Sempre juntos, desde que acordam até que se deitam. Conhece algum casal assim? "Para alguns, fortalece a cumplicidade e cria um sentido de equipa, enquanto para outros pode tornar-se sufocante e desgastante", vaticina o neuropsicólogo Alberto Lopes, das Clínicas Dr. Alberto Lopes, e autor do livro "Nem Sempre Faço Sexo, Mas Todos os Dias Faço Amor", em entrevista ao Lifestyle ao Minuto.
"Quando se trabalha com a pessoa com quem se vive, as pausas e os momentos de saudade desaparecem", acrescenta, frisando que "há o risco de os elementos do casal pararem de ver-se como parceiros românticos e passarem a sentir-se apenas como colegas ou sócios".
É saudável um casal viver e trabalhar junto?
Depende. Para alguns casais, fortalece a cumplicidade e cria um sentido de equipa, enquanto para outros pode tornar-se sufocante e desgastante. O segredo está em saber equilibrar o 'nós' e o 'eu'. Se a relação absorve toda a individualidade, pode surgir frustração.
© Neuropsicólogo Alberto Lopes
Considera que existe uma resposta certa ou errada a esta pergunta?
Não. O que existe é uma questão essencial, que é: somos compatíveis no trabalho, além de sermos na vida pessoal? Isto porque, nem todos os casais funcionam bem no mesmo ambiente profissional, mas isso não significa que haja algo de errado na relação.
Se não houver fronteiras claras, um problema no trabalho pode transformar-se numa discussão conjugal e vice-versa. (...) Onde há limites existe respeito e onde existe respeito há amor
Há risco de desgaste da relação?
Esse risco é bem real. Passar demasiado tempo juntos pode levar à perda de espaço individual, ao excesso de rotina e à falta de novidade, elementos fundamentais para manter o desejo e a conexão emocional. É até comum os elementos do casal darem mais importância a alguns defeitos um do outro e haver algum cansaço na relação, provocado pela pressão e desafios profissionais.
Quais os maiores desafios com que estes casais se podem deparar?
Quando se trabalha com a pessoa com quem se vive, as pausas e os momentos de saudade desaparecem. Há o risco de os elementos do casal pararem de ver-se como parceiros românticos e passarem a sentir-se apenas como colegas ou sócios.
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O que é que pode ser feito para evitar esse desgaste?
É fundamental que a relação 'respire' e criar momentos de lazer, mantendo alguma separação saudável entre vida pessoal e profissional.
Portanto, é preciso estabelecer limites entre o trabalho e o casamento.
Sou da opinião que é muito vantajoso estabelecer limites. Se não houver fronteiras claras, um problema no trabalho pode transformar-se numa discussão conjugal e vice-versa. A verdade é que, onde há limites existe respeito e onde existe respeito há amor. Se o casal não souber 'fechar a porta' do trabalho, a relação pode perder a sua leveza.
E quando há competição no trabalho entre os membros do casal?
A competição não tem de ser negativa, mas pode tornar-se destrutiva se gerar comparação, ressentimento ou uma luta de poder. Numa relação equilibrada, o crescimento de um é celebrado pelo outro. Por isso, se um dos dois sente que está sempre em desvantagem ou que precisa de provar constantemente o seu valor, a relação pode entrar num ciclo perigoso.
Como é que se consegue 'separar as águas', evitando que as discussões conjugais sejam trazidas para a vida laboral e vice-versa?
Tendo inteligência emocional. Antes de levar uma discussão conjugal para o ambiente profissional, ou o contrário, é importante parar e perguntar: isto é um problema real ou estou apenas a reagir emocionalmente? Este é o momento e o local certo para ter esta conversa? Como posso comunicar sem atacar ou magoar o meu companheiro? Também devemos evitar os muros de silêncio que são mais destrutivos e que provocam ressentimento de um dos lados. Mas, se não houver autocontrolo, qualquer pequeno desentendimento pode escalar e prejudicar tanto a relação como o trabalho.
Há alguns sinais que mostram que o casal precisa de agir antes de chegar a um ponto de rutura. (...) Ao mesmo tempo, o trabalho vira um refúgio e preferem estar ocupados a passar tempo juntos
Que dicas podem fazer a diferença?
Quando o trabalho acaba, o casal deve desconectar-se do trabalho. Devem também evitar trabalhar no mesmo ambiente dentro de casa, se for esse o caso, e cultivar a relação sem que o trabalho esteja sempre presente.
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Quais são os sinais de alerta de que a relação pode estar em risco?
Em primeiro lugar, importa dizer que não existem relações perfeitas. Apesar disso, há alguns sinais que mostram que o casal precisa de agir antes de chegar a um ponto de rutura. São as chamadas 'red flags'. Há casais em que o diálogo começa por diminuir e surgem discussões repetitivas, já não valorizam as conquistas um do outro, o toque, os gestos de carinho e a cumplicidade desaparecem. Ao mesmo tempo, o trabalho vira um refúgio e preferem estar ocupados a passar tempo juntos.
No seu entender, quais são os mandamentos para um casamento feliz e duradouro?
Diz-se que o amor é uma flor delicada e que deve ser cuidada e alimentada todos os dias. Tenho para mim que com o casamento é a mesma coisa. Um casamento feliz é uma construção diária. O casal deve comunicar com clareza e sem medo, respeitar o espaço e a individualidade do outro, valorizar mais do que criticar, resolver conflitos de forma adulta, sem ataques, manipulação ou silêncios punitivos, manter a admiração, cuidar da intimidade, nunca parar de namorar, criar memórias felizes, celebrar as vitórias um do outro e escolher amar todos os dias. O amor não sobrevive sozinho. Precisa de esforço e intenção.
Com o tempo, o amor pode transformar-se 'apenas' em companheirismo e amizade?
Sim e isso não significa que a relação falhou. A psicologia define que as relações amorosas evoluem geralmente em três fases: a da paixão, do amor romântico e a do amor companheiro. Para alguns casais, a fase da paixão inicial dá rapidamente lugar a um amor mais calmo, baseado no respeito e na cumplicidade. O problema surge quando um dos dois deseja mais. Nesses casos, é essencial uma conversa honesta: continuamos felizes juntos ou estamos apenas acomodados? Se a resposta for a segunda opção, algo precisa de mudar. O casamento não deve ser uma prisão, mas sim um espaço de crescimento e amor mútuo. Com o tempo, compreendemos que não há contos de fadas nem fórmulas mágicas. O amor não é feito de príncipes encantados nem de princesas idealizadas. Nasce na imperfeição, cresce na aceitação e fortalece-se na escolha diária de permanecer e evoluir juntos.
Não há fórmulas perfeitas...
Exato! O 'segredo' não está em encontrar o parceiro perfeito, mas sim em construir, dia após dia, uma relação saudável e equilibrada. O amor é exatamente isso. O inesperado, o improvável, o encontro entre dois mundos que, mesmo diferentes, escolhem caminhar lado a lado.
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