"A criança está inserida numa família, que, por sua vez, está inserida numa sociedade local. Para perceber o que se passa com aquele menino, é preciso perceber toda a dinâmica que está por detrás daquela criança e daquela família. Não direcionamos a consulta para a criança, mas para o agregado familiar", afirmou a pediatra do Centro Hospitalar Lisboa Central, Júlia Galhardo, que lamentou a "falta de tempo" nas consultas.
A pediatra do Hospital da CUF, no Porto, Carla Rego, acrescentou que o "tratamento do excesso de peso e obesidade baseia-se na prevenção".
"Estas consultas requerem tempo para ir 'descascando a cebola' e conhecer a criança que está à nossa frente", reforçou Júlia Galhardo.
Segundo esta pediatra, a obesidade poderá causar problemas em vários órgãos. "O fígado é o primeiro estadio. A obesidade e o excesso de açúcares e de gordura acabam em cirrose, como o álcool", revelou.
Adiantando que só uma pequena percentagem do excesso de peso está associado a causas genéticas, Júlia Galhardo deixou o alerta para os pediatras darem especial atenção quando "uma criança é obesa e tem baixa estatura", pois aqui "podem estar problemas endócrinos".
A pediatra referiu ainda que, culturalmente, "quando se diz que o bebé está gordinho, é traduzido como um sinal de que a criança é bem tratada, porque há uma cultura de períodos de fome". No entanto, esta perceção "é errada", pois "má nutrição também engloba excesso de peso".
Carla Rêgo precisou que apenas 01% das causas da obesidade é monogénica e 02 a 04% referem-se a obesidade secundária. "Noventa e sete por cento das causas é comportamental e o tratamento reside na história familiar, da introdução dos alimentos e nos hábitos de exercício".
As pediatras salientaram ainda que a intervenção terá mais sucesso quanto mais precoce for. "O insucesso na adolescência é brutal", acrescentou Carla Rêgo, considerando que a grande base do tratamento é "comportamental" e deve "envolver o pediatra, o psicólogo, o nutricionista e o técnico do exercício: um luxo que não temos".