Constitucionalista: Estado tem dever de promover acesso ao arrendamento
A constitucionalista Teresa Violante considera que o Estado tem o dever de promover o acesso ao mercado de arrendamento a preços acessíveis e, portanto, as medidas do programa Mais Habitação, nomeadamente o arrendamento coercivo, são constitucionais.
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Economia constitucionalista
Sublinhando que do direito constitucional à habitação não resulta que o Estado tenha de atribuir "a cada pessoa uma casa", a constitucionalista não duvida de que esse impõe "o dever de promover o acesso a habitação própria ou ao mercado de arrendamento".
Face a este dever, Teresa Violante afasta a inconstitucionalidade do programa Mais Habitação, do qual algumas medidas, como o arrendamento coercivo, foram consideradas "disruptivas" por partes do setor.
Essas medidas são "qualificáveis como incumbências do Estado na função de promover o acesso ao mercado de arrendamento" e, portanto, enquadram-se na Constituição e na "função social" da habitação.
"O direito de propriedade não é um direito absoluto e está sujeito a limites que são impostos por via da sua função social", vinca a jurista, recordando, simultaneamente, que o direito de propriedade está assegurado com a garantia de que os proprietários serão ressarcidos com o pagamento de renda pelo Estado.
Assim, Teresa Violante vê no arrendamento coercivo "uma medida mais robusta para aumentar o número de casas disponíveis para arrendamento".
Porém, assinala, o Governo tem de fornecer dados que justifiquem medidas deste tipo, nomeadamente provando que vão ser aplicadas em "zonas onde existe muita procura, onde, de facto, existem pessoas que não estão a conseguir aceder à habitação a custos acessíveis e em que existem casas que estão fechadas e que estão devolutas".
Ora, essas "justificações ainda não foram dadas pelos dados que foram apresentados pelo Governo", reconhece.
Os números indicam que não há falta de edificado, apesar da contração da construção na última década, mas sim "falta de casas no mercado de arrendamento a custos acessíveis" e um "número elevado de casas devolutas", realça Teresa Violante.
A isto somam-se "níveis muito baixos de habitação pública" e uma intervenção do Estado, "ao longo destas décadas", assente "sobretudo" em incentivos à construção e em "políticas individuais, de apoio às pessoas", recorrendo a créditos bonificados, que possibilitaram o endividamento para aquisição de casa própria.
"Tivemos políticas de habitação pouco estruturadas, desgarradas, não-globais, ao contrário daquilo que sucedeu com os outros direitos sociais", aprecia a jurista.
Ao contrário do que sucede com a segurança social, a saúde ou a educação, a Constituição consagrou o direito à habitação, "mas não impôs a criação de um serviço público" que ficasse responsável por "prestar esse direito", distingue.
Nesse sentido, o acesso à habitação "é um direito social que, em termos de promoção, prestação e proteção, segue um caminho diferente dos restantes direitos sociais".
Teresa Violante lembra que, quando entrou em democracia, Portugal "estava em muito mau estado" nos direitos sociais em geral porque a ditadura tinha investido "muito pouco" durante mais de quatro décadas.
"Em termos de direito à habitação, como em vários outros direitos, estamos há várias décadas a correr atrás do prejuízo", lamenta.
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