César Boaventura: Português sem fronteiras revolucionará a Arábia Saudita

O CEO da GIC Career Management concedeu uma entrevista ao Desporto ao Minuto, onde, além de revelar as bases para o acordo que visa mudar o futebol saudita, aborda também as situações de Mika e Bruno Ribeiro.

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Carlos Pereira Fernandes
28/11/2016 09:00 ‧ 28/11/2016 por Carlos Pereira Fernandes

Desporto

Entrevista

Ainda que apenas tenha nascido há sensivelmente três anos, a agência portuguesa GIC Career Management tem já em mãos um projeto pioneiro no panorama europeu. A empresa, liderada por César Boaventura, foi escolhida para encabeçar o plano de privatização do futebol saudita.

O agente luso juntou-se à Arabia Sports Management tendo em vista a colocação de jogadores e a implementação de métodos de treino naquele país, e, em entrevista ao Desporto ao Minuto, explicou quais os seus planos, sem esquecer outros projetos que tem em mãos.

Arábia Saudita? Nunca pensei que pudéssemos ser escolhidos”

Como é que a GIC foi escolhida para encabeçar este projeto?

Várias empresas a nível da Europa foram convidadas para uma reunião coletiva. Apresentei a minha proposta, aquilo que pensava do projeto, alguns contactos, assim como uma carta a convite de um clube de dimensão elevada na Europa, e o Príncipe gostou. Inicialmente, queriam que fizéssemos parte de uma sociedade, mas eu não quis, preferi fazer um contrato independentemente de longa duração. Decidiu-se praticamente na hora que era connosco que queriam trabalhar.

Quais são as expetativas?

Numa primeira fase, de privatização dos clubes, as perspetivas são boas no que diz respeito à reformulação dos clubes ao nível da formação e dos treinadores para as equipas principais.

Numa segunda fase, o objetivo passa pela abertura do mercado do futebol sénior. O projeto que estão a montar na Arábia Saudita é um pouco à imagem do que fizeram na China.

O investimento é de 600 milhões de euros e também inclui o âmbito social, como academias, escolas e hospitais. O futebol enquadra-se nessa área e as expetativas são elevadas.

Quando partiu para a reunião sentiu que era possível que a GIC fosse escolhida?

Nunca pensei que pudéssemos ser escolhidos. Claro que já ia com a apresentação delineada, porque já me tinha sido transmitido qual era o objetivo, mas não me passava pela cabeça.

Já pensa no próximo passo para a empresa?

Neste momento, o principal projeto, que julgo que vai ser muito interessante do ponto de vista social, é a criação de uma estrutura solidária. Estamos a pensar comprometermo-nos em direcionar uma percentagem de cada transferência que fizermos para ajudar famílias de jogadores carenciados e também crianças. Tudo está dependente da aprovação do Ministério do Interior, para que a empresa seja criada, e é o próximo passo que vamos dar.

Muitas vezes cria-se a ideia de que os agentes são nefastos para o futebol. Essas ações podem ajudar a mudar essa ideia?

Não vou dizer que, tal como em tudo na vida, os agentes não gostem de ganhar dinheiro. Os agentes não são maus para o futebol. Mas há agentes que nem agentes são, só querem pôr dinheiro no bolso e olhar para o próprio umbigo. Esse não é o projeto da GIC. O nosso projeto tem uma grande vertente social. Quando falamos de agenciamento puro e duro, é preciso ver que muitos clubes nacionais sobrevivem graças a agentes. Não somos alguém que só queira ganhar sem nada em retorno. Já fiz vários negócios em que, além de beneficiar de uma comissão maior do que o normal, o clube ganhou muito mais do que pensava ganhar.

Um dos últimos projetos no estrangeiro, nos moldavos do Zimbru, não correu como esperado…

Recebemos um convite e assinámos o contrato de gestão do futebol e do dinheiro do clube durante dez anos. No final de três meses, pedi ao diretor desportivo que colocámos lá, o Rémulo Marques, para ir à Federação saber o dinheiro que nos cabia da Liga Europa, e ficámos a saber que recebemos menos 300 mil euros do que devíamos. Na tentativa de saber onde estava o dinheiro, descobrimos que quem o recebeu foi o vice-presidente do clube. Nós colocávamos lá o dinheiro e era ele que gozava dele. A partir desse momento, o Joe decidiu deixar o projeto.

E como está a correr a GIC Inglaterra?

Está a correr melhor do que o esperado. A partir do momento em que o Mika entrou, senti que existia possibilidade de fazer mais negócios. Estive em Inglaterra durante algum tempo, conheci pessoas ligadas ao futebol e a recetividade que tive foi muito grande. Assim que consegui a licença inglesa, a procura pelo jogador português, através de mim, tem sido muito maior. De tal maneira que, em janeiro, já temos alguns negócios fechados para Inglaterra.

E pode dizer de que jogadores se tratam?

Ainda não [risos].

Não vejo em que é que Eduardo e Anthony Lopes são superiores a Mika”

Falando da transferência do Mika para o Sunderland, acabou, certamente, por prolongar-se mais do que esperava. Acreditou que iria acabar por concretizar-se?

A partir do momento em que, às 23h20 inglesas, a pessoa que estava a fazer o TMS [Transfer matching system] não conseguiu e tirou um print screen, ficámos com a prova de que, realmente, o software dava certo em Portugal, mas não lá. Logo, não desconfiei que iria concretizar-se.

Como tem visto os primeiros meses do Mika no Sunderland?

O Mika é um excelente guarda-redes. Quando chegou a Inglaterra, todos pensávamos que já estava no topo, pelas boas épocas que fez no Boavista, mas depois viu que o ritmo de treino é totalmente diferente. Ele tem jogado pelos sub-23 e já noto uma grande evolução. No prazo de um ano, é o guarda-redes da equipa principal do Sunderland.

A partir daí, o objetivo passa por chegar à seleção?

Sabendo das qualidades que o Mika tem, não há motivo para não chegar lá. Não vejo em que é que o Eduardo ou o Anthony Lopes possam ser mais guarda-redes do que ele… O Rui Patrício tem o seu estatuto e maturidade, mas o Mika tem 25 anos. Para mim, é o próximo guarda-redes da seleção.

Foi também responsável por colocar Bruno Ribeiro no comando técnico do Port Valle. Até agora, as sensações são positivas?

É dos treinadores com mais potencial que foram lançados nos últimos três ou quatro anos. Claro que já teve bons e maus momentos, mas tem qualidade. Está a fazer um grande trabalho no Port Valle, que é a equipa com menor orçamento do League One e que costuma lutar pela manutenção. É um clube onde o presidente chegou a obrigar os próprios jogadores a pagar por um cartão amarelo. O Bruno Ribeiro teria casa paga, mas continua a viver num hotel. Inclusive já pagou do próprio bolso para que a equipa pudesse estagiar um dia antes de um jogo. Depois, passou na comunicação social e o presidente acabou por pagar. Tem feito um trabalho de excelência. No Vitória de Setúbal, o clube tinha salários em atraso e esteve para descer. Vários jogadores estiveram para ser despejados e o Bruno Ribeiro deu dinheiro do próprio bolso, até para eles irem aos treinos.

Ainda assim, no Ludogorets a experiência não foi a melhor…

Teve uma passagem infeliz pela Bulgária, mas não teve culpa. Na pré-época, os jogadores fizeram mais horas de estrada do que a correr nos treinos. Em quatro ou cinco semanas, passaram três em viagem.

O jogador europeu que vai para a China começa a ser um flop”

Após Inglaterra e Arábia Saudita, tem mais algum país em vista?

Também somos sócios de um escritório de advogados desportivos na China, há cerca de oito meses. É uma área que estamos a começar a explorar, porque não é um mercado fácil. Temos também um responsável na Alemanha, o Alessandro Acri, antigo responsável pelo scouting do Milan. Também temos um agente em Espanha, onde começamos a trabalhar, e outro em Itália. O próximo passo é França. Depois, concentramo-nos no que temos para crescer.

Muitas vezes, no futebol questiona-se qual a origem do dinheiro que é a investido. No caso da GIC, que tem tantos projetos em mãos, como explica essa questão?

Um dos motivos pelos quais a GIC investiu no futebol, foi por ter um sócio, que é o Joe Lima, que tem uma vida construída e quis colocar o seu dinheiro neste desporto. Além disso, a GIC vende jogadores. Não há um único clube que nos deva dinheiro. Se recebemos, investimos. O dinheiro vem do futebol e da aposta do Joe Lima.

O futuro do futebol passa pela China?

Sinceramente, a este tipo de negócios mais avultados, dou-lhes um prazo de dois anos. O jogador europeu que vai para a China começa a ser um flop. Compra-se um Jackson Martínez por 70 ou 80 milhões de euros e daqui a seis meses quer ir-se embora porque lhe dói uma perna, sem render nem marcar golos. Os chineses podem ter muito dinheiro, mas não são burros. Acredito, sim, que estejam a comprar cada vez mais clubes na Europa para colocar lá os seus jogadores e depois vendê-los de volta para a China.

É um caso diferente dos Estados Unidos?

Nos Estados Unidos, o futebol é regulado. Quem manda nas contratações é a MLS, não embarcam em loucuras. É um caso muito parecido ao de Inglaterra, onde os clubes podem investir, mas não há dívidas, porque o dinheiro tem de passar pela Federação. O futebol norte-americano pode demorar mais tempo a atingir o sucesso, mas vai lá chegar e não com um desnível, como sucede em Portugal. O Tondela tem 1,5 ou 2 milhões de euros de orçamento, enquanto que FC Porto ou Benfica têm orçamentos astronómicos. Lá, obrigam a que o futebol seja regulado, o que significa que vai haver mais competitividade. Vai demorar mais tempo, mas será uma evolução concentrada, coesa e que poderá atingir, nos próximos dez anos, um panorama muito elevado a nível mundial.

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