No primeiro dia do Governo de gestão, o primeiro-ministro demissionário, António Costa, confessou estar "magoado" e “frustrado” com o final abrupto da sua legislatura, ainda que tenha ressalvado não ser "rancoroso". Isto porque, assegurou, está de consciência "absolutamente tranquila".
Questionado se, caso pudesse voltar ao dia 7 de novembro, tomaria mesma decisão de apresentar a demissão ao Presidente da República, o chefe do Governo foi taxativo: "Sem a menor das dúvidas."
"Quem a exerce as funções de primeiro-ministro não pode estar sob suspeita oficial. Aquele parágrafo [da Procuradoria-Geral da República (PGR)] foi determinante. E se não tivesse vindo o parágrafo? Estava a ponderar. Provavelmente, aguardaria a avaliação pelo juiz de instrução dos indícios que existiam", disse, esta segunda-feira, em declarações à imprensa.
Tenho apontado que ainda desconhece as suspeitas que pendem sobre si, Costa explicou que, "perante um comunicado onde uma pessoa que não é uma pessoa qualquer, é a procuradora-geral da República [Lucília Gago], entende comunicar oficialmente ao país e ao mundo que, além de tudo mais, foi aberto um processo contra o primeiro-ministro", o dever do cargo que ocupa transcendia a sua "dimensão pessoal".
"Não creio que alguém ache normal que quem é primeiro-ministro possa estar sob uma suspeição oficial", disse.
O chefe do Governo, que admitiu estar "magoado" e "frustrado", disse ainda que essas considerações deveriam de ser dirigidas tanto a Lucília Gago, como ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
"Pode é perguntar a quem fez o comunicado, a quem tomou a decisão posterior de dissolver a Assembleia da República, se fariam o mesmo perante aquilo que sabem hoje", atirou.
E complementou: "Como sei que nada fiz de errado, que nada deixei de fazer de errado, o resultado final há-de ser a minha não acusação, ou arquivamento ou a minha absolvição."
Ainda assim, o chefe do Governo reiterou estar magoado, uma vez que "ninguém, ao fim de uma vida inteira, gosta de ser colocado nesta posição".
"Se estou magoado? Estou. [...] Ninguém está acima da lei, portanto, acho normal que, se há uma suspeita, essa suspeita seja investigada. Se acho normal que essa suspeita essa publicitada sem que sejam praticados os atos de investigação suficientemente sólidos que permitam que seja posta publicamente em causa a idoneidade de uma pessoa, é algo que a justiça deve refletir sobre si própria", lançou.
E sublinhou: "Da minha parte, estou com a consciência absolutamente tranquila. Não tenho dúvidas de qual é o final da história, porque sei exatamente o que fiz, sei exatamente o que não fiz, sei que não tive nenhum benefício de numa decisão que tenha tomado ao longo destes quase 30 anos de vida política, além do salário que me é pago. E, portanto, aguardo serenamente. Se me deixa magoado, deixa. Se me deixa frustrado ver o meu trabalho interrompido pela segunda vez consecutiva, sim, fico frustrado, porque gosto de fazer coisas."
O primeiro-ministro demissionário ressalvou, contudo, que não é "rancoroso", já que, "no final, o sistema funciona corretamente".
De notar que o Governo está em gestão desde sexta-feira e, por isso, limitado aos atos estritamente necessários ou inadiáveis à continuação da sua atividade.
António Costa apresentou a sua demissão ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a 7 de novembro, devido a uma investigação judicial sobre a instalação de um centro de dados em Sines e negócios de lítio e hidrogénio, que levou o Ministério Público a instaurar um inquérito autónomo no Supremo Tribunal de Justiça que o visa.
O chefe de Estado aceitou de imediato a demissão do primeiro-ministro e anunciou a formalização da demissão do Governo para hoje. Por seu turno, apontou a dissolução do Parlamento para 15 de janeiro, no contexto das eleições legislativas antecipadas, marcadas para 10 de março.
[Notícia atualizada às 10h37]
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