"Não compreendo porquê que isso não foi feito", disse, sublinhando que, na sua perspetiva, os dois aviões Canadair que atuaram na região deviam ter carregado água do mar, se tivessem condições para tal.
Tiago Oliveira, que falava na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, numa audição sobre a gestão dos meios de proteção civil no incêndio de agosto de 2024 na Madeira, alertou para o facto de a região enfrentar "desafios extraordinários" ao nível de fogos rurais, decorrentes das alterações climáticas.
"Aquilo que está em causa sempre, aqui, nos Estados Unidos, em qualquer outro país, nesta matéria, é a qualidade da decisão, num primeiro nível, técnica e, num segundo nível, política", avisou.
Também o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, António Nunes, ouvido hoje na mesma comissão, considerou que será "muito difícil" não utilizar água do mar no combate aos incêndios por meios aéreos na Madeira no futuro, embora reconheça não ser recomendável do ponto de vista ecológico e ambiental.
"Podemos fazer outros investimentos, que é ter um conjunto de áreas de retenção de água, auxiliados por outros meios de combate que não são usados em Portugal", explicou, referindo-se à utilização de retardantes e gel, que, no seu entendimento, só não são usados por "razões economicistas puras".
António Nunes sublinhou que na Madeira, como nos Açores e no continente, o combate aos fogos não é feito com tecnologias mais modernas porque não se quer investir, de modo que a utilização de água do mar será uma necessidade.
No decurso da audição, o presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais salientou como aspeto negativo o facto de a Madeira não integrar o Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, por recusa das autoridades regionais, vincando que seria uma oportunidade para ter acesso a "outro conhecimento" e estar ligada a protocolos internacionais.
Tiago Oliveira disse ser fundamental abordar o tema dos incêndios com estratégia, pois, na sua opinião, o problema não se resolve com mais meios aéreos (a Madeira dispõe apenas de um helicóptero), mas também com outro modelo de gestão florestal e com uma equipa apeada de pelo menos 60 elementos "a trabalhar 365 dias por ano" em faixas corta-fogo.
"Os incêndios previnem-se durante o inverno, durante a primavera/verão faz-se a preparação da campanha e depois a gestão dos meios", alertou, avisando para o facto de nenhuma ter "capacidade para suster a circunstância meteorológica", como o prova os recentes incêndios na Califórnia, nos Estados Unidos.
"A Madeira também não vai ter no futuro, por mais investimentos que faça na preparação e na prontidão, donde é muito importante que tenha processos de apoio em circunstância de emergência com as melhores práticas internacionais", defendeu.
Já o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, António Nunes, afirmou que, no caso do incêndio de agosto de 2024, as autoridades regionais deveriam ter solicitado auxílio externo mais cedo.
"Haveria condições para um apoio diferenciado mais cedo, com outros meios e com maior eficácia, até porque alguns desses meios vieram-se a revelar cinco ou seis dias depois", disse António Nunes.
No decurso das audições, o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses e o presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais responderam apenas a perguntas formuladas pela deputada socialista Sofia Canha e pelo deputado do Chega Francisco Gomes, eleitos pelo círculo da Madeira.
No entanto, a deputada do PSD Paula Margarido, também eleita pelo círculo da Madeira, interveio para acusar o PS, partido que requereu as audições, de desrespeito pela Constituição e pela autonomia, realçando que compete à Assembleia Legislativa da Madeira fiscalizar os atos do Governo Regional e não à Assembleia da República.
A deputada lembrou ter sido constituída uma comissão de inquérito no parlamento madeirense com o mesmo objetivo, cujos trabalhos foram suspensos na sequência da queda do executivo minoritário do PSD, na qual o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses já foi ouvido, sendo que estava também prevista a audição ao presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais.
"É lamentável que estejamos aqui na Assembleia da República a gastar meios, quer pessoais, quer financeiros, numa autêntica duplicação do que se passa na Região Autónoma da Madeira", declarou.
A mesma posição foi manifestada pelo deputado comunista António Filipe, que considerou não haver justificação para a questão do incêndio na Madeira estar a ser tratada na Assembleia da República.
O incêndio rural deflagrou na ilha da Madeira em 14 de agosto, nas serras do município da Ribeira Brava, propagando-se progressivamente aos concelhos de Câmara de Lobos, Ponta do Sol, na zona oeste da Madeira, e Santana, na costa norte.
No dia 26, foi declarado "totalmente extinto", com mais de cinco mil hectares de área ardida.
Segundo o executivo madeirense, não houve registo de feridos ou da destruição de casas e infraestruturas públicas essenciais, mas foram atingidas áreas florestais e pequenas produções agrícolas.
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