"Deixem-me dizer que a minha convicção é que este é o julgamento da vergonha em Portugal", afirmou José Carlos Alexandrino, intervindo, em Cantanhede, distrito de Coimbra, na sessão de apresentação de um sistema de videovigilância para a prevenção de incêndios, presidida pela secretária de Estado da Administração Interna.
Lembrando que, enquanto presidente da Câmara de Oliveira do Hospital, também teve de lidar com incêndios violentos, nomeadamente os de outubro de 2017, questionou a assistência, constituída maioritariamente por autarcas e representantes de entidades de Proteção Civil e bombeiros, sobre se existiam faixas de proteção de incêndios florestais nessa altura.
"Pergunto aqui, a qualquer um de vocês que está aqui, se havia alguma faixa de proteção de 100 ou 200 metros, quando uma pessoa via cair bolas de fogo, numa tempestade nunca vista, a um quilómetro, a dois quilómetros", argumentou José Carlos Alexandrino
"Aquelas pessoas não morreram por causa das faixas de proteção, aquelas pessoas morreram porque foram incêndios com características que nunca tinham sido vistas em Portugal. Era um fenómeno novo, como quando nos acontecem determinados furacões", acrescentou.
"E, por isso, hoje digo que, se calhar, deviam ser julgados alguns que fazem leis no Parlamento e que depois não dão meios nem recursos financeiros às câmaras municipais para aplicarem essas políticas no seu território", acusou o presidente da Região de Coimbra.
José Carlos Alexandrino justificou esta sua intervenção, aplaudida por duas vezes, como uma "nota de solidariedade" para com os seus colegas presidentes de Câmara "que estão a ser julgados, neste momento, por causa do fogo do Pedrógão".
"Estes presidentes têm família, têm filhos, têm pais e estavam a desempenhar um cargo político", notou.
O julgamento para determinar responsabilidades nos incêndios de Pedrógão Grande, em junho de 2017, conta com 11 arguidos, incluindo os presidentes de Câmara de Pedrógão Grande e de Figueiró dos Vinhos, Valdemar Alves e Jorge Abreu, respetivamente e o ex-presidente de Castanheira de Pera, Fernando Lopes.
Aos arguidos são imputados crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves.
Questionada, no final da sessão, sobre a intervenção do presidente da Região de Coimbra, a secretária de Estado da Administração Interna recusou comentá-la.
"Estamos a falar de um processo judicial que está em curso e sobre o qual, obviamente, eu não me posso pronunciar", disse Patrícia Gaspar.
Perante a insistência dos jornalistas, Patrícia Gaspar afirmou que se trata de uma "matéria sensível" que está a ser julgada, voltando a recusar comentários.
Apenas frisou que "2017 foi um ano absolutamente excecional [nas consequências dos incêndios rurais], está estudado, está partilhado, está perfeitamente debatido", observou a governante.
"Foram dois momentos absolutamente excecionais, quer o incêndio de Pedrógão [em junho], quer depois mais tarde em outubro, e o que estamos a fazer é a aprender e a garantir que o sistema [de Proteção Civil] evolui (...) para garantir que todos somos capazes de responder melhor a situações deste género", enfatizou a governante.
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