"País precisa de aposta na indústria e acertos no turismo"
Portugal precisa de apostar na industrialização e de ficar menos dependente do setor dos serviços, nomeadamente do turismo, considerou o sociólogo Manuel Carvalho da Silva, em entrevista à agência Lusa.
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Economia Carvalho da Silva
"A indústria tem muito mais capacidade de aumentar a produtividade, de propiciar aumento da riqueza e de criar e estabilizar emprego e qualificar emprego do que o setor dos serviços, em geral, e muito mais que este tipo de serviços que a matriz de desenvolvimento portuguesa tem", justificou quando questionado sobre o caminho que o país deve seguir para ultrapassar a atual crise, desencadeada pela pandemia de covid-19.
"O grande problema, o primeiro problema é que nós temos um enviesamento na nossa matriz de desenvolvimento", apontou.
Para Carvalho da Silva, as atividades estão demasiadamente centradas numa lógica de produção de serviços "muito ligados ao turismo", o que faz emergir o setor imobiliário e outros de proximidade àquela atividade âncora, sem que o resultado se reflita na qualidade de vida dos trabalhadores.
"Esta especialização produtiva não tem futuro, não nos permite sair da cepa torta, para usar uma expressão comum", declarou.
"É necessário mudanças e mudanças muito profundas. A pandemia, aquilo que se está a passar, dá indicações nesse sentido? A mim, parece-me que não", concluiu o sociólogo.
De acordo com Carvalho da Silva, a discussão em torno do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) é disso exemplo: "O clamor de grande parte dos setores empresariais portugueses não se volta para essa necessidade de mudança. Volta-se para uma reativação de atividades diversas e até uma ideia de que haverá um regresso à normalidade, tomando como conceito de normalidade aquilo que tínhamos anteriormente".
"Isto não resolve", acentuou. Investigador ligado ao Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra e ex-dirigente sindical (CGTP-IN), Carvalho da Silva olha com ceticismo para o atual cenário.
"A saída desta situação deve levar a que haja um esforço imenso para haver investimento e fazer-se investimento e depois proteção às pessoas, às famílias e a tudo o que são atividades que possam manter-se sem excesso de ficção, ou seja, tudo o que sejam atividades que tenham um mínimo de possibilidade de se manterem devem ser protegidas. Mas não tenhamos a ilusão de que é possível proteger tudo o que tínhamos", advertiu.
O turismo, indicou, precisa de acertos. "Se não tivermos reacertos no turismo, o que é que temos? Temos as cidades a despir-se, temos as pessoas a terem mais problemas de mobilidade, a serem empurradas e a terem custos com a habitação incríveis, com a deslocação para o trabalho, temos um desequilíbrio do território", observou.
A questão é "qualitativa", justificou, defendendo uma articulação entre o desenvolvimento do setor do turismo e políticas de transportes, no quadro geral das mobilidades, a par de "uma estratégia bem definida para as políticas de habilitação, que procure que as cidades não fiquem despidas".
Carvalho da Silva é atualmente coordenador do COLABOR -- Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social.
Os dois primeiros casos de pessoas infetadas em Portugal com o novo coronavírus foram anunciados em 02 de março de 2020, enquanto a primeira morte foi comunicada ao país em 16 de março. No dia 19, entrou em vigor o primeiro período de estado de emergência, que previa o confinamento obrigatório, restrições à circulação em Portugal continental e suspensão de atividade em diversas áreas.
A suspensão ou restrição de atividade em variados setores, como restauração, comércio, turismo e cultura, entre outros, elevou o número de falências em Portugal, agravou situações de precariedade laboral e provocou aumento do desemprego.
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