A deputada única do Livre, Joacine Katar Moreira, diz ser vítima de uma tentativa de "golpe" por parte da direção do partido, garantindo que "em momento algum" desrespeitou os regulamentos do mesmo e atribuindo os acontecimentos dos últimos dias a "dificuldades de comunicação" entre a sua equipa e o Grupo de Contacto, uma relação que descreve como convulsiva desde a campanha eleitoral.
"Nunca imaginei que um mês depois das eleições - não é um ano, é um mês - eu ia estar a ser avaliada e colocada numa situação destas pelos meus camaradas", afirmou Joacine Katar Moreira em declarações ao Notícias ao Minuto, esta segunda-feira, por telefone, regressada da sua visita planeada a Carregal do Sal, no âmbito do projeto de resolução que apresentou no Parlamento propondo honras de Panteão para Aristides de Sousa Mendes.
A deputada garante que a Assembleia do Livre já estava marcada, "porque havia militantes, alguns da Assembleia e outros da direção, que estavam bastante inquietos", isto ainda antes do voto de abstenção na proposta do PCP sobre as agressões israelitas na Faixa de Gaza.
"Obviamente que eu sei qual é que é o posicionamento do partido e qual é o meu posicionamento: solidariedade absoluta e inequívoca para com os palestinianos. Mas é preciso olhar para os comunicados e para a maneira como são escritos, eles não falam apenas da condenação", salvaguardou Joacine Katar Moreira, sublinhando que têm "enviado semanalmente todas as votações nas quais é preciso uma posição oficial". "Eu sei que eu tenho liberdade, mas eu estou a assumir um ideal: que os meus posicionamentos também sejam os do meu partido".
"Na quarta-feira enviámos os comunicados, na quinta recordámos que no dia seguinte ia ser feita a votação. E eles [direção] afirmam aos órgãos de comunicação social que nós não solicitámos a opinião em específico do voto sobre Israel. É um facto, porque nós enviámos a listagem de todos os votos em relação aos quais nós precisávamos de nos posicionar", indicou. "Só fomos contactados pela direção na sexta-feira a partir das 17h ou das 18h, quando estávamos a organizar a minha visita a Carregal do Sal e na altura em que tivemos um encontro na Assembleia com um dos arquitetos da homenagem a Aristides de Sousa Mendes".
Isto trata-se de um autêntico golpe e a minha resposta é esta: não sou descartável e exijo respeitoJoacine Katar Moreira defende que o contacto só chegou "quando começou o ruído e a polémica", mas numa altura em que estava certa de que quaisquer diferenças seriam discutidas e sanadas em sede de Assembleia do partido, marcada para domingo. "A seguir emitem o comunicado no sábado de manhã e foi uma surpresa absoluta". Um comunicado que, referiu, foi "de uma absoluta falta de camaradagem".
"O meu objetivo era emitir um comunicado depois da Assembleia, mas a seguir houve alguns militantes a publicar algumas coisas completamente inconcebíveis", disse. "Fiz aquele comunicado, começando por pedir desculpa a toda a gente e assumi as responsabilidades desse meu voto. Toda a gente achou que era uma desculpa insuficiente. Quando é que um político se desculpou publicamente?".
"Isto trata-se de um autêntico golpe e a minha resposta é esta: não sou descartável e exijo respeito", fez sobressair.
"Não me senti sozinha no partido, senti-me abandonada pela direção"
"Nas minhas intervenções e participações não há nada que não esteja no programa eleitoral. Falei do aeroporto do Montijo, falei da nacionalidade, falei do salário mínimo nacional, fizemos requerimentos para audições na Comissão do Ambiente que vão ser ouvidas esta quarta-feira", enumerou, sublinhado que, "em momento algum, o gabinete constituído não respeitou ou não acompanhou as diretrizes do partido".
A deputada reiterou ainda existirem desde a campanha eleitoral "dificuldades de comunicação com a direção do partido". "Não me senti sozinha no partido, senti-me abandonada pela direção de campanha que não tinha uma estratégia para que eu ganhasse. Não houve esse investimento, não houve esta confiança de que havia alguma hipótese de ser eleita".
A campanha eleitoral para esta legislatura foi uma campanha verdadeira. Eu sou uma pessoa verdadeira, não estou aqui para enganar ninguém"Eu achei que esta apatia enorme da direção de campanha e do Grupo de Contacto devia-se sobretudo a uma grande desmobilização e à ideia de que não iríamos eleger", afirmou, ressalvando, porém, que nas últimas semanas se verificou "uma mobilização nacional que já não se via há imenso tempo". "Na noite eleitoral estávamos verdadeiramente felizes, mas foi naquela noite eleitoral que começou a ser óbvio que para alguns o objetivo era especialmente a obtenção de uma subvenção partidária e não necessariamente a eleição de uma deputada".
Joacine Katar Moreira indicou que as suas posições começaram a ser vistas como radicais por alguns elementos do Livre. "Algumas pessoas do partido estavam muito apreensivas com as minhas posições. (...) Se eu estou neste partido e não estou num outro é unicamente porque me identifico com os valores, os princípios e especialmente com a cultura democrática deste partido".
"Eu irei fazer de tudo para corresponder integralmente ao programa do partido, irei corresponder porque a campanha eleitoral para esta legislatura foi uma campanha verdadeira. Eu sou uma pessoa verdadeira, não estou aqui para enganar ninguém", sublinhou.
"Já tinha avisado que só ia estar na Assembleia até às 18h"
No domingo, dia da Assembleia do Livre, tanto a deputada como a direção do partido saíram sem prestar declarações, destacando-se a saída de Joacine Katar Moreira antes da sua conclusão. "Eu já tinha avisado dois dias antes que só íamos estar na Assembleia até às 18h porque íamos com um convidado para Carregal do Sal, a partir da estação do Oriente. E assim aconteceu".
Neste momento, tudo pode ser usado contra mim"Na altura em que me fui embora, o que estava em cima da mesa e com o qual eu concordei inteiramente foi que houvesse um mediador escolhido pela Assembleia para fazer uma mediação entre a equipa do Gabinete e o Grupo de Contacto", referiu.
"O facto é que depois de eu me ter ido embora é que resolveram que isto fosse remetido para o Conselho de Jurisdição. Isto foi votado unanimemente pelos membros da Assembleia. Neste momento, tudo pode ser usado contra mim. Mas isso não é da minha responsabilidade, eu continuo a trabalhar para o partido", rematou.