População sem-abrigo diz estar a ser "varrida" perante visita do Papa
Para muitos, a autarquia lisboeta pretende "limpar a cara da cidade porque alguém muito importante vem cá".
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País JMJ
Apesar de a Câmara Municipal de Lisboa (CML) ter assegurado, já por duas vezes, que as pessoas em situação de sem-abrigo estão a ser "acolhidas de forma digna e humana", depois de terem sido informadas de que teriam de abandonar a zona da Avenida Almirante Reis até esta quarta-feira, dia 12 de julho, a população sem-abrigo de Lisboa acredita que a decisão tem como motivo a visita do Papa Francisco à capital portuguesa, a propósito da Jornada Mundial da Juventude (JMJ).
"A CML está a varrer as pessoas em situação de sem-abrigo para debaixo do tapete. É isso que nos estão fazer – estão a esconder-nos", disse Rita Moreira, em declarações à agência Reuters.
Tanto a mulher de 48 anos, que vive há cerca de um mês naquela artéria lisboeta, como outras pessoas detalharam ao mesmo meio que as condições nos abrigos propostos como alternativa são "horríveis".
Sem teto há dois anos, Márcio Achega, de 31 anos, confessou à Reuters que, apesar de trabalhar no setor da construção civil, não consegue encontrar uma casa a preços acessíveis. Na sua ótica, a autarquia pretende "limpar a cara da cidade porque alguém muito importante vem cá".
"Se nos querem remover por causa do Papa, têm de nos dar uma casa", complementou.
A política de “limpeza da cidade” promovida pelo presidente da @CamaraLisboa segue a todo vapor! Neste momento pessoas sem abrigo estão sendo removidas da Avenida Almirante Reis. Esta ação desumana é parte da agenda de @Moedas para a JMJ e a visita do Papa a Portugal em Agosto. pic.twitter.com/7Myr5f2nDM
— Hedflow (@Hedflow) July 13, 2023
Já na semana passada, recorde-se, a líder do PAN, Inês de Sousa Real, questionou a CML sobre o assunto, não tendo, até ao momento, recebido uma resposta, segundo a Reuters.
"Não é ao esconder as pessoas em situação de sem-abrigo durante a JMJ – e esperemos que não seja esse o motivo – que vamos resolver o problema da pobreza no nosso país", argumentou, indicando ser urgente implementar medidas para ajudar as pessoas a lidar com a crise na habitação.
De notar que, há uma semana, a Comunidade Vida e Paz (CVP) informou que "foi contactada pela equipa de projeto do plano municipal para a integração de pessoas em situação de sem-abrigo, a exemplo de solicitações anteriores, para informar e sensibilizar as Pessoas em Situação de Sem-Abrigo (PSSA), de que irá ocorrer uma ação concentrada na Avenida Almirante Reis e na Rua Regueirão dos Anjos que visa uma limpeza das tendas existentes e demais pertences".
A informação da CVP foi prestada em resposta a questões apresentadas pelo deputado do PAN na Assembleia Municipal de Lisboa, António Morgado Valente, que ficou surpreendido quando, na quarta-feira de manhã, as pessoas que atualmente vivem em tendas à porta da sede do partido, na Avenida Almirante Reis, comunicaram, "em situação de desespero [...], que têm de sair dali e não sabem para onde vão".
A vereadora dos Direitos Humanos e Sociais, Sofia Athayde (CDS-PP), explicou todas as ações em curso junto da PSSA e afirmou que, "no âmbito destas intervenções, a CML rejeita, portanto, a falsa ideia que foi veiculada pela Comunidade Vida e Paz e já o transmitiu a esta entidade".
Nas ações de apoio permanente às PSSA são disponibilizadas "soluções de acolhimento em locais múltiplos, consoante a especificidade de cada caso, que oferecem sempre uma resposta com valências ao nível de cuidados de saúde, alimentação, acompanhamento psicossocial e alojamento, naturalmente, em estreito respeito pela sua vontade relativamente à aceitação destas respostas".
A vereadora dos Direitos Humanos e Sociais reforçou que também as PSSA que pernoitam na Avenida Almirante Reis beneficiam de uma resposta de acolhimento com todas as valências a todos os níveis, referindo que nesta zona da cidade foram encaminhadas pela CML 18 pessoas em 2022 e 28 durante este ano.
Considerado o maior acontecimento da Igreja Católica, a JMJ vai realizar-se entre 1 e 6 de agosto, sendo esperadas cerca de 1,5 milhões de pessoas.
As principais cerimónias da jornada decorrem no Parque Tejo, a norte do Parque das Nações, na margem ribeirinha do Tejo, em terrenos dos concelhos de Lisboa e Loures.
Leia Também: CML assegura acolhimento de pessoas sem-abrigo "de forma digna e humana"
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