Bebiana Cunha, de 35 anos, candidata-se pela segunda vez à Câmara Municipal do Porto com o propósito de mudar a cidade e ser a primeira mulher à frente da autarquia. Quatro anos depois, a líder parlamentar do PAN diz ter crescido, ganhado "maturidade" e ter "um maior conhecimento do município".
A também deputada na Assembleia Municipal do Porto garante trazer consigo "um compromisso ambiental", preocupações com a habitação, com a mobilidade e com o "turismo responsável" para a Invicta.
Em entrevista ao Notícias ao Minuto, a candidata não se coibiu de lançar farpas -nas mais variadas temáticas - a Rui Moreira, o adversário a 'abater' nestas eleições, e revelou ter a mira apontada "quer para a Câmara, quer para a Assembleia Municipal".
As eleições autárquicas estão marcadas para 26 de setembro.
Que diferença poderia fazer o PAN na presidência da autarquia do Porto?
Uma diferença enorme. Nós partimos para esta candidatura à Câmara Municipal do Porto com o mote ‘Porto, a Nossa Ca(u)sa’; fazemos um trocadilho entre ‘casa’ e ‘causa’ precisamente na perspetiva de termos uma visão claramente ambientalista das políticas locais. E, só por aí, faríamos uma diferença porque, apesar de o atual Executivo municipal - que já vai no segundo mandato e candidata-se ao terceiro - embrulhar, muitas vezes bem, as medidas que desenvolve do ponto de vista também ambiental, em boa verdade, aquilo que é a coerência e a urgência climática…
Aliás, recentemente, tivemos conhecimento de mais um relatório do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), onde é evidente que as políticas têm um papel fundamental, pois tanto os gases de efeito de estufa, como o aquecimento do planeta devem-se a ações humanas. E, portanto, nesta matéria, o PAN traria, desde logo, uma outra posição - um compromisso ambiental.
De que forma é que pretende incluir essa questão ambiental - uma das bandeiras do PAN - na agenda autárquica?
De diferentes formas. A forma como o PAN vê os compromissos ambientais está, claramente, ligada também com a justiça social e com os Direitos Humanos. Entendemos que há um aspeto, desde logo, que necessita de atuação que é a atualização do Plano Municipal de Combate às Alterações Climáticas e esse plano tem de ser vertido no próprio Plano Diretor Municipal. O PAN foi bastante crítico do Plano Diretor Municipal, que foi recentemente aprovado, precisamente porque não dá resposta àquelas que são as necessidades do século XXI e do ano 2021, tendo em conta o conhecimento e evidência científica que temos hoje em dia. E também não dá resposta àquelas que são as necessidades estruturais das pessoas na cidade. Por exemplo, pode-se falar das questões do acesso à habitação que são um problema gravíssimo no Porto. Aliás, os dados preliminares do último Censos realizado deixam bem clara a perda da habitação.
Câmara Municipal não pode continuar a ter uma postura de subserviência à Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL) que, basicamente, gere o rio [Douro] da forma que entende
Mas em questões de ambiente pedíamos que fosse mais concreta. O que se propõe fazer?
Como medidas concretas, a atualização do Plano Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas e verter estas atualizações no Plano Diretor Municipal. Sabemos a importância do Plano Diretor Municipal enquanto instrumento de gestão do território, enquanto ocupação, por exemplo, do espaço que não está ainda impermeabilizado. E o PAN pretende uma aposta na reabilitação e não na impermeabilização de mais espaços.
Posso dar outro exemplo muito concreto: as pessoas do Porto têm-se manifestado - e bem - pela existência de mais espaços verdes de proximidade. Estes espaços são fundamentais numa perspetiva não só de promoção da biodiversidade, mas também tendo em conta o papel que o arvoredo urbano tem no combate às alterações climáticas e à perspetiva da qualidade de vida, porque está intimamente conectada à qualidade ambiental, e, por sua vez, também à saúde mental.
A existência de um Observatório da Biodiversidade na cidade, por exemplo, também, na perspetiva de monitorização daquela que é ainda a biodiversidade existente - mas com vista também à sua promoção -, e um observatório permanente da qualidade quer do ar, quer da água. Neste último mandato, andámos precisamente a exigir uma maior transparência naquelas que eram as análises às nossas ribeiras, aos nossos rios, e, em particular, do rio Douro que tem ficado completamente esquecido na gestão autárquica. A Câmara Municipal - e, por isso, o PAN faz tanta falta no Executivo - não pode continuar a ter uma postura de subserviência à Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL) que, basicamente, gere o rio da forma que entende. Permite a instalação de cais e de barcos ruidosos em qualquer local do rio, com sério prejuízo ao nível também da saúde da população ribeirinha. Do ponto de vista ambiental, também, a APDL não tem exigido as fiscalizações necessárias quer às próprias ETAR - o Douro tem várias ETAR a despejar para ele e, no Porto, duas em particular: a do Freixo e a de Sobreiras - e, aqui, é necessária uma maior fiscalização e uma maior atuação da Câmara. Isso só se consegue com uma maior transparência destes dados para com as pessoas, com os portuenses, para que possam saber efetivamente a qualidade da nossa água.
E, porque estou a falar de rio Douro, um dos aspetos que queremos que volte a ser assegurado prende-se com a travessia fluvial entre Porto e Gaia, através de um barco que seja ambientalmente responsável, elétrico, e que não tenha impactos no rio. Mas é também um aspeto que visa melhorar as questões de mobilidade e encontrar soluções que, muitas vezes, estão esquecidas, mas que já existiram. Este barco só precisa de ser substituído e permite fazer um uso responsável do rio Douro.
Uma outra questão que tem ficado na gaveta ao longo destes anos e que implica uma articulação com a Câmara Municipal de Gaia - mas que deve acontecer e que deve partir precisamente do Porto pela responsabilidade e pela importância que tem enquanto cidade - é o Plano de Gestão do Estuário do Douro. Até porque estamos a entrar numa época em que se discute o outro Plano Nacional da Gestão Hidrográfica e não faz sentido que um plano de gestão do estuário do Douro, com a importância de património natural que tem e com a importância de promoção da biodiversidade que tem - e até de valor turístico - que este plano de gestão esteja na gaveta há 12 anos. Portanto, há aqui alguns aspetos que, para nós, são fundamentais a par, claro está, da importância do município ter bem presente qual é a atual pegada ecológica que existe. E isto também se relaciona com um turismo responsável - que é o tipo de turismo que o PAN defende para a cidade - e das questões de mobilidade.
Estamos perante um problema estrutural em que aquilo que têm sido os programas de acesso à habitação acessível têm sido empurrados com a barriga. Estes programas são precisos para ontem e não para 2025
A Bebiana tem vindo a sublinhar que a cidade está a perder habitantes. O que faria para contrariar esta tendência? Que medidas pensa que faltam no Porto para conseguir fixar a população, especialmente a mais jovem?
Qualquer pessoa que resida no Porto quer ficar a residir no Porto. Sabe que é, de facto, uma cidade bastante agradável para se morar, o problema prende-se com o real acesso à habitação. Se olharmos para aquilo que foi esta crise sanitária que, supostamente, deveria fazer baixar os preços das rendas, vemos que isso não aconteceu. Há uma pressão enorme do ponto de vista dos fundos imobiliários e da especulação imobiliária que tem sido criada, o que fez com que as rendas se mantivessem em valores similares aos que já eram praticados. Ora, esses são claramente muito restritivos e impedem as pessoas de aceder ao arrendamento. Portanto, estamos aqui perante um problema estrutural em que aquilo que têm sido os programas de acesso à habitação acessível na cidade têm sido empurrados com a barriga. O que temos dito é que estes programas são precisos para ontem e não para 2025. Estas respostas de renda acessível têm de ser aceleradas e a Câmara Municipal não pode simplesmente anunciar projetos - como tem feito constantemente - como se estes já estivessem implementados. Esse é um aspeto fundamental: acelerar as respostas de arrendamento acessível às pessoas.
Mas, ao mesmo tempo, e porque já ficou perfeitamente provado na cidade que é possível desenvolver programas de habitação básica - e quando falo de habitação básica não posso deixar de me referir ao exemplo que consideramos positivo que aconteceu na cidade que é a recuperação da ilha da Bela Vista, onde foi possível recuperar casas por um valor de 30 mil euros cada - falamos mesmo de poder disponibilizar o mais básico e as necessidades mais elementares que as pessoas têm numa habitação por um valor bastante residual. Nós entendemos que é também preciso apostar na habitação básica na cidade e, para isso, a Câmara também tem de fazer investimentos e perdeu, infelizmente, muitas oportunidades, nomeadamente ao nível das ilhas, de adquirir uma série de outras para reabilitação.
Somos muito críticos dessa posição da autarquia querer sacudir para debaixo do tapete as pessoas que se encontram em situação de sem-abrigo. Não é, de todo, aceitável
A preços que a população possa pagar.
Exatamente. E, por exemplo, esta ilha da Bela Vista é uma ilha municipal onde as pessoas pagam, evidentemente, uma renda. Mas estava a dar como exemplo que cada casa custou à Câmara Municipal 30 mil euros, portanto estamos a falar de uma habitação básica que é possível de ser disponibilizada. A par disso, temos defendido e continuaremos a defender a possibilidade de instituição das cooperativas de habitação - aqui também por via de acordos com o setor privado -, mas numa perspetiva de as pessoas poderem vir a adquirir a habitação. Estes são exemplos de projetos que são necessários na cidade e para ontem… não numa perspetiva de serem anunciados e concretizados em 2025. Os dados dos Censos, para além da perda de habitantes, são claros ao nível da perda de edifícios de habitação: nós perdemos 9,3% - de acordo com os dados preliminares. Não há dúvidas de que, nos últimos dez anos, não houve o investimento necessário para garantir às pessoas respostas para se fixarem no Porto.
Conheço imensos jovens que estudam no Porto e que o que mais gostariam era de ficar a residir na cidade. O problema prende-se com esta impossibilidade de pagar uma renda. Isso não pode ser aceitável. Aqui, a Câmara Municipal tem de ter um papel fundamental na definição de uma estratégia local de habitação que inclua todos os públicos alvo. E quando nós falamos em estratégia local de habitação temos de começar, desde logo, a falar nas diferentes realidades e nas diferentes necessidades falar, por exemplo, das pessoas em situação de sem-abrigo que precisam de mais respostas na cidade. É certo que o projeto Joaquim Urbano foi um passo positivo, mas aquela que tem sido a postura atual da Câmara Municipal em relação às pessoas em situação de sem-abrigo - que assistimos, inclusivamente, a serem retirados os seus pertences e serem despejadas dos sítios onde se encontram -, não é aceitável do ponto de vista da dignidade e dos Direitos Humanos. Portanto, somos muito críticos dessa posição da autarquia querer sacudir para debaixo do tapete as pessoas que se encontram em situação de sem-abrigo. Não é, de todo, aceitável.
Mas quando falamos de problemas de habitação também não podemos esquecer as questões de pobreza energética e da eficiência energética, porque esta também é uma questão que, para além de Direitos Humanos e de habitação digna, está também relacionada com as questões ambientais. No Porto, nos últimos dados que temos, que ainda não foi feita a atualização após este cenário de crise sanitária e crise socioeconómica, já eram mais de 15 mil pessoas que viviam em pobreza energética. Estamos a falar de pessoas que, no inverno, passam frio e que correm o risco de morrer. Muitas vezes, os nossos idosos são as vítimas mais evidentes dessa realidade. Portanto, é fundamental que a Câmara Municipal implemente respostas de apoio para que as pessoas consigam melhorar as suas casas.
Não estou a dizer que a Câmara tem de fazer isto sozinha, obviamente que o Governo tem de ter responsabilidades, mas tem de haver da parte da autarquia uma postura proativa de exigir do Governo os meios necessários para que possa dar as respostas aos seus munícipes e é isso que não vemos a acontecer. Vemos muitos anúncios, muita propaganda, mas depois não se traduzem na resposta eficiente aos problemas.
Outro dos pontos que foca são as condições da mobilidade e já chegou a criticar o atual autarca por apenas falar na TAP. Duas perguntas: Como lidaria com a presente situação da companhia aérea nacional no Porto e que planos tem para melhorar os transportes públicos – STCP e ferrovia, especialmente?
A crítica que teci a Rui Moreira é que, nos últimos tempos, assistimos a uma obsessão grande do atual autarca em relação aos voos da TAP a partir do Porto, mas não ouvimos uma única palavra ao longo dos dois mandatos sobre a importância do Porto, enquanto cidade nacional e internacional, estar ligado com boas respostas e boas infraestruturas ferroviárias. E, aqui, prende-se precisamente com a ligação ao combate às alterações climáticas. Sabemos que temos de fazer transformações na forma como nos deslocamos para reduzir aquilo que são a emissão dos gases de efeito de estufa e a aviação tem um impacto bastante significativo nisso. Nesta fase, seria muito mais interessante estar a discutir as ligações ferroviárias do Porto, dentro do país, encurtando o tempo de ligação, tornando a ferrovia muito mais apetecível para justificar que as pessoas abandonassem o carro e optassem pelo comboio, mas pensando sempre também na perspetiva internacional.
O Porto, enquanto cidade de vanguarda e que se deve posicionar numa perspetiva progressista, bem localizada, com boas infraestruturas ao nível da União Europeia, tem de estar ligada também por ferrovia aos outros países e com outras cidades espanholas, onde será fundamental encurtar distâncias. Por isso, o que dizemos em relação à TAP é que enquanto companhia aérea, na qual o Governo participa e onde fez investimento para a salvar, o Porto, claramente, tem de ter respostas e isso tem de ser exigido. Mas neste momento, o debate em torno da mobilidade já devia estar centrado noutras formas de deslocação e pensado numa perspetiva de médio e longo prazo. A nossa crítica vai para o facto de não ouvirmos o atual autarca falar uma única vez sobre as ligações ferroviárias e a importância que podem ter, se forem, de facto, eficientes.
Mas falou também nos transportes públicos. A partir do momento em que o Porto assume a municipalização da STCP - que nos parece ser uma oportunidade única para criar respostas mais eficientes e mais atrativas para as pessoas - isso significa que tem de haver uma outra frequência dos horários, que tem de haver outras ligações, para que as pessoas tenham o transporte público acessível perto de sua casa e que não necessitem de estar constantemente a recorrer ao seu veículo particular.
Claro que a mobilidade tem de ser pensada não só dentro do Porto, mas também na própria área metropolitana, numa perspetiva intermodal. Têm de ser criadas condições para que as pessoas possam circular ou a pé ou de modos suaves e, para isso, a cidade precisa de se transformar.
Já não serve aquele argumento que Rui Moreira usou em tempos de que a Câmara não manda na STCP. Agora manda
E como é que o PAN, especificamente, pretende criar essa ligação intermodal, aumentar os horários, aumentar o número de veículos, que, segundo diz, Rui Moreira não conseguiu fazer até agora?
A da STCP parece-me relativamente fácil a partir do momento em que o Porto assumiu a municipalização. Estando na administração é uma decisão sua aumentar a frequência dos autocarros, aumentar as linhas e pô-los a funcionar. Portanto, já não serve aquele argumento, que Rui Moreira usou em tempos, de que a Câmara não manda na STCP, agora manda.
Quanto à intermobilidade, temos uma estratégia nacional para a mobilidade ativa. Entendemos que deve haver também uma estratégia municipal que vise promover as deslocações por modos suaves, sempre nesta perspetiva de as pessoas poderem deslocar-se de forma segura, com parques de estacionamento para os seus transportes e poderem trocar para o autocarro ou o metro. Mas isso significa que a cidade tem de estar ligada por aquilo que antigamente se chamava 'ciclovias' - mas esse conceito caiu em desuso, porque muitas asneiras foram feitas e no Porto temos bem noção disso, até pelo que aconteceu na da Asprela que foi uma desgraça pegada - e a que, neste momento, chamamos eixos cicláveis. Têm de ser criadas nas próprias vias, têm de ser alargados pela cidade e tem de haver a redução da velocidade para 30km/h como já se fez noutras cidades internacionais, como Madrid, na perspetiva de haver uma condução mais responsável no grande centro urbano e minimizarmos o risco de acidentes. Até para as pessoas poderem usar estes meios - trotinetes, bicicletas - sem receio da velocidade elevada dos condutores. Temos de criar medidas que conciliem todos os interesses de quem tem de se deslocar, criar políticas que permitam uma coexistência e uma partilha de usos, neste caso das estradas, de forma mais harmoniosa.
Não nos podemos esquecer, claro, da importância das linhas de metro na cidade e que, segundo percebemos daquilo que têm sido os anúncios, vão levar o seu tempo até estarem concluídas. Mas, idealmente, claro que toda a gente gostaria que a cidade estivesse o mais coberta possível por uma linha de metro ou um equivalente. Muitas vezes um elétrico mais moderno… E a perspetiva do PAN passa sempre por esta lógica de uma aposta eficiente nos transportes públicos.
Que críticas e elogios lhe merece a forma como a pandemia foi gerida na cidade? Os portuenses puderam contar com o executivo camarário da forma como seria esperado?
Começava pelo elogio porque se calhar é mais curto. Parece-nos que, na fase inicial desta crise sanitária, o Executivo andou bem, ou seja, procurou fazer aquilo que o Estado Central não estava a fazer, nomeadamente ao nível da testagem. A partir do momento em que conhecemos o funcionamento deste vírus, percebemos que as chaves eram testar e rastrear. Sabíamos também, do ponto de vista nacional, que aquilo que eram os recursos existentes ao nível da saúde pública estavam muito aquém das reais necessidades para fazer este rastreamento. Portanto, a Câmara Municipal do Porto, a partir do momento em que decidiu fazer o investimento na testagem da população, esse foi evidentemente um aspeto positivo - e que nós aplaudimos. Ao mesmo tempo, aplaudimos também aquela que seria a intenção de criar um hospital de campanha, caso viesse a ser necessário. Houve aqui uma atuação preventiva e de resposta rápida que estava a faltar por parte do Estado Central e que o executivo camarário procurou dar e nos pareceu que foi positivo.
Acontece, depois, que à gestão no decorrer da própria crise sanitária e da sua acentuação - quer na restauração, quer nas Pequenas e Médias Empresas, nas respostas também, por exemplo, aos nossos idosos, nas respostas ao nível da saúde mental, nas respostas que estavam a ser exigidas também do ponto de vista das pessoas de uma maneira geral na cidade - aí tecemos várias críticas.
Levámos várias recomendações à Assembleia Municipal com vista a um maior apoio à economia local, mas também de respostas ao nível da saúde mental e do combate ao isolamento. Uma das propostas que apresentámos visava alargar o projeto que a Câmara tem de identificação das pessoas idosas nos bairros municipais. Nós entendemos que este projeto deve ser alargado a todos os idosos na cidade e que as pessoas que estão sozinhas têm de ter uma rede social - e que essa rede social tem de ser suprida pela Câmara. Isto não se faz apenas com respostas assistencialistas. Aliás, nós temos projetos na cidade muito interessantes que devem ser reforçados, como os Serviços de Apoio e Acompanhamento Social. Estes precisam de mais meios, e com aquela que vai ser a transferência de competências ao nível da ação social, a autarquia terá aqui um papel fundamental. Mas, volto a dizer: a existência de espaços de proximidade, onde as pessoas possam conviver, os espaços verdes, a existência de hortas comunitárias, de uma rede de parques caninos…
Há uma série de necessidades que as pessoas do Porto têm e continuam sem essas respostas porque o Executivo decidiu não as dar. Não as considerou prioritárias
E tudo isso, no âmbito da crise pandémica, considera que não foi levado a cabo por Rui Moreira.
Exatamente. Há uma série de respostas fundamentais na cidade que ficaram por dar e que não foi por falta de capacidade económica. Esta é a crítica que nós fazemos ao Executivo. Há, de facto, uma capacidade económica - por fruto da dinâmica da cidade, das taxas que tem implementadas - o que significa que fazer ou não fazer são opções políticas. E aqui somos críticos, porque há uma série de necessidades que as pessoas do Porto têm - e continuam a ter - que continuam sem respostas porque o executivo decidiu não as dar. Não as considerou prioritárias. É legítimo. Mas também é legítimo criticar.
Bebiana Cunha, candidata pelo PAN à Câmara Municipal do Porto© Global Imagens
Entendemos que a Câmara Municipal deve ter um papel regulador, não na lógica do 'Cheguem os aviões e depois fica tudo ao Deus dará'
Em 2017, defendia uma limitação do Turismo no Porto. Tendo em conta a quebra ocorrida, como resultado da pandemia, neste setor e o emprego que cria, continua a considerar que esta intenção faz sentido?
Estamos perante uma oportunidade única de algo que já deveria ter sido feito e não foi, que é regulamentar o turismo na cidade. Estamos a falar de haver políticas efetivas e estruturadas no sentido de definirmos quantas pessoas é que queremos na cidade ao mesmo tempo. O município tem, de facto, de ter esta política, porque há aqui uma correlação significativa com a perda de edifícios de habitação - eles foram, como sabemos, para criar alojamentos para turismo, hostels e hotéis. Não podemos dizer que queremos habitação para as nossas pessoas na cidade e, ao mesmo tempo, querer um turismo totalmente liberal, como nós temos e que impera no Porto - ‘cheguem os aviões todos que chegarem e as pessoas hão de ter cá lugar’.
O PAN defende a importância do turismo - e não só pela sua importância para a economia local, mas também porque a nossa cidade é demasiado bonita para ficar só para nós. Tem de ser partilhada. Mas queremos um pelouro que trate do turismo responsável, que visa definir o número de turistas tendo em conta a pegada deixada - não só do ponto de vista da pegada ecológica, mas também da habitação. Para nós, é fundamental conseguirmos alcançar este equilíbrio, não numa perspetiva de o turismo ser mau ou ser o bode expiatório, mas simplesmente de haver uma regulação. Entendemos que a Câmara Municipal deve ter um papel regulador, não na lógica do 'Cheguem os aviões e depois fica tudo ao Deus dará'.
A pergunta era mais no sentido de se, neste momento, tentar criar essa limitação não seria quase contraproducente tendo em conta que o setor está a passar dificuldades.
O que acho, sinceramente, é que a política tem padecido unicamente do aqui e do agora. Sabemos bem que temos de olhar para a política numa perspetiva de médio e longo prazo, até porque neste momento quando usamos o mote 'Porto a nossa ca(u)sa', como dizia, está claramente relacionado com as questões do planeta. Se não tivermos uma casa - seja ela no sentido literal da habitação, seja ela de um planeta para habitar - estamos altamente comprometidos na perspetiva da nossa própria sobrevivência.
Em termos das decisões políticas tomadas hoje, têm de ter uma visão política de médio e longo prazo. Não podemos tomar uma decisão a pensar só no próximo meio ano e numa recuperação em que trazemos tudo e exploramos os recursos ao máximo e depois logo se vê. Rui Moreira fala muito no turismo como a 'galinha dos ovos de ouro' e lembro-me que, a data altura, num debate, lhe dizia: 'Há uma ideia de termos um turismo que seja duradouro e não que se esgote'. Por isso é que falamos nesta questão de haver limites.
Os gastos na campanha no Porto têm estado na ordem do dia. Que comentário lhe merece o orçamento – e as justificações para tal – de Rui Moreira? Onde se insere o PAN no que a gastos nas Autárquicas diz respeito e onde são alocadas essas verbas?
Segundo a informação que é pública, falamos da campanha que vai ter mais elevado gasto no país. Dentro daquilo que é o quadro legal, o movimento pode evidenciar-se como entender, acho é apenas que Rui Moreira deveria assumir esses mesmos gastos, em vez de estar a assumir este 'bate-bocas' com os partidos. Aquilo que referimos é que, da parte do PAN, o nosso orçamento é uma migalha comparado com o de Rui Moreira. Estamos a falar de um orçamento de perto de 15 mil euros, que se prende com as ações que vamos fazer na rua e com a existência de recursos humanos. É uma campanha modesta, humilde, à nossa maneira, mas sempre de forma responsável.
Recentemente foi publicado o relatório de entidade das contas e financiamento de partidos políticos sobre as autárquicas de 2017, onde o PAN se destacou pela positiva, pois é referido como o único partido que não apresenta irregularidades nas contas autárquicas. Portanto, não posso deixar de referir que tentamos sempre fazer tudo da forma mais responsável e mais regular. Apresentamo-nos a esta campanha com um orçamento que é uma migalha comparado ao orçamento do Moreira ou do PSD ou PS. Mas não é por isso que vamos deixar de fazer as nossas ações e de tentar chegar às pessoas e passar as nossas mensagens.
O próprio de Rui Moreira, que muitas vezes se faz arauto de independente, sabemos que é apoiado por, pelo menos, dois partidos políticos e que tem financiamento desses partidos, por isso não se percebe esta necessidade de dizer tantas vezes que é independente quando estamos perante um movimento que é claramente partidário. E digo isto de consciência tranquila, porque estou num partido político ciente de que estou num partido político e com muito orgulho nisso.
O que é que mudou desde a sua candidatura em 2017 para esta?
Cresci, pelo menos em idade, são mais quatro anos em cima [risos]. Sem dúvida há todo um trabalho de Assembleia Municipal que mantive e cujo mandato terminará agora em setembro. Foi um trabalho muitas vezes solitário como única voz a defender determinados temas na Assembleia Municipal, muitas vezes de formiguinha a tentar, junto dos outros partidos políticos, mostrar a importância de determinadas recomendações do PAN serem aprovadas. Conseguimos marcar uma posição - que é a posição das pessoas que votaram no PAN - e fi-lo com o mais elevado sentido de responsabilidade. Em 2019, fui eleita deputada da Assembleia da República pelo distrito do Porto, com o voto de 32.323 pessoas - o que é representativo da força do PAN no distrito do Porto: significa que temos cada vez mais pessoas que querem ter a nível nacional uma representação do PAN pelo distrito - e, em 2021, fui eleita líder parlamentar do PAN.
Portanto, temos aqui um percurso, em quatro anos, político. Dou nota de que só desde 2019 é que passei a ser política de profissão. Fui onze anos psicóloga, em contexto educativo, clínico e comunitário, quer no setor público quer no privado. Até aí colaborava com o partido em regime de voluntariado. Há um caminho que foi feito e que implica um maior conhecimento do município, das decisões políticas tomadas, uma procura de participação para tentar que algumas das decisões políticas fossem noutro sentido, algo que, em 2017, não existia. Há uma outra maturidade e um outro caminho que ao longo destes quatro anos procurei fazer.
Estaremos disponíveis para aquilo que os portuenses e as portuenses entenderem que deve ser a representação na cidade
O que é um bom resultado para a Bebiana e para o PAN nestas eleições? Tem algum pelouro ‘na mira'?
Qualquer partido político que se apresente a eleições apresenta-se para vencer. O nosso objetivo é claramente eleger, de acordo com o que for a vontade dos portuenses. Precisamos de ter mais vozes na Assembleia Municipal, mas precisamos [também] de ter mais vozes onde efetivamente se tomam as decisões de execução da cidade. Para nós é esse o percurso.
Temos uma mira quer para a Câmara, quer para a Assembleia Municipal e qualquer resultado nesse sentido será um bom resultado. Sendo que estaremos disponíveis para aquilo que os portuenses e as portuenses entenderem que deve ser a representação na cidade.
Pensa que, de alguma forma, as negociações para o Orçamento do Estado poderão ser condicionadas ou ‘afetadas’ pelas eleições Autárquicas?
Estamos a falar, de facto, de dois momentos muito importantes para o país. Se, por um lado, falamos de pessoas que vão ser eleitas para gerir municípios e para tomar decisões do ponto de vista local nos próximos quatro anos… Nós, como não temos muito tempo até ao ponto de não retorno, estamos em alturas cruciais do ponto de vista da nossa vida e do que são as decisões políticas, até na perspetiva de afetarmos não já as gerações vindouras mas as gerações atuais. Já não faz sequer sentido nós estarmos a falar das gerações que aí vêm. Não, nós estamos a falar de decisões políticas que, claramente, vão afetar os nossos jovens de hoje em dia, as nossas crianças e os nossos adultos.
Por outro lado, claro que o Orçamento do Estado, que é o instrumento que permite que o país funcione durante o próximo ano, é um momento crucial. Acontece que o facto de estas duas datas se cruzarem seria quase inevitável. O que vai ter aqui que haver é um esforço enorme para que se consiga fazer ambas as partes. Nós temos estado já em conversações com o Governo na perspetiva de percebermos se há alguma base de diálogo e se há aqui vontade, no fundo, de levar a cabo medidas que nos parecem fundamentais para um Orçamento do Estado. E esse debate, esse partir pedra em reuniões, vai ter de acontecer mas, ao mesmo tempo, claro que, da minha parte, também vou ter de estar no Porto em momentos muito específicos. Diria que aquilo que está a acontecer - e que ainda se vai intensificar - são bastantes menos horas de sono. Tive agora também um período de férias onde procurei restabelecer energias para esta etapa que será muito desgastante - mais para partidos da dimensão do PAN, onde acabamos por ter de nos dividir um pouco mais e fazer diferentes tarefas, todas muito importantes.
Mas considera que uma vitória na Câmara do Porto poderia reforçar o poder negocial?
Qualquer vitória é muito importante na lógica de que quanto mais eleitos nós tivermos, mais força temos. Quer para conseguirmos alcançar as nossas propostas, quer para fazer pressão. E estamos a falar de algo que está muito ligado que é o Estado Central e o poder local. Portanto sim, evidentemente que sim.
Nunca o Porto teve uma presidente no feminino e tenho tido o cuidado - porque é sincero - de dizer que há muitas mulheres na cidade que poderiam ser presidentes de Câmara
Que valor tem para si o facto de, se ganhar, ser a primeira mulher à frente da Câmara Municipal do Porto?
Penso que estamos a falar de algo que seria inédito. Nunca o Porto teve uma presidente no feminino e tenho tido o cuidado - porque é sincero - de dizer que há muitas mulheres na cidade que poderiam ser presidentes de Câmara. Acho que as mulheres num executivo municipal e em cargos de presidência e de direção fazem muita falta e numa cidade como o Porto também. Assistimos a muitos movimentos não só nacionais mas também internacionais e quando exploramos quem os está a inspirar percebemos que são mulheres, sabemos bem que temos outra forma de ver e de estar na política. Também temos, talvez, um bocadinho mais de inteligência emocional, que faz muita falta no relacionamento institucional entre todos e, acima de tudo, na proximidade às pessoas, que é algo que aqui não posso deixar de criticar o atual executivo. Ao longo destes últimos quatro anos, infelizmente, muitas vezes fez-se de surdo aos cidadãos, aos munícipes do Porto, que sabemos bem que são pessoas participativas e que, inclusivamente, criam petições e fazem ações importantes na cidade que querem levar ao Executivo para que a sua visão seja ouvida.
Acho que uma mulher faz muita diferença, também aí. Pela sua capacidade de escuta ativa e de dar atenção a pormenores e saber que, muitas vezes, estes, em conjunto, são muito mais do que aquilo que se vê numa primeira abordagem.
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