de contas, “entro-lhes pela casa”. E, se “a princípio, grande parte dos meninos, se inibe, depois começam a falar, começamos a brincar, vou puxando por eles e desbloqueiam completamente. Depois queremos parar para ir falar com outros meninos, e eles não querem” [risos]. Além disso, a maioria faz questão de mostrar a árvore de Natal e de garantir ao próprio Pai Natal que não se vão esquecer do “leite quentinho e das bolachas” na noite de 24 de dezembro.

“Não é o mesmo que o contacto físico mas perpassa alguma ternura”

E sobre a pandemia, fazem perguntas? Estão preocupados com a entrega das prendas? “Falam, aliás, um menino pediu-me uma varinha mágica para acabar com o vírus. É uma coisa que me comove sempre, a preocupação deles toca-me, há muitos que me dizem, quando lhes pergunto pelos desejos para este Natal - uma pergunta quase sagrada –, que querem acabar com a pandemia. E quando os ouço a dizer este palavrão ]pandemia) fico emocionado, porque significa que também estão a viver o problema e que têm consciência disso”.

Apesar de não fazer por introduzir o tema nas conversas, Severino reconhece que as crianças mais crescidas (sete/oito anos) falam sobre a pandemia. E aquilo que faz quando isso acontece é “encaminhar sempre o diálogo para uma mensagem positiva: ‘Ouve, isto vai passar, vais ter um Natal feliz na mesma, claro, com responsabilidade, e com cuidados’. Mostro-me otimista”. Ainda assim, garante, “a maioria dos meninos” com quem fala nem toca no assunto.

Até porque nesta conversa com o Pai Natal, o que importa mesmo são os presentes. Há pedidos diferentes este ano? Não, diz Severino. "De há uns anos para cá, há uma incidência óbvia por tudo o que é tecnologia" nos meninos, principalmente, "mas é curioso que nas meninas, as bonecas icónicas, as barbies, os nenucos, tudo isso aparece na mesma". E está o Pai Natal atualizado sobre os novos brinquedos? "Faço por isso, não quer dizer que às vezes não aconteça não conhecer, mas normalmente, sim, conheço".

Porém, felizmente, mesmo neste ano tão diferente para todos, o Pai Natal assegura que “as prendas vão chegar, isso é que não pode falhar, é um compromisso sempre inadiável”. Palavra de Pai Natal!

Mesmo em teletrabalho, o Pai Natal só para dia 24 de dezembro

Se a presença do Pai Natal era um sucesso nos centros comerciais, este ano, em teletrabalho, o sucesso repete-se. Nos dias de semana, há quatro Pais Natais disponíveis das 18h às 20h para videochamadas. Severino Moreira é um deles. Mas aos fins de semana, na véspera e no próximo feriado de 8 de dezembro, uma vez que não há escola, os horários serão alargados – 10h às 20h aos fins de semana e feriado, e a partir das 13h na véspera do feriado.

As videochamadas via Zoom, que arrancaram no passado dia 16 de novembro, mais cedo do que o início das habituais presenças do Pai Natal nos centros comerciais Sonae Sierra, vão manter-se até às 13h do dia 24 deste mês. E a verdade é que os quatro Pais Natais não têm tido mãos a medir. “[Esta solução] tem tido uma saída enorme, porque realmente é melhor do que nada”, reconhece Severino.

Para inscrever-se basta aceder ao site de um dos 17 centros comerciais Sonae Sierra e agendar o dia e a hora em que pretende receber a chamada da Lapónia. Será sempre uma ajuda para o Pai Natal se indicar algumas curiosidades sobre a criança com quem ele vai falar. Esses dados permitem estabelecer uma proximidade maior (e mais convincente) com os mais novos. Depois é esperar…

A promessa é de partilhar e mostrar às crianças um pouco da vida do Pai Natal. Quatro cenários, criados pelo coletivo Oskar & Gaspar, dão cor à conversa. Além da sala e do escritório, estão também disponíveis a fábrica dos brinquedos e o exterior da casa do Pai Natal, onde podem ver-se flocos de neve a cair. Severino faz questão de, no decorrer da conversa, ir mudando o cenário para mostrar aos meninos como está já a ser preparada a grande noite. E, mesmo à distância, o espanto e encanto dos mais novos são evidentes...

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