"Maior parte das pessoas que anda na política ou é medrosa, ou medricas"
A segunda parte da entrevista do Vozes ao Minuto ao ex-candidato presidencial e líder da recém-constituída associação Frente Cívica.
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Política Paulo Morais
Marcelo é “simpático”, mas ainda nada fez pelos portugueses, já Passos Coelho, opina, é um “mentiroso”. Paulo Morais diz-se, ainda, social-democrata, mas entre as figuras políticas no poder apenas destaca pela positiva… Jerónimo de Sousa.
“Os políticos sérios ou já morreram ou tiveram de se ir embora”, os restantes são “medricas”, lamenta aquele que foi candidato às últimas eleições presidenciais nesta segunda parte da entrevista ao Vozes ao Minuto.
Foi militante do PSD mas afastou-se em 2013. Ainda se identifica como social-democrata?
Completamente. E tenho tido o cuidado de fazer até, periodicamente, uma revisitação doutrinária da social-democracia.
O PSD foi-se afastando da social-democracia desde o terceiro Governo de Cavaco Silva, a segunda maioria absoluta. A gota de água que me fez abandonar o PSD foi quando Passos Coelho apresentou um programa e quando tomou posse fez tudo ao contrário do que tinha prometido.
Eu sou claramente um social-democrata porque acredito, por um lado, na liberdade das pessoas, acredito que cada um deve arbitrar livremente a sua vida, e também a nível das empresas cada um deve empreender o que entender.
Para isso acontecer, tem de haver igualdade de oportunidades, uma rede de suporte na Educação, ne Saúde. Para mim, o modelo que gera igualdade de oportunidades é claramente a social-democracia.
Se não fosse Passos Coelho...
Passos Coelho foi aquilo que todos os primeiros ministros têm sido: mais um mentiroso. O seu antecessor, José Sócrates, também tinha prometido não aumentar os impostos; Durão Barroso tinha prometido baixar os impostos e aumentou-os…
Quem se candidata a primeiro-ministro tem de conhecer as contas públicas. Se diz que vai baixar impostos e quando toma posse os aumenta ou conhecia mal as contas, e é incompetente, ou conhecia bem e é mentiroso. Em qualquer das circunstâncias não deve ser primeiro-ministro.
Em Portugal os partidos são bandos de assalto ao poder
Os partidos esgotam-se em duas atividades: tentar assaltar o poder para distribuir negócios pelos financiadores dos partidos e distribuir lugares pelos apaniguados que levam os dirigentes à sua eleição.
A vida partidária hoje é pobre, está muito desagradada e é perversa.
Há alguém cuja prestação no Parlamento queira destacar pela positiva?
Jerónimo de Sousa tem sido coerente, no sentido em que não tem saído da sua linha. Passos Coelho também tem sido coerente face ao discurso que tinha no dia das eleições. A minha desilusão com ele não é de agora.
Entre toda esta confusão quem tem sido mais coerente é o líder do Partido Comunista. Tem tido um discurso coerente, com o qual a maior parte das vezes não concordo, mas admiro-lhe a coerência e seriedade por comparação com os restantes que andam ao sabor da onda mediática.
Há alguém com quem se identifique? Que poderia apoiar?
Hoje na política em Portugal tenho dificuldade. Tenho dificuldade entre os políticos vivos em encontrar coerência. Têm-se todos afastado completamente da política. Há entidades e personalidades que eu destaco. A associação 25 de Abril e Vasco Lourenço, por exemplo.
Gostava de identificar mais gente na política que tivesse a minha admiração. Mas as pessoas ou são culpadas ou cúmplices
Os políticos sérios ou já morreram ou tiveram de se ir embora.
Se tivesse vencido as eleições presidenciais, seria Paulo Morais contra todos?
Se eu tivesse vencido as presidenciais o ambiente seria diferente. A maior parte das pessoas que anda na política ou é medrosa, ou medricas. Se houvesse um Presidente que impusesse ao Parlamento uma estratégia global contra a corrupção eles também iriam, porque vão para onde vai a onda. Mas não teria muitos apoiantes, não. É uma constatação óbvia.
O aumento de capital da Caixa Geral de Depósitos tem sido alvo das condenações mais recentes. É o assunto que mais o preocupa?
A recapitalização da Caixa faz-me tirar do sério. É um dos assuntos que me perturba. A CGD vai ter uma recapitalização que representa aproximadamente dez milhões de salários mínimos. Através do Orçamento, o Estado vai pegar em dez milhões de salários mínimos e colocá-los na CGD.
O Governo tem enganado a opinião pública no sentido da recapitalização da Caixa quando os próprios documentos da CGD dizem que assim não é. Quando é que é preciso um aumento de capital? Ou quando há problemas de liquidez e a Caixa tem excesso de liquidez, ou quando há questões de solvência. Mas documentos da Caixa de agosto de 2016 dizem que o banco está dentro dos rácios adequados.
No entendimento da Caixa não há necessidade de aumento de capital. Vender isto à opinião pública só pode querer dizer uma de duas coisas: ou os documentos da CGD são falsos ou manipulados, e este é um cenário que eu ponho de parte, ou é porque são verdadeiros e a Caixa não precisa de uma recapitalização.
É um embuste. É uma manobra de intoxicação da opinião pública criando a ideia de que é necessário um aumento de capital quando efetivamente não é. Perguntar-me-á ‘mas então para que é que eles querem os quatro vírgula tal mil milhões de euros?’ pois, eu nem quero adivinhar para que é que isso será. Espero que não seja para enfrascar o mercado de dinheiro por questões eleitorais ou, até, em ano de eleições autárquicas, para satisfazer o crédito das autarquias.
Já quando em 2008 se nacionalizou o BPN senão vinha ai a catástrofe, o inferno e o dilúvio, abria um ‘risco sistémico’ - era a expressão que então se utilizava – e foram muito poucos aqueles que disseram que se calhar não se devia nacionalizar. Hoje toda a gente diz que é um erro, mas na altura todos defenderam a solução.
Se houver recapitalização da Caixa, vai correr mal de certeza e daqui a cinco ou seis anos estamos nós amargamente a pagar com os nossos impostos.
Concordava com o decreto-lei que propunha o fim do sigilo bancário para contas com mais de 50 mil euros?
Sobre este decreto em concreto não queria falar, porque acho que tem alguns defeitos. Em termos gerais, acho que num Estado fiscal, em que há impostos sobre património, não deve haver qualquer tipo de sigilo bancário.
Todo o património das pessoas deve ser conhecido. Entendo que as pessoas tenham reserva da sua vida, mas ao nível da intimidade. Não confundir isso com devassa da vida privada.
No que toca às contas bancários o acesso do Fisco deve ser livre por regra e não em casos de exceção, interdependente do valor. Com uma boa regulamentação, para evitar voyeurismo. Por uma questão de transparência fiscal.
Adotar esse sistema não poderia trazer mais riscos do que benefícios?
As pessoas que ganharam o seu dinheiro honestamente não têm qualquer problema em que se saiba.
O dinheiro que anda escondido é melhor que não esteja cá. Portugal não precisa para nada de dinheiro proveniente da corrupção de outros países. Quem quiser vir para Portugal esconder dinheiro consegue fazê-lo com facilidade.
Lisboa é a maior lavandaria de dinheiro sujo de Angola. E de outros países também. E o que é que Portugal tem ganhado com as transferências de dinheiro de Angola? Nada
E a banca não precisa desse dinheiro?
Banca que viva à custa de dinheiro sujo é melhor que feche. Há países em que grandes companhias nem sequer fazem negócios com países que têm um baixo índice de transparência no mundo. Até porque sabem que a corrupção se contamina. Não é possível uma pessoa muito séria a negociar com um corrupto… Quando se juntam maçãs podres com maçãs boas nunca são as podres que ficam boas. Esse tipo de contaminação com a corrupção não traz vantagem nenhuma.
Se colocar esta pergunta daqui a 15 anos, posso ter outra opinião, mas neste momento acho que tudo o que vá no caminho de enfatizar os bens das pessoas, a sua transparência fiscal e patrimonial é positivo.
Muitas virgens ofendidas não querem que se conheça a sua situação patrimonial, não por terem medo que se descubra o dinheiro que têm nos bancos, mas sim o dinheiro que devem ao banco. Há aí muita gente que anda a fazer vida de rico mas que está endividado na banca, muitos políticos.
Disse inicialmente que, nos moldes em que foi apresentada, a proposta do fim do sigilo bancário tem alguns defeitos. Pode dizer-se que concorda com o veto presidencial?
Não, não necessariamente. Se fosse eu teria pedido uma reformulação da lei que a tornasse mais clara e simples.
Se fosse eu presidente teria o cuidado de que a lei fosse efetivamente igual para todos. O defeito grande desta legislação é que permitia alçapões para que alguém com muito dinheiro e um bom advogado fugisse.
O que outras coisas faria diferente se tivesse vencido as eleições presidenciais?
O que Marcelo Rebelo de Sousa tem feito é diametralmente oposto ao que eu teria feito. Acho que o tipo de Presidência que ele tem feito na forma, vai ao encontro da sua personalidade, isso não critico nem elogio, mas o que é facto é que no momento em que temos mais de um milhão de desempregados e subempregados, dois milhões em situação de pobreza, o que é que o Presidente fez por esta gente toda? Nada.
Por aqueles que mais sofrem em Portugal até hoje o Presidente nada fez
Um balanço então bastante negativo da prestação de Marcelo na chefia do Estado?
Não direi bastante negativo. Marcelo Rebelo de Sousa é simpático, mas não tem feito, até agora, nada que melhore a vida dos portugueses.
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