Mercado saturado pode levar universidades chinesas a rever cursos de português

O mercado para licenciados em língua portuguesa na China encontra-se saturado, afirmou hoje à Lusa o representante do Instituto Português do Oriente (IPOR) em Pequim, alertando para uma "readaptação brusca" por parte dos departamentos de línguas.

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Lusa
18/04/2025 09:06 ‧ ontem por Lusa

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China

"Há um excesso de oferta, segundo os dados que vamos recebendo ou ouvindo, por vezes de forma não oficial", revelou Luís Pestana, que vive na China há 10 anos, referindo as elevadas taxas de desemprego jovem no país, que afetam "particularmente" os estudantes de línguas estrangeiras.

 

"É um problema generalizado", apontou o português, lembrando que, quando começou a trabalhar na China, os seus "alunos encontravam trabalho mesmo antes de terminar o curso", mas que as oportunidades são agora "escassas".

A mais antiga licenciatura em língua portuguesa da República Popular da China foi criada em 1961, na Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim ('Beiwai'). Durante quase vinte anos, aquele curso foi o único do género no país e, até ao final da década de 1990, surgiu apenas mais um, em Xangai.

No entanto, o ensino do Português no continente chinês registou um crescimento acelerado nos últimos 25 anos, alimentado pela evolução das trocas comerciais entre a China e a lusofonia, que só em 2024 se cifraram em mais de 225 mil milhões de dólares (quase 208 mil milhões de euros), gerando crescente necessidade em formar quadros chineses para trabalhar com os países da CPLP.

Hoje, não contando com Macau e Hong Kong, há mais de 40 universidades chinesas com licenciaturas em língua portuguesa e mais duas dezenas que têm o português como disciplina opcional, segundo dados disponibilizados pelo IPOR à Lusa. No total, há mais de 4.300 estudantes a aprender português na China continental.

Apontando a aposta estratégica do Governo chinês em áreas mais técnicas, incluindo direito, economia ou engenharias, numa altura em que o país asiático enfrenta uma disputa com os Estados Unidos pelo domínio das tecnologias do futuro, Luís Pestana previu uma "readaptação brusca" do lado da oferta do ensino de línguas.

"Alguns departamentos devem encerrar, porque, de facto, deixaram de ser necessários ou de ser estrategicamente importantes, enquanto outros vão entrar num processo de adaptação e redirecionar os seus cursos para áreas distintas", previu.

Para os recém-licenciados em língua portuguesa que rumam a Pequim ou Xangai, as duas principais metrópoles do país, e que estão entre as cidades com mais alto custo de vida do mundo, o salário inicial varia entre 7.000 e 8.000 yuan (900 a 1.000 euros).

Um intérprete simultâneo chinês - português e vice-versa pode receber até 10.000 yuan (1.300 euros) por dia de trabalho, geralmente a acompanhar delegações de empresários ou visitas oficiais, mas trata-se de uma tarefa ocasional e executada apenas pelos profissionais mais experientes.

Em Angola ou Moçambique um intérprete e tradutor numa das centenas de empresas chinesas que ali operam na construção de infraestruturas, setor energético ou mineração, recebia por ano entre 200.000 e 400.000 yuan (entre 25.000 e 50.000 euros), segundo estimativas da agência Lusa, com base em ofertas de emprego difundidas em portais chineses.

"Este tipo de oportunidades já não é o mesmo e surge em menor número", afirmou o representante do IPOR, acrescentando que muitos estudantes de português acabam por seguir percursos profissionais "completamente diferentes" da sua área de formação.

Luís Pestana apontou ainda para o impacto "muito profundo" que o desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial está a ter no mercado de serviços linguísticos.

"Para textos com um fim mais prático, mais técnico, a realidade é que já não vão ser necessários tantos tradutores", observou.

"E isso também é importante porque condiciona bastante as escolhas dos jovens: eles acabam por questionar a mais-valia de aprender uma língua se o DeepSeek ou o ChatGPT podem fazer uma tradução perfeita", explicou.

Leia Também: China interrompe importações de gás liquefeito dos EUA

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