A Unidade Local de Saúde (ULS) de Santa Maria anunciou que vai instaurar processos judiciais a pessoas que ofendam os seus profissionais de saúde nas redes sociais, com o objetivo de "proteger" os funcionários e a instituição de "ataques externos injuriosos atentatórios das boas práticas e do bom-nome". No entanto, os partidos políticos - da Esquerda à Direita - condenaram a intenção da unidade hospitalar e falam mesmo em "autoritarismo" e "censura" à liberdade de expressão.
A Iniciativa Liberal (IL) foi o primeiro a reagir e pediu uma audição urgente do presidente da ULS, Carlos das Neves Martins, sobre a ameaça de processos judiciais, considerando-a um "ato de censura".
"O Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal entende que a missão de uma Unidade de Saúde é a de prestar bons cuidados de saúde e não a de despender esforços na perseguição de utentes por delito de opinião, que aliás não tem qualquer cabimento legal", criticou.
Para os liberais, medidas judiciais contra cidadãos que se expressem publicamente sobre a qualidade dos serviços prestados "é um ato de censura e de coação da liberdade de expressão", violando assim "princípios fundamentais de uma sociedade livre".
️ Hospital de Santa Maria ameaça utentes com processos judiciais
— Iniciativa Liberal (@LiberalPT) August 29, 2024
A Iniciativa Liberal quer explicações no Parlamento por parte do Hospital de Santa Maria em Lisboa e chamou com urgência o seu Presidente.
A administração do Hospital anunciou que vai processar em tribunal as… pic.twitter.com/YgDVHSX4V6
Por sua vez, o Partido Socialista (PS) decidiu questionar o Governo se pretende que a ULS revogue o despacho e criticou a "intenção subliminar de constranger" os utentes.
Numa pergunta dirigida à ministra da Saúde, Ana Paula Martins, os deputados socialistas João Paulo Correia e Eurídice Pereira pediram esclarecimentos por parte da tutela e questionaram: "Identifica-se com o conteúdo do mesmo, nomeadamente quanto à conformidade do determinado com as disposições constitucionais?"
Na opinião do PS, o despacho "constitui um precedente de arbitrariedade, por determinar uma orientação genérica colocando no Gabinete Jurídico a responsabilidade não de dar sequência a eventuais ilícitos penais identificados concretamente pela administração ou por profissionais que se sintam lesados, mas antes determinar ser o próprio gabinete o agente investigador e delator".
Também o Partido Comunista Português (PCP) considerou desproporcionada a intenção de avançar com processos e condenou as injúrias, apesar de as justificar com o descontentamento das pessoas com o desinvestimento no SNS.
"Uma coisa é quando acontecem situações de injúria, de ofensa, e tem sido relatada até em algumas situações mais graves inclusivamente de agressão aos profissionais de saúde. Naturalmente, não podemos compactuar com essa situação. Outra coisa é, de facto, uma situação que vivemos no SNS derivada do desinvestimento que tem sido sujeito nas últimas décadas", explicou a comunista Paula Santos, em conferência de imprensa.
Já a coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua, acusou o Governo de querer resolver os problemas de má gestão na saúde "com autoritarismo" e defendeu que a ministra da Saúde quer "impor uma lei de ferro".
"Há governantes que acham, e esse parece ser o tique deste Governo, que com autoritarismo se resolvem problemas de competência, má gestão e problemas políticos", disse, frisando que Ana Paula Martins "tem escolhido atacar os administradores, atacar os profissionais de saúde, atacar até os utentes e impor uma lei de ferro".
O que está em causa?
A Unidade Local de Saúde (ULS) de Santa Maria vai instaurar processos judiciais a pessoas que ofendam os seus profissionais de saúde nas redes sociais, afirmando que o que está em causa são injúrias que ultrapassem a liberdade expressão.
"A medida agora anunciada tem como objetivo proteger os profissionais da ULS de Santa Maria e a própria instituição de ataques externos injuriosos, atentatórios das boas práticas e do bom-nome das suas equipas, publicados por terceiros nas redes sociais", esclareceu a instituição.
A ULS explicou que "em causa estão publicações ofensivas, que excedem a simples crítica, totalmente à margem do que são os canais legítimos para apresentação de queixas por parte dos utentes, nomeadamente através do Gabinete do Cidadão".
"Esta medida não incide sobre conteúdos que cada profissional, de forma individual, publica nas suas redes sociais", salientou, indicando que a proposta partiu do Gabinete Jurídico, "tendo em conta publicações externas recentes atentatórias da honra de profissionais, logo também da própria instituição".
A ULS de Santa Maria ressalvou que "espera não ter de utilizar este mecanismo jurídico contra terceiros", realçando que "não hesitará em momento algum em defender o bom-nome e a integridade moral dos seus profissionais".
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