Complementos salariais, apoios financeiros para arrendamento de casas e deslocações ou oferta de habitação são algumas das medidas dirigidas a médicos de família, para prestarem serviços em centros e extensões de saúde, disseram à agência Lusa fontes municipais do Centro, Alentejo e Algarve.
Em Alcoutim, um dos concelhos no Algarve mais afetados pelo envelhecimento populacional e desertificação, apesar de a autarquia ter anunciado, em agosto passado, apoios diversos à fixação de clínicos no seu território, apenas logrou manter ao serviço o único médico que já ali exercia funções.
"Com dois médicos, o concelho já ficaria bem servido", afirmou o presidente da Câmara, Paulo Paulino, notando que a dificuldade em atrair médicos para este concelho do nordeste do distrito de Faro não é nova, mas agravou-se após a criação das Unidades de Saúde Familiares (USF) tipo B -- onde os profissionais são remunerados com base no seu desempenho -, uma vez que Alcoutim não tem número de utentes suficiente para ter uma USF deste tipo, ao contrário do que sucede em concelhos vizinhos.
No extremo oeste do Algarve, a Câmara de Monchique aprovou, em 2023, um regulamento que prevê que os médicos tenham um apoio no arrendamento ou aquisição de habitação no valor mensal máximo de 80% do salário mínimo, o que se aplica também aos que vivam em residência própria.
No concelho beneficiam do programa de incentivos dois médicos a tempo inteiro e, ao fim de semana, o atendimento é feito por um médico enviado pela Unidade Local de Saúde (ULS), disse o presidente da Câmara, Paulo Alves.
No entanto, ainda há utentes sem médico de família e o autarca estimou que seria necessário "pelo menos mais um médico", mas essa reivindicação esbarra nos rácios por habitante determinados pela ULS.
Cerca de 600 quilómetros (km) separam Monchique de São João da Pesqueira, no extremo norte do distrito de Viseu. Ali, o regulamento municipal de atribuição de incentivos à fixação e manutenção de médicos entrou em vigor em 2024 e foi a única forma de evitar o encerramento do centro de saúde, disse o presidente da Câmara, Manuel Cordeiro.
A situação, por ora, está resolvida, já que a USF Coração prevê cinco médicos e a autarquia conseguiu atrair quatro médicas (duas das quais se instalaram com família e filhos), que se juntam a três médicos tarefeiros, embora o apetrechamento do centro de saúde esteja "bem longe de cumprir requisitos de qualidade adequados, revelando fragilidades inaceitáveis", vincou.
"Não se trata sequer de uma aposta ganha. Trata-se da implementação da única solução exequível para preservar o serviço no concelho e devolver alguma tranquilidade à população", alegou Manuel Cordeiro.
Em Figueiró dos Vinhos, no interior do distrito de Leiria, há apoios ao arrendamento ou construção de casa própria, outros para deslocação de médicos que residam foram do concelho (entre os 150 e os 500 euros mensais), bem como acesso gratuito a equipamentos desportivos ou a iniciativas culturais promovidas pelo município.
O presidente da autarquia, Jorge Abreu, argumentou que, pese embora o quadro de médicos esteja preenchido, a criação dos incentivos justificou-se porque todos os clínicos residem fora do município e o regulamento, mais do que atrair novos médicos, visou, sobretudo, conseguir manter o atual quadro clínico, fidelizando-o ao concelho.
Já no Fundão, onde há um ano metade da população daquele concelho do norte do distrito de Castelo Branco não tinha médico de família, os incentivos municipais para atrair profissionais não tiveram os resultados esperados.
A vereadora com o pelouro da Saúde, Alcina Cerdeira, disse que a situação acabou por ser atenuada com a possibilidade de médicos aposentados voltarem ao serviço, uma solução que a autarca considerou "um paliativo", por ser incerto por mais quanto tempo esses profissionais estão disponíveis para darem essa resposta à população.
Em Abrantes, na região do Médio Tejo, a falta de clínicos também se faz sentir, mas o panorama é menos grave: o município custeia, com cerca de 12 mil euros, 12 médicos responsáveis pela gestão de duas USF, que asseguram cuidados de saúde primários regulares a cerca de metade dos 30 mil utentes concelhios.
Com uma terceira USF em constituição, para ser possível cobrir todo o território, o investimento municipal, segundo a vereadora Raquel Olhicas, não é só financeiro, mas também na "construção de equipamentos de saúde de elevada qualidade", considerado um fator de atratividade para os profissionais de saúde.
Em Mação, no limite entre o distrito de Santarém e o Alto Alentejo, os dados disponibilizados à Lusa apontam para 75% da população - muito envelhecida e dispersa por um território com mais de 120 aldeias -- sem médico de família.
O município de pouco mais de sete mil habitantes 'acena' com um bónus salarial de 2.500 euros por mês a quem ali queira prestar cuidados de saúde, medida tomada depois de, em 2023, dois dos três médicos de família então existentes terem saído ao atingirem a idade de reforma.
Atualmente, o regulamento municipal apoia duas médicas do centro de saúde local, uma das quais, por também ter atingido o limite de idade para ter vínculo ao Serviço Nacional de Saúde, está ao serviço ao abrigo do programa governamental "Bata Branca", que visa providenciar assistência a quem não tem médico de família, afirmou a presidente da Câmara, Margarida Lopes.
Ali ao lado, já no distrito de Portalegre, em Gavião, foi a inadaptação ao interior que levou à saída da única médica em serviço a tempo inteiro no Centro de Saúde local, disse o presidente do município, José Pio.
Apesar dos apoios municipais em habitação e pagamento de despesas, os médicos que têm passado por Gavião não se fixam, preferindo locais onde possam fazer mais serviços, nomeadamente em clínicas ou hospitais.
"Neste momento, temos zero [médicos a tempo inteiro], temos um médico a fazer 20 horas e que está aposentado e dois médicos contratados, com prestação de serviços ao centro de saúde. As extensões é que ficam mais a descoberto", lamentou.
Mais a sul, em Reguengos de Monsaraz, o panorama é agora mais risonho, devido aos incentivos camarários, tendo, em quatro anos, o número de médicos aumentado de dois para sete, um deles a meio tempo.
A presidente desta autarquia do distrito de Évora, Marta Prates, especificou que o município paga um complemento salarial de 1.000 euros mensais e atribuiu 'casas de função' às famílias de três dos seis médicos que exercem a tempo inteiro, enquanto os restantes três recebem mais 250 euros para apoio nas despesas de deslocação ou arrendamento.
Leia Também: Sindicatos e Ordem querem melhores condições para fixar médicos no SNS