Nos últimos anos, decorreu no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, o julgamento de recurso de 11 bancos dos multados, em 2019, pela Autoridade da Concorrência (AdC) pela prática concertada de troca de informação sensível no crédito.
Segundo o regulador, entre 2002 e 2013, mais de 10 bancos partilharam informação entre si, nomeadamente tabelas das taxas 'spreads' (margem de lucro comercial) a aplicar aos créditos a clientes (habitação, consumo e a empresas) e os volumes de produção, tendo-os multado no total em 225 milhões de euros.
No processo, que teve origem num pedido de clemência apresentado em 2013 pelo Barclays, a AdC condenou a CGD ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI em 30 milhões, o Montepio em 13 milhões (coima reduzida em metade por ter aderido ao pedido de clemência), o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria em 2,5 milhões, o BES em 700.000 euros, o Banco BIC em 500.000 euros, o Deutsche Bank (cuja infração prescreveu em outubro de 2020) e a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo em 350.000 euros cada um. Já à Union de Créditos Inmobiliarios coube um pagamento de 150.000 e ao Banif (que não recorreu) de mil euros.
O Abanca, também visado no processo, viu a infração prescrever ainda na fase administrativa e o Barclays, que apresentou o pedido de clemência, viu suspensa a coima de oito milhões de euros.
Durante o julgamento dos recursos, iniciado em outubro de 2021, os bancos pediram a absolvição defendendo, genericamente, que não houve combinação de preços e que a partilha de informação não lesou a concorrência. Nas alegações finais, o BCP foi especialmente crítico com este processo, considerando que houve a intenção da AdC de "promover um julgamento público e mediático dos visados".
Os montantes diferenciados das multas também foi questionado pelos bancos, caso de BCP e BPI que acusaram de falta de fundamentação.
Em abril de 2022, a juíza Mariana Gomes Machado deu factos como provados, que os bancos trocaram entre si informação sobre preços/taxas (atuais e futuras) que não eram do domínio público ou que eram de difícil acesso e sistematização, que partilhavam valores mensais de produção e que esta troca de informação, ocorrida num mercado relativamente concentrado, "facilitou o alinhamento" e permitiu o "estabelecimento de uma coordenação informal entre as instituições bancárias".
Contudo, ao mesmo tempo, decidiu suspender a instância e remeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) para que este se pronuncie sobre se os factos constituem restrição de concorrência por objeto, por não ter ficado provado se a troca de informação teve ou não efeito sobre os consumidores.
Recentemente, em final de julho, veio a decisão do tribunal europeu. O TJUE admite que a troca de informações mantida pelos bancos durante mais de uma década "pode constituir uma restrição à concorrência por objeto" e que "basta que essa troca constitua uma forma de coordenação que, pela sua própria natureza, seja necessariamente (...) prejudicial ao correto e normal funcionamento da concorrência".
Segundo o TJUE, para que um mercado funcione em condições normais, "os operadores têm de determinar de forma autónoma a política que tencionam seguir e têm de permanecer na incerteza quanto aos comportamentos futuros de outros participantes".
Após esta interpretação do tribunal europeu, cabe agora ao Tribunal da Concorrência decidir se os factos são ou não uma "restrição por objeto" - geralmente os tribunais nacionais seguem o entendimento do tribunal europeu - e decidir as coimas a aplicar aos factos provados (se se mantêm ou são revistos os valores da AdC).
A leitura da sentença pela juíza Mariana Gomes Machado está marcada para sexta-feira, às 14h00.
Antes, esta quarta-feira, os bancos farão as alegações finais sobre o acórdão do tribunal europeu.
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