O procurador do Ministério Público (MP) José Sousa Coelho, que redigiu o processo disciplinar contra a procuradora-geral adjunta, Maria José Fernandes, admitiu, pela primeira vez, que a Operação Influencer fez "cair" o primeiro-ministro, António Costa, contrastando com as declarações da procuradora-geral da República, Lucília Gago, que recusou sentir-se responsável pela crise política em que Portugal se encontra mergulhado.
"A Operação Influencer, objetivamente, terá eventualmente feito cair, direta ou indiretamente, um primeiro-ministro", terá apontado o magistrado no relatório final de averiguação da conduta de Maria José Fernandes, segundo avançou a revista Visão, esta quinta-feira.
Em causa está o artigo de opinião redigido pela procuradora-geral adjunta, e publicado no jornal Público, no qual a responsável questionou como foi possível chegar até aqui, ou seja, até "à tomada de decisões que provocaram uma monumental crise política e cujas consequências vão ainda no adro", questionando métodos de trabalho e investigação do MP, designadamente do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) - ainda que não se tenha referido à Operação Influencer.
A magistrada do MP alegou ainda, entre outros pontos, que "os desfechos de vários casos já julgados permitem extrair que há aspetos do trabalho dos procuradores de investigação a carecer revisão e aprimoramento pelo exercício da autocrítica".
As declarações de José Sousa Coelho contrastam, contudo, com as afirmações de Lucília Gago, que adiantou, em novembro, não se sentir responsável "por coisa nenhuma".
"Não me sinto responsável por coisa nenhuma. Como disse, a Procuradoria-Geral da República (PGR), o Ministério Público (MP), no concreto investiga, perante a notícia dos factos, aquilo que deve investigar", disse a responsável, à margem de uma conferência sobre violência doméstica na sede da Polícia Judiciária (PJ).
Lucília Gago esclareceu ainda que o parágrafo referente à investigação que pende sobre António Costa no Supremo Tribunal de Justiça "diz, com transparência, aquilo que estava em causa no contexto da investigação que está em curso".
"A necessidade foi de transparência, de informação relativamente à investigação que está em curso e, portanto, teria naturalmente de ser colocado, sob pena de, não constando no comunicado, se pudesse afirmar que estava indevidamente a ocultar-se um segmento da maior relevância", complementou.
Sublinhe-se que a Operação Influencer levou às detenções do chefe de gabinete de António Costa, Vítor Escária, do advogado e consultor Diogo Lacerda Machado, dos administradores da empresa Start Campus Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, e do presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, a 7 de novembro. São ainda arguidos no caso o ex-ministro das Infraestruturas João Galamba, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o advogado João Tiago Silveira e a Start Campus.
O processo foi, entretanto, separado em três inquéritos, relacionados com a construção de um centro de dados na zona industrial e logística de Sines pela sociedade Start Campus, a exploração de lítio em Montalegre e de Boticas (ambos distrito de Vila Real), e a produção de energia a partir de hidrogénio em Sines.
António Costa, que surgiu associado a este caso, foi alvo da abertura de um inquérito no MP junto do Supremo Tribunal de Justiça, situação que o levou a pedir a demissão, com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a marcar eleições antecipadas para 10 de março.
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