O secretário-geral do Partido Socialista (PS), Pedro Nuno Santos, apresentou, no último domingo, a menos de um mês das Eleições Legislativas de 10 de março, o programa eleitoral do partido.
Durante pouco mais de uma hora, o secretário-geral do PS admitiu que a Saúde, a Habitação e o desenvolvimento da Economia são "desafios", mas também "prioridades" do partido, que quer agora "mudar" o que correu menos bem para a governação socialista nos últimos anos e "apontar para o futuro" sem "arrastar os pés". Além de Pedro Nuno Santos, também intervieram o atual ministro das Finanças, Fernando Medina, e Alexandra Leitão, que coordenou a elaboração do documento.
O documento, de 144 páginas, intitulado 'Plano de Ação para Portugal Inteiro', foi definido pelo partido como "muito mais do que um programa eleitoral", "verdadeiramente completo" e "representa uma nova atitude e um novo impulso para o país", no qual "ninguém fica para trás". Mas o que promete o PS?
PS quer que Estado dê garantia ao crédito para casa a pessoas até 40 anos
Para apoiar a aquisição de casa própria, o programa pretende que o Estado preste uma "garantia pública ao financiamento bancário nos créditos para aquisição de casa própria de pessoas até aos 40 anos que ainda não tenham nenhuma habitação em seu nome".
Em caso de incumprimento do pagamento do crédito à habitação pelos beneficiários dessa garantia, o devedor pode, contratualizando com o Estado, manter a casa como habitação permanente, mediante o pagamento de uma renda ao Estado, que assumiria a sua posição no crédito, adianta ainda o documento.
O agravamento das mais-valias em imóveis adquiridos e vendidos sem que tenham sido recuperados ou habitados e o aumento da despesa dedutível com arrendamento em sede de IRS em 50 euros por ano até atingir os 800 euros são outras das medidas avançadas pelo PS.
Início de negociações para valorizar carreiras e salários no Serviço Nacional de Saúde
Caso forme Governo, o PS pretende iniciar negociações imediatas com os profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) para rever as carreiras e valorizar os salários, e admite, no que respeita às pensões, alterar o modelo de atualização.
No capítulo dedicado ao SNS, o programa prevê a equiparação da posição de entrada dos enfermeiros aos licenciados da carreira geral da administração pública, assim como a atribuição de incentivos especiais aos profissionais que trabalhem em territórios menos atrativos, através de apoios ao alojamento e às famílias.
Outra das medidas passa por uma maior abrangência de atividade de enfermagem, sobretudo nos contextos em que a resposta médica é insuficiente, aumentando a capacidade de prestação de cuidados de saúde de proximidade.
O PS pretende rever e "dignificar a carreira" dos administradores hospitalares e das chefias intermédias do SNS, promovendo a sua valorização salarial e a adoção de um modelo de avaliação de desempenho adequado.
Já em relação ao modelo de governação do SNS, o documento aponta para uma maior articulação e integração entre os cuidados de saúde primários, hospitalares e cuidados continuados, contrariando assim a "excessiva centralidade da rede hospitalar e a duplicação de custos" nesse serviço público.
Um eventual governo liderado por Pedro Nuno Santos vai adotar um modelo de governação do SNS de "comando vertical", centrado na direção executiva, e reforçar a autonomia dos conselhos de administração hospitalares e das unidades de proximidade, ao nível da gestão orçamental e de contratações, os quais verão também aumentada a sua responsabilização e a avaliação de desempenho e de resultados.
No documento, o PS assegura que cumprirá integralmente a fórmula de atualização, sem prejuízo de "uma valorização adicional nos grupos mais desfavorecidos", permitindo que os "pensionistas mantenham níveis de vida dignos face aos que tinham na idade ativa, e de melhorias ao próprio modelo".
Para isso, o PS propõe-se avaliar alterações ao modelo de atualização das pensões, que podem incluir a ponderação, na indexação da atualização, de outras variáveis macroeconómicas, como a variação da massa salarial, para cálculo dos aumentos, assim como a garantia de aumentos mínimos, "prevenindo a estagnação dos valores das pensões mais baixas".
Promessa de "negociações imediatas" com forças de segurança
Face aos protestos dos agentes da PSP e dos militares da GNR, o partido liderado por Pedro Nuno Santos promete "desencadear negociações imediatas com as associações sindicais e profissionais representativas das forças de segurança".
O PS diz-se designadamente disposto a aceitar um "plano concertado de revisão das carreiras com vista à valorização salarial e ao reforço da dignidade da condição policial, em especial para as funções que comportam risco e penosidade, por forma a garantir um tratamento equitativo entre funções e atividades semelhantes".
Após esta alusão à medida tomada pelo executivo de António Costa em relação à Polícia Judiciária e que esteve na origem da contestação dos agentes da PSP e militares da GNR, no programa eleitoral dos socialistas foi também inscrita a intenção de "assegurar condições aos profissionais deslocados, através de apoios ao alojamento e das suas famílias, contemplando um maior equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal e familiar".
Também neste capítulo, constam medidas para os corpos de bombeiros, tendo em vista melhorar a sua atividade.
Revisão dos prazos judiciais e clarificar poderes na PGR
O PS pretende proceder a uma revisão transversal dos prazos judiciais, clarificar as formas de coordenação e dos poderes hierárquicos da Procuradoria-Geral da República (PGR) e regular as atividades de representação de interesses junto do Estado.
Ainda neste capítulo da justiça, entre outras medidas, o PS pretende "repensar o modelo de recrutamento e de seleção dos novos magistrados judiciais e do Ministério Público".
Já em matéria de combate à corrupção, o PS insiste na necessidade de se "regular as atividades de representação de interesses junto de entidades públicas, envolvendo registo de transparência das interações com decisores públicos".
"Regular os mecanismos de monitorização da pegada legislativa que lhe são complementares e dotar a Entidade da Transparência -- concluído que está o respetivo processo de instalação e de arranque da plataforma para submissão e publicitação das declarações de registo de interesses dos titulares de cargos políticos - de meios para o desempenho de uma missão de pedagogia e esclarecimento", são outras duas medidas previstas no programa eleitoral dos socialistas.
O PS promete, ainda, aprofundar medidas para "melhores práticas respeitantes a códigos de conduta, regras deontológicas, incompatibilidades, gestão de conflito de interesses, portas giratórias, âmbito de aplicação dos períodos de nojo, e resposta a pareceres solicitados por instituições públicas.
Ainda neste capítulo de prevenção e combate à corrupção, os socialistas destacam a importância de "acolher a experiência de vários anos de aplicação da primeira geração de códigos de conduta das instituições públicas e promover a sua revisão e atualização" e, igualmente, de "rever o enquadramento legislativo no domínio do acesso à informação e a documentos da Administração Pública".
Simplex Rural para os agricultores
O PS propõe a criação de um 'Simplex Rural' para "desburocratizar" os procedimentos e apoios à exploração pelos agricultores, assim como "fixar preços mínimos pagos ao produtor", para "garantir um valor compatível e justo face aos custos de produção".
Os socialistas defendem que o país precisa de "promover um diálogo ativo com os produtores - agricultores, silvicultores e apicultores", de modo a compreender "a importância e o papel crescente da agricultura e florestas, enquanto setores de futuro, inovação autonomia e investimento, sobretudo no mundo rural e em territórios de baixa densidade".
O PS quer ainda "alargar a contratação de seguros de colheita, tornando-os mais atrativos para os agricultores e incentivando a contratação conjunta, com vista à estabilização do rendimento agrícola e a uma maior segurança para investir no setor".
Propõe ainda "criar um programa de apoios aos pequenos agricultores que hoje se debatem com a insegurança hídrica para a instalação, nas suas propriedades, de contadores, sondas de água, bombas de extração de água com energia solar, pequenos reservatórios de águas pluviais, rega gota-a-gota", bem como "fomentar apoios à pequena e média agricultura, com a implementação das medidas asseguradas no âmbito da PEPAC [Plano Estratégico da Política Agrícola Comum]".
Devolver às famílias mais pobres parte do IVA de bens essenciais
O PS promete devolver às famílias com menores recursos parte do IVA suportado em consumos de bens essenciais e reduzir o IRS para a classe média, através da diminuição das taxas marginais.
Além da "redução do IRS para a classe média, dentro da margem orçamental" e "diminuindo as taxas marginais", os socialistas prometem atualizar os limites dos respetivos escalões "de acordo com a taxa de inflação, impedindo que os contribuintes vejam a sua tributação aumentar por este efeito".
O alargamento do IRS Jovem "a todos os jovens, independentemente do nível de escolaridade atingido, por uma questão de justiça e coerência interna à medida", é outra das medidas do programa.
O PS propõe-se também "aumentar a despesa dedutível com arrendamento em Euro50 por ano até atingir os Euro800 em 2028, aliviando as famílias com esta despesa fundamental" e "reduzir em 20% as tributações autónomas sobre viaturas das empresas, diminuindo o nível de tributação sobre a esmagadora maioria" delas.
No campo da energia elétrica, o partido liderado por Pedro Nuno Santos promete aplicar a taxa de 6% aos primeiros 200 kWh de consumo mensal (duplicando os atuais 100 kWh), ou de 300 kWh mensais, no caso das famílias numerosas (duplicando os atuais 150 kWh), considerando ser uma "medida essencial de combate à pobreza energética".
"Novo equilíbrio" entre redução da dívida e estímulo à economia
O PS promete um "novo equilíbrio" entre a redução da dívida pública e o estímulo à economia, com aumentos salariais sempre superiores à inflação até ao final da legislatura.
O cenário macroeconómico dos socialistas prevê a redução da dívida pública de de 95,1% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2024 para 80,1% do produto no final da legislatura, em 2028.
O PS aposta numa variação do crescimento económico a rondar os 2% do PIB por ano, partindo de 1,5% em 2024 e situando-se em 2% em 2028, passando por 2,2% em 2025, 2,1 em 2026 e 2,0 em 2027, numa progressão de "continuada convergência" com a União Europeia, sempre "assente num aumento sustentado da produtividade".
O programa eleitoral dos socialistas prevê igualmente "uma redução da taxa de desemprego ao longo do período", num mercado caracterizado como "próximo do pleno emprego", situando-se em 6,5% da população ativa para recuar até 5,7% em 2028.
De acordo com os socialistas, "as valorizações remuneratórias das Administrações Públicas, o aumento do salário mínimo nacional e o cumprimento do Acordo de Rendimentos promovem um aumento das remunerações acima da inflação em todo o horizonte do programa".
O PS aposta na "manutenção de saldos orçamentais em equilíbrio, um crescimento da despesa corrente primária em torno dos 4%, próximo do crescimento nominal potencial da economia, bem como uma redução sustentada da dívida pública, garantindo o cumprimento integral das regras orçamentais europeias e da Lei de Enquadramento Orçamental".
Propõe-se também "assegurar anualmente o equilíbrio orçamental (designadamente em termos estruturais)" e "assegurar a redução continuada da dívida pública, agora a um ritmo de cerca de 3 a 4 pontos percentuais por ano (cerca de 1/3 do que foi feito nos últimos anos)".
Libertar ministros setoriais do controlo das Finanças
Durante a apresentação do programa, o secretário-geral do PS prometeu aumentar a autonomia dos ministros setoriais na ação governativa, libertando-os do controlo das finanças, delegar mais poderes na administração intermédia e maior transparência na comunicação das medidas ao povo.
"Queremos um Governo com autonomia, um Governo em que os ministros setoriais têm autonomia. Num Governo não é o Ministério das Finanças quem manda, é o primeiro-ministro e o Conselho de Ministros - e é assim que queremos que funcione", declarou o líder do PS, surpreendendo com esta autocrítica muitos socialistas que se encontravam no Teatro Thalia.
O secretário-geral do PS falou também numa cultura de maior transparência na comunicação com os cidadãos, começando por se referir a episódios em que as medidas previstas pelos ministros setoriais acabam por minguar após passarem pelas Finanças.
Privatização da TAP? Nenhuma referência no programa eleitoral. E o novo aeroporto?
O PS não faz referências no seu programa eleitoral à privatização TAP, e propõe que a companhia aérea mantenha ligações "regulares e acessíveis" para países com comunidades portuguesas de dimensão significativa.
"Garantir que a TAP mantém ligações aéreas regulares e acessíveis com os países onde residem significativas comunidades da diáspora", é a única referência à TAP no documento
Quanto ao novo aeroporto, o programa refere que o PS "tomará rapidamente" uma decisão sobre a localização, depois de concluído o trabalho da Comissão Técnica Independente, e defende que o Estado deve garantir a "continuação do desenvolvimento das restantes infraestruturas aeroportuárias".
O PS afirma que "o contrato de concessão dos aeroportos nacionais coloca constrangimentos à decisão do Estado, como já identificado no próprio relatório da CTI".
Os socialistas defendem que "o Estado não deve abdicar de nenhum dos mecanismos de que dispõe para assegurar que tem a margem para decidir de acordo com o interesse nacional e garantir a execução, não só do novo aeroporto de Lisboa, como a continuação do desenvolvimento das restantes infraestruturas aeroportuárias".
Pode consultar o programa eleitoral do PS na íntegra aqui ou rever o acompanhamento ao minuto da apresentação aqui.
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