A Autoridade da Concorrência (AdC) condenou cinco grupos laboratoriais e a associação empresarial que os representa por cartel na prestação de análises clínicas e testes Covid-19, pelo menos, entre 2016 e 2022.
O cartel em causa, compostos pelos grupos Affidea (Hormofuncional e Alves & Duarte), Joaquim Chaves, Germano de Sousa, Redelab e Beatriz Godinho, foi estabelecido com a participação da associação do setor e "teve por objetivo a fixação dos preços aplicáveis e a repartição geográfica do mercado de prestação de análises clínicas e de fornecimento de testes Covid-19".
"A concertação entre os cinco laboratórios ter-lhes-á permitido aumentar o seu poder negocial face às entidades públicas e privadas com as quais negociaram o fornecimento de análises clínicas e de testes Covid-19, levando à fixação de preços e de condições comerciais potencialmente mais favoráveis do que as que resultariam de negociações individuais no âmbito do funcionamento normal do mercado, impedindo ou adiando a revisão e a redução dos preços", pode ler-se num comunicado a que o Notícias ao Minuto teve acesso.
Práticas começaram antes da pandemia
De acordo com o que a AdC apurou, pelo menos desde 2016, os grupos laboratoriais visados acordaram não aceitar descidas de preços e boicotar a prestação dos serviços, caso fossem efetivamente confrontados com uma redução dos preços convencionados com o SNS, tendo acabado, aliás, por boicotar a aplicação do desconto estabelecido em Acordo celebrado com o Ministério da Saúde tendo em vista a sustentabilidade do SNS.
A pretensão dos grupos laboratoriais visados era, na realidade, a de promover um aumento geral dos preços, alterando o paradigma da determinação dos mesmos, focado na sustentabilidade. A mesma prática de concertação verificou-se também por ocasião da redução do preço da análise à Vitamina D pela ADSE em outubro de 2016.
Os grupos laboratoriais visados acordaram numa posição de reação e repúdio à referida redução e a mesma prática de concertação verificou-se ainda no contexto de negociações com seguradoras privadas.
A prática durante a pandemia
Já a partir de março de 2020, os laboratórios visados concertaram entre si os preços para o fornecimento de testes Covid aos utentes do SNS e da ADSE e impuseram-nos nas 3/4 negociações com a tutela.
Os laboratórios visados ameaçaram, aliás, a tutela com um boicote ao fornecimento de testes Covid em represália contra as reduções dos preços convencionados.
Em plena pandemia, e na tentativa de coordenação de esforços para lhe dar resposta, a tutela voltou a necessitar de recorrer aos laboratórios privados para, em fevereiro de 2021, dar início à implementação de uma testagem massiva em escolas e creches.
Também neste momento, as visadas coordenaram entre si um preço "com base nos seus próprios interesses comerciais e superior ao esperado", pode ler-se. Os cinco laboratórios não só fixaram os preços dos testes Covid, como repartiram o mercado das escolas entre si.
Mais ainda, a fim de permitir a reabertura das viagens entre o território continental e os Açores, a secretaria Regional da Saúde dos Açores celebrou uma convenção tendo em vista a prestação de testes Covid aos passageiros que viajassem do território continental para os Açores a realizar nas 72 horas que antecediam o respetivo voo.
O mesmo tipo de comportamento de fixação de preços ocorreu no âmbito desta convenção
Em conclusão, os sete laboratórios visados "mantiveram comportamentos que se traduziram na fixação de preços ou outras condições de transação, no boicote à prestação de serviço e na troca de informação comercial sensível no contexto da prestação de análises clínicas e de testes Covid com o SNS, ADSE e seguradoras privadas".
A taxa de crescimento anual do volume de negócios agregado na prestação de análises clínicas em território nacional em 2020 e 2021, correspondente ao período da pandemia, por parte dos grupos laboratoriais visados foi entre 50 e 60% em cada um dos anos. Em setembro de 2020, o valor os testes Covid (PCR) estavam em Portugal, ao nível dos preços na Europa. Em junho de 2021, Portugal era o país da Europa com o preço por teste Covid (PCR) mais alto.
Note-se que foram realizados, em Portugal, até 30 de março de 2022, mais de 40 milhões de testes.
No total, foi aplicada uma coima de 57.510.000, euros da qual 8.900.000 euros já foram voluntariamente pagos.
Entretanto, a Associação Nacional de Laboratórios (ANL) apontou que a decisão da AdC foi "caracterizada por erros factuais e de direito".
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