"Temos relatos constantes de professores e de colegas de outros alunos que nos dizem como continua a ser muito difícil para os jovens LGBTI", denunciou Jo Matos, presidente da rede ex aequo -- associação de jovens lésbicas, gays, bissexuais, trans, intersexo e apoiantes.
À associação chegam relatos de bullying e de discursos de ódio nas escolas mas também de jovens que "estão dependentes dos pais, que não lhes dão liberdade para existir porque estão contra", revelou Jo Matos em declarações à Lusa. Para a associação é importante que todos "vejam a escola como um espaço seguro".
A associação tem sido chamada para falar nas escolas desde 2005, quando muitos dos temas ainda eram tabus: Nessa altura, ainda não era permitido o casamento entre pessoas do mesmo sexo, nem sequer era possível adotar crianças.
Através do projeto "Escolas Arco-Íris", membros da rede Ex Eaquo, que têm entre 16 e 30 anos, aceitam o desafio de debater e conversar com outros jovens, normalmente a pedido de professores e psicólogos escolares. As ações têm chegado a cerca de quatro mil alunos por ano.
A internet facilitou o acesso à informação, mas o presidente da associação diz que agora "há cada vez mais uma grande polarização: O que antes era desconhecimento, passou a ser uma agressão para com as pessoas LGBTI".
Quando, há cerca de um ano, o parlamento aprovou um diploma que definia como implementar a lei sobre a autodeterminação da identidade de género nas escolas, a discussão na praça pública transformou-se numa agressão à comunidade, sendo habitual ouvir um "discurso desumanizador e humilhante", recordou.
"Quando se aborda, por exemplo, as questões das casas-de-banho e se diz que as pessoas trans vão abusar das outras, isto tem um impacto muito grande nestes jovens", alertou Jo Matos, acrescentando que o veto presidencial ao diploma veio "lançar ainda mais confusão".
A lei da autodeterminação da identidade de género existe desde 2018 e já previa que as escolas garantissem a não discriminação de nenhum aluno, mas "com o chumbo presidencial houve um recuo, porque muita gente achou que era a lei que tinha voltado atrás", contou.
À associação chegam contactos de jovens a pedir ajuda, nem que seja para irem à escola "mostrar que a lei continua a existir, porque tudo isto continua dependente do critério de cada escola, de cada professor, de cada diretor", alertou Jo Matos, lamentando que se ignorem "as diretrizes claras de não poderem discriminar".
A associação decidiu realizar no sábado uma conferência sobre o projeto "Escola Arco-Íris", em Lisboa, para tentar sensibilizar a comunidade escolar.
A ideia é promover o diálogo sobre os desafios enfrentados pela comunidade LGBTI+ nas escolas, bem como a partilha de estratégias que contribuam para uma maior inclusão e bem-estar de toda a comunidade escolar.
Sobre a recente polémica em torno da disciplina de Cidadania, que existe como disciplina autónoma apenas entre o 5.º e o 9º anos de escolaridade, Jo Matos não consegue ainda identificar eventuais efeitos.
"Se uma escola decide não nos chamar, nós não vamos saber. Podemos notar uma diminuição de sessões, mas é preciso tempo para nos apercebermos isso. Recordo-me que já em 2019, houve um debate público sobre quem eram as "associações duvidosas" que iam às escolas falar com as crianças e na altura tivemos sessões canceladas", lembrou.
Jo Matos sublinha que as sessões se adaptam ao público, sendo diferente conversar com alunos do 9.º ano ou estudantes universitários, e que os encontros servem essencialmente para falar sobre "afetos e relações, direitos humanos, não discriminação e educação para a cidadania".
Oito em cada dez jovens já assistiram a situações de discriminação LGBTI+ em contexto escolar, segundo um inquérito realizado pela associação em 2019 junto de mais de mil alunos.
"Apenas 1% não achou importante abordar estas questões em sala de aula, contra 80% que disse achar importante, mas 69% disse que não eram abordadas nas aulas", acrescentou.
Entre professores e psicólogos escolares, 96% sentiu que as sessões ajudavam a diminuir as situações de discriminação e 67% admitiu precisar de formação. Mais de metade (52%) considerou que o sistema educativo não é inclusivo e 30% admitiu ser incapaz de responder a questões de LGBTI+.
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