Na segunda sessão do julgamento a decorrer no Juízo Central Criminal de Lisboa, o ex-governante prosseguiu as declarações iniciadas na terça-feira, nas quais procurou fazer uma cronologia da sua relação com o Banco Espírito Santo (BES) e Ricardo Salgado, a passagem pelo Governo e o regresso à atividade no BES África.
"Em 2005 tiveram lugar as eleições, recebi o convite para ir para o Governo e aceitei. Foi o maior erro da minha vida, porque deu origem a estes problemas e fez-me perder uma fortuna colossal", disse, explicando que o ex-banqueiro lhe disse para se manter afastado da política: "Não encorajava membros do banco a terem atividade política. Ele disse-me 'não se meta nisso, é uma palermice'".
Sobre a relação com o antigo presidente do BES, Manuel Pinho sublinhou os "altos e baixos" numa "relação longa" com Salgado, que descreveu como "muito centralizador" e indicou duas discussões públicas com o ex-banqueiro, que apontou como possível causa para o seu afastamento do banco, tendo depois recordado o não cumprimento do acordo que tinha sido feito para a sua reforma aos 55 anos e com 100% do salário pensionável.
"Às tantas tivemos duas discussões em público e eu tenho o meu feitio... não sei se terá sido isso que terá influenciado depois a minha substituição", observou, continuando: "Não posso estar grato a Ricardo Salgado e ao GES por passarem de 16 milhões de euros [previstos no acordo para a reforma] para sete milhões de euros... Tenho do Dr. Ricardo Salgado a recordação de alguém que me prejudicou brutalmente".
O Ministério Público defendeu na segunda-feira que Manuel Pinho, ao ser convidado para ministro da Economia em 2005, simulou uma demissão do BES e fez um acordo com Ricardo Salgado para se manter ao serviço do GES e, no exercício das funções como ministro, tomar decisões que fossem dirigidas aos interesses do grupo.
Hoje, Manuel Pinho reiterou que a "tese da desvinculação simulada [do BES] não tem lógica alguma" e que o designado pacto criminoso "é uma invenção", esclarecendo também que só voltou ao GES, para trabalhar no BES África após a saída do Governo por não ter sido cumprido o acordo para a reforma: "Nunca de livre vontade teria trabalhado no BES África, era o que faltava".
Questionado sobre os cerca de 15 mil euros mensais recebidos numa conta no estrangeiro enquanto exercia funções no primeiro Governo liderado por José Sócrates (2005-2009), Manuel Pinho garantiu tratar-se de verbas que lhe eram devidas e que diziam respeito a prémios pelo desempenho na área dos mercados do BES.
"O que eu recebi quando estava no Governo era um prémio e a acusação mistura prémios, questões de reforma e o salário da minha mulher. (...) Não pensei como me ia ser pago. Era uma dívida, não tinha de pensar. Passado um ano, o meu gestor de conta disse-me que estava a receber estes pagamentos mensais. Disse a Ricardo Salgado que me era muito difícil controlar [os pagamentos] e pedi para parar. Uma segunda vez o gestor disse-me que continuavam os pagamentos e pedi à chefe de gabinete do Dr. Salgado para parar".
A sessão prosseguiu por breves minutos de tarde, mas a defesa alegou o cansaço do arguido e pediu para as declarações continuarem apenas na próxima semana.
Manuel Pinho, em prisão domiciliária desde dezembro de 2021, é acusado de corrupção passiva para ato ilícito, corrupção passiva, branqueamento e fraude fiscal.
A sua mulher, Alexandra Pinho, está a ser julgada por branqueamento e fraude fiscal - em coautoria material com o marido -, enquanto o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, responde por corrupção ativa para ato ilícito, corrupção ativa e branqueamento de capitais.
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