O estudo tem por base uma viagem de um cruzeiro à Antártida, que partiu da Argentina em meados de março e que durante 28 dias esteve sem qualquer contacto com pessoas do exterior, funcionando como um espaço laboratorial hermeticamente fechado.
Os investigadores integraram a viagem, que partiu com 128 passageiros e 95 tripulantes, depois de proibidos de embarcar os passageiros que nas três semanas anteriores à partida tivessem passado por países onde nessa altura as taxas de infeção por covid-19 eram já elevadas.
As conclusões do estudo revelam que 81% dos passageiros que se vieram a revelar infetados não apresentaram sintomas da doença, o que leva os investigadores a defender que os resultados têm implicações no aligeirar das restrições de confinamento, para além de demonstrarem a necessidade de dados mais precisos sobre o real número de infetados a nível global.
Em 217 passageiros e membros da tripulação houve 128 casos positivos de covid-19, ou seja, 59% das pessoas a bordo. Entre os infetados apenas 24 pessoas (19%) apresentaram sintomas, oito precisaram de ser retirados por emergência médica, quatro precisaram de ser entubados e ventilados e um doente morreu.
Os restantes 104 infetados não apresentaram sintomas.
O primeiro caso sintomático, com febre, foi reportado ao oitavo dia de viagem e obrigou à tomada de medidas imediatas de contenção, que passaram por confinar os passageiros às suas cabines, suspender o serviço diário aos passageiros, à exceção da entrega à porta das cabines de três refeições diárias, e o uso de equipamentos de proteção pessoal por todos os tripulantes em contacto com passageiros doentes.
Os investigadores reportaram ainda que em 10 ocasiões, grupos de dois passageiros que partilham uma única cabine tiveram resultados diferentes nos testes, o que o que os autores do estudo atribuem a possíveis "falsos negativos" como resultado nos testes.
Os autores concluem que a prevalência de covid-19 nos navios de cruzeiro estará "significativamente subestimada", o que os leva a recomendar que os passageiros devem ser monitorizados após o desembarque para prevenir possíveis contágios comunitários e a propagação do vírus.
Defendem ainda que a possível taxa elevada de "falsos negativos" deve levar a mais testes secundários.
Citado no comunicado de imprensa relativo aos resultados do estudo, o professor Alan Smyth, um dos editores da revista Thorax, admite que é difícil encontrar uma estimativa fiável do total de pacientes de covid-19 sem sintomas, mas sublinha que a taxa de 1% avançada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) no início de março, quando a pandemia se começava a agravar na Europa, fica muito aquém daquilo que o estudo agora publicado sugere.
"À medida que os países avançam no desconfinamento, uma maior proporção de pessoas infetadas, mas assintomáticas, pode significar que uma percentagem muito mais alta da população do que aquela que se pensava pode ter sido infetada", disse Smyth.
Independentemente do grau de imunidade adquirido, os resultados reforçam a necessidade de dados globais mais precisos sobre quantas pessoas foram infetadas, conclui o professor.
A pandemia do novo coronavírus já matou 352.494 pessoas e infetou mais de 5,6 milhões em todo o mundo desde dezembro, segundo um balanço da agência AFP, às 19:00 GMT de hoje, baseado em dados oficiais dos países.
De acordo com os dados recolhidos pela agência noticiosa francesa, às 19:00 GMT (20:00 de Lisboa) de hoje, 5.638.190 casos de infeção foram oficialmente diagnosticados em 196 países e territórios desde o início da epidemia, em dezembro passado, na província chinesa de Wuhan, dos quais pelo menos 2.236.200 são considerados curados.