De modo a entender esta situação, investigadores de todo o mundo estão a tentar perceber como o sistema imunológico do ser humano responde quando é atacado pelo novo coronavírus, causador da doença da Covid-19 - segundo uma reportagem avançada pela BBC Mundo.
Contudo, recentemente os cientistas vislumbraram um raio de esperança. Uma nova pesquisa publicada na revista Cell sugere que quando um indivíduo vence outros coronavírus que a dado momento atacaram o seu organismo, tal pode conferir imunidade ao corpo. E isto é o que é denominado de imunidade cruzada.
Primeiro: o que é a imunidade adaptativa?
De acordo com Estanislao Nistal, virologista e professor de microbiologia na Universidade CEU San Pablo, em Madrid, Espanha, a imunidade adaptativa "estabelece uma resposta específica contra o agente infeccioso específico ou contra as células que abrigam esse microrganismo".
Entretanto, esta resposta adaptativa divide-se em dois tipos: imunidade derivada de anticorpos ou imunidade humoral, e imunidade celular exercida por células chamadas linfócitos T (ou células T).
- 'Inesquecível'
A resposta adaptativa deixa memória. Isto é, recorda-se dos patógenos com os quais o corpo esteve anteriormente em contacto e como tal saberá se necessário como derrotá-los no futuro.
"A partir do momento em que nascemos, somos confrontados com muitos agentes infecciosos. E o corpo necessita de saber como reagir de maneira específica contra o que é estranho e o que pode causar uma patologia", explica Nistal à BBC Mundo.
E é aqui que surge a noção da chamada imunidade cruzada, que se refere à habilidade de certos linfócitos presentes na resposta adaptativa (linfócitos ou células B ou T) de identificar as sequências de um vírus e conseguir reconhecê-las futuramente noutro elemento infeccioso.
O clã dos coronavírus
A BBC elucida que o SARS-CoV-2 não é de todo único e integra a família dos coronavírus. Até ao momento foram identificados sete coronavírus sendo que a população está exposta a quatro tipos destes vírus por ano. Os chamados "coronavírus sazonais", de acordo com Nistal.
Geralmente, esses coronavírus não resultam em complicações severas para os infetados e tendem simplesmente em resultar em constipações e gripes tratáveis.
No seu estudo, publicado na Cell, investigadores do Instituto de Imunologia La Jolla, na Califórnia, nos Estados Unidos, examinaram amostras de sangue recolhidas entre 2015 e 2018 de indivíduos que haviam adoecido com coronavírus sazonais, e que tendo em conta a cronologia não poderiam ter sido afetados pelo SARS-CoV-2.
"O que os investigadores veem é que existem linfócitos, tanto B quanto T, capazes de reconhecer esses fragmentos e ativar", afirma o virologista.
"Por outras palavras, têm imunidade cruzada".
Apesar de ser um novo vírus, Nistal não ficou de todo surpreendido com os dados apurados, isto porque o SARS-CoV-2 "possui cerca de 80% de homologia com o SARS, que ocorreu em 2002, e entre 40 e 60% de homologia com coronavírus circulantes ou sazonais".
"Se analisar a sequência de aminoácidos que as proteínas virais produzem, perceberá que existem áreas muito diferentes entre os coronavírus circulantes e o SARS-CoV-2, mas existem áreas altamente conservadas. E, portanto, espera-se que um linfócito que reage contra essa sequência também possa reagir contra a sequência SARS-CoV-2", conta Nistal.
O especialista acredita assim que este processo natural do organismo explica o motivo pelo qual existem pessoas que vivenciam sintomas bastante ligeiros ou nenhum sintoma de todo.
"Outra parte também seria explicada pela imunidade inata", conclui.
Leia Também: 'Super imunidade' pode explicar como morcegos não adoecem com a Covid-19