"O Partido Trabalhista tornou-se irrelevante na Escócia", disse esta semana num debate em Edimburgo o jornalista Alex Massy, editor na Escócia da revista britânica Spectator.
Entre 2005 e 2014, os trabalhistas representavam no Parlamento britânico 41 dos 59 círculos eleitorais da Escócia, mesmo depois de o partido começar a perder força no resto do país.
Depois de cair para um só deputado em 2015, quando o Partido Nacionalista Escocês (SNP) conquistou 56 círculos eleitorais, o 'Labour' pareceu recuperar, elegendo sete parlamentares em 2017, mas essas vitórias sobre o SNP não são por grande margem.
Nas eleições europeias de maio, os trabalhistas escoceses tiveram o resultado mais baixo de sempre, com apenas nove em cada dez eleitores na Escócia a votarem 'Labour'.
Segundo a última sondagem do YouGov, divulgada na semana passada, o partido poderá mesmo cair para dois deputados nas eleições de dia 12 e tornar-se o quarto partido da Escócia, algo impensável há uma década.
David Mundell, ex-secretário de Estado da Escócia nos governos de David Cameron e Theresa May, disse no mesmo debate que "o que caracterizou a campanha até agora foi o colapso do voto nos trabalhistas".
Mundell, atualmente candidato conservador ao círculo de Dumfriesshire, Clydesdale and Tweeddale, disse que já bateu a mais de 12 mil portas nesta campanha e raramente encontra um eleitor trabalhista.
"Claro que apanho muitas pessoas que dizem que não vão votar em mim, mas o número de pessoas que realmente dizem que vão votar 'Labour' é mínimo", acrescentou.
Na sua recente intervenção num debate sobre o futuro da Escócia, Alex Massy sublinhou que os trabalhistas não tomaram uma posição firme sobre as duas questões mais fraturantes neste momento na Escócia: o 'Brexit' e a independência do país face ao Reino Unido.
No caso do 'Brexit', Jeremy Corbyn propôs-se elaborar um novo acordo e submetê-lo a um novo referendo, enquanto sobre a aspiração do SNP de fazer um novo referendo sobre a independência da Escócia, o líder trabalhista disse que apenas não aceitaria autorizá-lo antes de maio de 2021.
"Tendo em conta que estas são as duas maiores questões que o país enfrenta, é uma atitude ousada", disse Massy no debate, suscitando gargalhadas da audiência.
Citando sondagens, Massy estimou que o número de eleitores escoceses que não se interessa por nenhuma das duas questões é de 12%, "mais ou menos a mesma percentagem de pessoas que acha que o Elvis está a trabalhar numa loja de batatas fritas.
Questionado pela Lusa, o professor de ciência política nas universidades de Edimburgo e Aberdeen Michael Keating concordou que o Labour está "entalado entre as duas questões" constitucionais em cima da mesa, mas recordou que a mudança não começou agora.
"Eles aliaram-se aos conservadores no referendo [sobre a independência da escócia em 2014] e isso fê-los perder o apoio da classe trabalhadora da Escócia. O SNP moveu-se para a esquerda e o Labour' ficou a parecer um partido unionista radical. O pensamento da classe trabalhadora foi para a independência e, por isso, para o SNP, (...) enquanto os eleitores anti-independência escolheram o Partido Conservador, que tem uma posição unionista sem ambiguidades".
O professor de ciência política Patrick Dunleavy, da London School of Economics, sublinha por outro lado que "o SNP tem feito campanha de uma forma calculada para apelar aos eleitores trabalhistas, argumentando basicamente que são os únicos que podem derrotar os Conservadores na Escócia".
Mas o trabalhista Paul Sweeney, que nestas eleições luta por manter o mandato de deputado pelo círculo de Glasgow North East, que ganhou com uma curta maioria de 242 votos sobre o SNP, não se dá por derrotado.
Admite que os trabalhistas estejam a ser pressionados em zonas do país onde os 'Tories' e o SNP estão a crescer, mas acredita que na sua área, da cintura central de Glasgow, o voto no 'Labour' está a crescer.
A sustentar a sua confiança tem os dados da sua própria campanha, que em 2.246 contactos com eleitores recebeu 950 promessas de voto nos trabalhistas, ou seja 42%.
Sobre os motivos da queda dos trabalhistas, o deputado, de 30 anos, reconhece que o paradigma político na Escócia mudou para questões constitucionais, como a independência ou o Brexit, mas insiste que a missão do 'Labour' não é responder a essas questões.
"Não é para isso que estamos aqui. Estamos por uma política de classes. Para melhorar os interesses das pessoas das classes trabalhadoras".
E insiste que as pessoas que tem abordado "estão à procura de esperança, estão à procura do Partido Trabalhista, para reverter os cortes [da austeridade], para investir nos serviços públicos, seguir o modelo português de reforma do combate à toxicodependência".
Nas ruas deste círculo eleitoral de 65 mil eleitores, um dos mais desfavorecidos do Reino Unido, onde há zonas violentas e crime relacionado com a droga, a Lusa encontrou, entre alguns indecisos e outros SNP, vários eleitores decididos a votar nos trabalhistas.
Alguns apenas porque o fizeram toda a vida e não veem motivo para mudar, como três idosas que conversavam numa esquina, a proteger-se da chuva miudinha que teimava em cair.
Outros porque acreditam nas promessas do partido a nível social, como o motorista da Uber Arif Jalal, originário do Iraque, mas a viver na Escócia há 17 anos e com quatro filhos a viver no país.
Embora tenha antes votado SNP, Jalal quer agora votar por um partido que promete "construir casas, dar lares aos idosos, ajudar os jovens a encontrar empregos".