Adesão à UE "foi uma das razões" para a invasão russa, diz José Milhazes
O historiador e jornalista José Milhazes, coautor de "A Mais Breve História da Ucrânia", disse à Lusa que a questão da adesão à União Europeia foi uma das razões para as invasões russas e está presente desde a independência.
© Global Imagens
País José Milhazes
"Desde 1990, a questão (da adesão à União Europeia) colocou-se sempre de uma forma muito relevante. Os dirigentes ucranianos, maioritariamente, defendiam a opção europeia e essa foi uma das razões que levou ao conflito que hoje estamos a enfrentar", afirmou José Milhazes referindo-se a um dos temas do livro escrito em conjunto com o jornalista Vladimir Doblin.
"Para (Vladimir) Putin dizer que a Ucrânia e o povo ucraniano não existem como povo é uma forma de deixar claro que para Moscovo, trata-se de um país sob a influência da Rússia e que deve ser um satélite russo. Por isso, não deve ter oportunidade de aderir à União Europeia, já para não se falar da NATO", sublinhou Milhazes.
Nos capítulos finais do livro "A Mais Breve História da Ucrânia - Dos Príncipes de Kyiv a Zelensky", publicado na semana passada, os autores abordam por ordem cronológica o papel do primeiro Presidente do Estado independente (16 de julho de 1990), Leonid Kravtchuck, passando pela "era dos oligarcas ucranianos" durante a presidência de Leonid Kutchma.
"As relações políticas, diplomáticas e até económicas bilaterais nunca foram pacíficas entre a Rússia e a Ucrânia desde a independência dos dois países (...) Em 2003 os ucranianos deviam eleger um novo presidente. E foi então que os dois candidatos propuseram no campo das relações internacionais programas com políticas e estratégias opostas" (páginas 290 e 300), escrevem os autores referindo-se a Viktor Ianukovitch e ao adversário Viktor Yushenko.
Os acontecimentos ligados aos dois políticos provocaram a realização inédita "a nível mundial" de uma terceira volta em eleições.
Paralelamente à instabilidade política na Ucrânia os autores estudam também a anexação da Crimeia em 2014, o separatismo promovido por Moscovo na zona da bacia do rio Don assim como os aspetos políticos e diplomáticos relacionados com as negociações de Minsk sobre o leste da Ucrânia.
"Resumindo, nem a Rússia nem a Ucrânia cumpriram os Acordos de Minsk. O estipulado era vago e permitia interpretações dúbias", escreveram Milhazes e Doblin sobre a iniciativa do chamado Quarteto da Normandia (Alemanha, França, Rússia e Ucrânia) que marca o período que antecede à invasão russa de 2022.
O passado histórico da Ucrânia "é a linha condutora" do livro mas é relatado pelos dois autores através das figuras mais relevantes desde o século V até à atualidade, passando pelos momentos de grande violência como a repressão estalinista e o Holodomor (Grande Fome), a invasão da Alemanha nazi e o papel dos colaboracionistas como Stepan Bandera (1909-1959).
"Esse é um dos grandes problemas da História da Ucrânia e que têm de ser os ucranianos e os historiadores ucranianos a resolver para não aceitarem aquilo que faz (Vladimir) Putin: ditar a história de um povo vizinho e de um povo independente", afirma Milhazes.
Vladimir Dolin, ucraniano de origem judaica, 66 anos, que assina com José Milhazes este livro sobre a Ucrânia, é formado em História e trabalhou como repórter nas duas guerras da Chechénia.
Entre outros livros, José Milhazes é autor de "Cunhal, Brejnev e o 25 de Abril"; "Samora Machel, Atentado ou Acidente?"; "Angola, o Princípio do Fim da União Soviética" ou "A Mais Breve História da Rússia".
"A Mais Breve História da Ucrânia - Dos Príncipes de Kyiv a Zelensky" (Publicações Dom Quixote), inclui mapas, tabelas cronológicas e fotografias.
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