Se Rússia vencesse guerra, Portugal seria "tão perdedor quanto a Ucrânia"

O ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, defendeu hoje que a derrota da Ucrânia seria a "vitória do imperialismo sobre o multilateralismo e o direito internacional" e, nesse cenário, Portugal seria "tão perdedor" como os ucranianos.

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Lusa
24/02/2023 11:00 ‧ 24/02/2023 por Lusa

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João Gomes Cravinho

"A derrota da Ucrânia seria a vitória do imperialismo sobre o multilateralismo e o direito internacional. Se for esse o resultado, países como Portugal, e a generalidade das nações que compõem a comunidade internacional, seriam tão perdedores quanto a Ucrânia", considerou Gomes Cravinho.

O chefe da diplomacia portuguesa intervinha no debate temático sobre a situação na Ucrânia, que decorre hoje na Assembleia da República, no dia em que se assinala um ano do início da invasão da Ucrânia pela Rússia.

Cravinho sustentou que "a sobrevivência e a vitória do multilateralismo e do direito internacional não é, apenas, uma questão de ideologia".

"É uma questão decisiva, incluindo para Portugal. Precisamos de poder contar com um sistema internacional, e com mecanismos de diálogo baseados em regras, para que esteja plenamente garantida a nossa soberania e capacidade de decidirmos os nossos próprios destinos", acrescentou.

Num discurso de cerca de 15 minutos, em que lembrou o apoio prestado por Portugal à Ucrânia desde o início do conflito, Cravinho afirmou que o regresso da guerra "em grande escala à Europa pela mão de Vladimir Putin" obriga "a confrontar ideias feitas sobre o presente do continente europeu e sobre o futuro da ordem internacional".

"Não esqueçamos hoje, neste triste aniversário, que a batalha maior que se trava hoje na Ucrânia, é entre o regresso à lei do mais forte, que caracterizou a primeira metade do século XX, e a sobrevivência do multilateralismo assente em regras do direito internacional, do diálogo e da diplomacia", sublinhou.

Cravinho ressalvou ainda que "faz parte dos paradoxos e das tragédias da vida internacional que há momentos em que a paz apenas se conquista pela força das armas" e que "o combate dos ucranianos pelo seu território é também o combate por um mundo mais decente, mais ordeiro e mais pacífico", tratando-se do direito inerente de legítima defesa "de que dispõe qualquer nação atacada, um direito previsto no artigo 51º da Carta das Nações Unidas".

"É neste contexto que fornecemos já cerca de 315 toneladas de material militar, um valor que, com a próxima remessa, aumentará para 532 toneladas, incluindo viaturas blindadas, geradores, munições, e equipamento médico e sanitário. Procurámos, em cada momento, corresponder às necessidades militares mais prementes da Ucrânia, à medida das nossas capacidades e com elevada generosidade", disse.

Cravinho -- que foi ministro da Defesa entre 2018 e 2022 -- fez ainda menção no seu discurso à visita a Kiev da ministra da Defesa, Helena Carreiras, dizendo que neste dia, "tão tristemente carregado de simbolismo", é com "muito orgulho" que o país tem na capital ucraniana a titular da Defesa.

O ministro destacou que Portugal aprovou um pacote especial para o acolhimento, proteção e integração de refugiados, "tendo Portugal recebido, até à data, quase 60.000 pedidos de proteção temporária".

"A esses ucranianos que encontraram refúgio em Portugal, quero dizer muito singelamente que são bem-vindos entre nós, o tempo que for necessário até que possam retomar as suas vidas na Ucrânia", afirmou.

O governante afirmou que se matricularam em escolas portuguesas cerca de 4.400 alunos ucranianos e estão cerca de 300 ucranianos inscritos em instituições de Ensino Superior com estatuto de estudante em emergência por razões humanitárias.

Portugal está também a participar em projetos de reconstrução de escolas na região de Jitomir, a oeste de Kiev, tendo-se comprometido "especificamente com a reconstrução do seu Liceu nº25, totalmente destruído pelas bombas russas".

O país assinou em maio passado um Acordo de Cooperação Financeira com a Ucrânia no valor de 250 milhões de euros, "que inclui a cedência de direitos especiais de saque no Fundo Monetário Internacional" e tem defendido a utilização do Mecanismo Europeu de Apoio à Paz no apoio à Ucrânia, "com 3.600 milhões de euros já alocados".

Cravinho elogiou igualmente as "muitas e decisivas ações de apoio humanitário protagonizadas pela sociedade civil portuguesa" e "a exemplar atuação" da Embaixada portuguesa em Kiev.

Quanto às sanções aplicadas pela União Europeia, que terá o seu 10º pacote adotado esta semana, Cravinho sublinhou o papel de Portugal "na defesa da introdução de derrogações para produtos agroalimentares e fertilizantes, com o intuito de mitigar as consequências para a segurança alimentar global", saudando a "decisão histórica de dezembro passado do Conselho de Segurança das Nações Unidas de aplicar uma isenção humanitária para todos os regimes de sanções das Nações Unidas", algo que Portugal irá defender também no regime de sanções da União Europeia.

"Tal como o caminho para a paz na Segunda Guerra Mundial não começou com uma negociação com o lado agressor, também neste caso a paz e a justiça só se poderão materializar através da retirada pela Rússia das suas forças de todo o território ucraniano. Só com um regresso da Rússia ao respeito pelo direito internacional é que poderá haver paz duradoura. Quando isso acontecer, poderemos então, com respeito mútuo entre todas as nações, começar a repensar e reconstruir o tecido do sistema internacional, tão gravemente danificado pela invasão da Ucrânia pela Rússia", rematou.

[Notícia atualizada às 11h28]

Leia Também: Afinal, qual é a proposta de paz da China para a guerra na Ucrânia?

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