Segundo o acórdão dos três juízes desembargadores, datado desta terça-feira e ao qual a agência Lusa teve hoje acesso, é concedido provimento parcial ao recurso interposto pela assistente Sofia Henriques Azinhaga dos Santos, ou seja, pela família.
A família tinha recorrido após a juíza de instrução criminal Sílvia Patronilho rejeitar, a 24 de junho do ano passado, a admissibilidade legal dos requerimentos de abertura de instrução (RAI) apresentados por Sofia Azinhaga dos Santos, filha do trabalhador que morreu atropelado, aos arguidos Eduardo Cabrita e Nuno Dias.
A 18 de junho de 2021, Nuno Santos, funcionário de uma empresa que realizava trabalhos de manutenção na A6, foi atropelado mortalmente pelo automóvel onde seguia o então ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita, no concelho de Évora.
Com este provimento parcial do recurso, a Relação de Évora faz com que seja revogado o despacho dessa juíza "na parte em que não recebeu o requerimento de abertura de instrução relativamente aos arguidos Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita e Nuno Miguel Mendes Dias, quanto aos crimes de homicídio por negligência (...) e de condução perigosa de veículo rodoviário", pode ler-se.
Assim, os juízes desembargadores J. F. Moreira das Neves, Maria Clara da Silva Maia Figueiredo e Maria Fernanda Pereira Palma admitiram a abertura de instrução para o antigo ministro Eduardo Cabrita e para Nuno Dias, que à data era seu chefe de segurança. Será o juiz de instrução criminal a avaliar se os indícios que recaem sobre o ex-governante e o seu antigo chefe de segurança são suficientemente fortes para levar ou não os dois arguidos a julgamento.
A instrução é uma fase facultativa do processo de recolha de prova que pode ser requerida pelos arguidos para contestar a acusação, sendo dirigida por um juiz, ao contrário da fase de inquérito, que é dirigida pelo Ministério Público (MP).
De acordo com a decisão do Tribunal da Relação de Évora (TRE), os juízes não deram provimento ao recurso na parte em que a assistente imputava aos arguidos o crime de omissão de auxílio, por considerarem que não foi alegado "rigorosamente nenhum" facto no RAI capaz de sustentar esse ilícito criminal.
No que toca ao homicídio por negligência em coautoria aos dois arguidos, o acórdão refere que houve fundamentação suficiente da parte da assistente, apesar de deixar algumas à sua argumentação, pelo que se justifica a abertura de instrução.
No acórdão, é possível ler também que, quanto à condução perigosa, "a falta de consciência da ilicitude é censurável ao agente, e que, por isso mesmo, ele não deixará de ser responsabilizado mesmo se a afirmação daquele facto se não vier a provar".
"O requerimento de abertura de instrução apresentado pela assistente Sofia Henriques Azinhaga dos Santos relativamente aos arguidos Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita e Nuno Miguel Mendes Dias, ressalvada a imputação do crime de omissão de auxilio (...), não sofre da deficiência que lhe foi apontada", disseram os juízes.
Tal facto "compromete a decisão de rejeição da abertura de instrução relativamente aos crimes de homicídio por negligência (...) e de condução perigosa de veículo rodoviário (...), razão pela qual, nesta parte, tal decisão se não poderá manter, devendo, antes, quanto a ela, admitir-se o requerimento rejeitado", decidiu o TRE.
O Ministério Público (MP)já elaborou o despacho final deste processo, arquivando-o em relação ao ex-ministro e ao seu chefe de segurança e mantendo a acusação de homicídio por negligência do motorista do então governante, Marco Pontes, cuja fase de instrução está a decorrer.
[Notícia atualizada às 17h26]
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