Avelina Ferreira, de 73 anos, desapareceu a 12 de dezembro após ter fugido do Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, e o seu corpo foi encontrado mais de dois meses depois, na passada segunda-feira, 26 de fevereiro, em elevado estado de decomposição, junto ao estabelecimento hospitalar. No entanto, este não terá sido o primeiro caso de alegada negligência para com idosos sem acompanhante no hospital e, em todo o país, as queixas recebidas pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS) sobre "acompanhamento durante a prestação de cuidados" ultrapassam já as 220 só este ano.
O caso de Avelina Ferreira tornou-se conhecido em dezembro e, na altura, a família explicou que a idosa estava "desorientada" e sofria de "demência", tendo dado entrada sozinha nas urgências do hospital, uma vez que o marido foi impedido de a acompanhar. Foi entretanto lançada uma petição, que conta já com mais de 9.500 assinaturas, com vista a "melhorar a prevenção e a resposta ao desaparecimento de pessoas com demência".
Já após a confirmação da morte, a família decidiu apresentar uma queixa-crime contra incertos para apurar responsabilidades e, na quinta-feira, a IGAS confirmou a abertura de um inquérito ao caso.
"Por despacho de 27 de fevereiro de 2024, do Inspetor Geral da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), foi instaurado um processo de esclarecimento às circunstâncias em que ocorreu o desaparecimento, no dia 12 de dezembro de 2023, de uma idosa após sair do Hospital de São Francisco Xavier", indicou fonte da IGAS numa resposta ao Notícias ao Minuto.
Em dezembro, uma idosa morreu na ambulância após ter alta
Na quarta-feira, foi noticiado que o Ministério Público (MP) estaria a investigar a morte de uma idosa, de 87 anos, na ambulância que a transportava a casa, depois de receber alta do Hospital São Francisco Xavier, também em dezembro.
No entanto, já esta sexta-feira, fonte da Procuradoria-Geral da República indicou ao Notícias ao Minuto que o processo foi arquivado. "Correu termos no Ministério Público de Oeiras um inquérito que conheceu despacho final de arquivamento", lê-se numa resposta.
De acordo com a SIC Notícias, que cita a neta da vítima, a mulher tinha Alzheimer, estava acamada há dois anos, e teve de ser assistida naquela unidade hospitalar depois de se sentir mal durante a noite.
A morte aconteceu um dia depois de a idosa ter sido hospitalizada. A neta contou que a família foi informada de que a mulher ia ser transportada de ambulância até a casa, a uma distância de cerca de cinco quilómetros do hospital, mas, apesar de ter saído às 18h00 do hospital, só chegou perto das 20h00.
"Tocaram-nos à campainha, um bombeiro, que pediu para descermos para vermos se o estado normal da minha avó era assim. Descemos e deparamo-nos com um cenário macabro. Vimos a minha avó deitada sobre um doente lúcido, gelada, roxa, sem qualquer tipo de reação. A minha avó estava já em pedra", contou ainda, acrescentando que o óbito foi declarado 20 minutos depois.
Ao Notícias ao Minuto, o hospital confirmou que o atual Conselho de Administração, que entrou em funções apenas no início deste mês, determinou a abertura de um processo de inquérito ao caso.
Mais de 220 queixas feitas à ERS
Já foram apresentadas mais de 220 queixas à Entidade Reguladora da Saúde sobre "acompanhamento durante a prestação de cuidados". Segundo revelou a ERS ao Notícias ao Minuto, o número de reclamações ocorridas em 2024 com esta classificação, até à presente data, é de 226 reclamações referentes a 52 prestadores de cuidados de saúde. Destas, 145 reclamações dizem respeito a 32 prestadores do setor público com internamento.
Por sua vez, em 2023, a ERS recebeu 994 queixas relacionadas com "acompanhamento durante a prestação de cuidados" e no ano anterior recebeu 1.018 denúncias.
Note-se que nem todas estas reclamações dizem respeito a doentes com demência - como é o caso de Avelina Ferreira - mas é de situações deste género que resultam desfechos como o da idosa encontrada morta dois meses após sair do hospital pelo próprio pé.
Já sobre o caso específico de Avelina Ferreira, a ERS afirmou que "decorrente dos fluxos informativos sobre o desaparecimento de uma utente no Hospital São Francisco Xavier, procedeu à abertura de um processo administrativo, ao qual foi apensada uma reclamação por visar a situação em causa, sendo que o mesmo se encontra em fase de instrução, para definição da atuação regulatória tida por necessária".
[Notícia atualizada às 14h55 com informação de que o Ministério Público arquivou o caso referente à morte da idosa]
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