"Tais alterações são suscetíveis de conduzir a uma falta de aparência de independência ou de imparcialidade destes juízes, que pode pôr em causa a confiança que a justiça deve inspirar aos particulares numa sociedade democrática e num Estado de direito", lê-se num acórdão hoje publicado pelo TJUE sobre o caso em questão.
Em causa estão duas revisões legislativas, ocorridas em 2018 e em 2019, que alteraram o processo de nomeação de juízes para o Supremo Tribunal, limitando a capacidade dos envolvidos nesse processo de recorrerem da decisão e dando mais poderes ao Conselho Nacional da Magistratura (KRS) da Polónia.
No que se refere à alteração legislativa de 2018, o TJUE considera que o recurso interposto durante um processo de nomeação de juízes passa a ser "desprovido de efetividade real e apenas oferece a aparência de um recurso judicial", podendo as disposições nacionais "revelar-se problemáticas à luz das exigências decorrentes do direito da União quando eliminam a efetividade do recurso anteriormente existente".
Já no que se refere à revisão legislativa de 2019, o órgão judicial europeu sublinha o "papel determinante" que o KRS passou a desempenhar no processo de nomeação para um lugar de juiz no Supremo Tribunal, referindo que "o grau de independência de que goza o KRS relativamente aos poderes legislativo e executivo polacos pode ser pertinente para apreciar se os juízes que seleciona estarão em condições de satisfazer as exigências de independência e de imparcialidade".
O TJUE reenvia assim o caso ao Supremo Tribunal Administrativo da Polónia e estipula que, caso o órgão em questão considere que "ocorreu violação do direito da União", ficará então obrigado, "ao abrigo do princípio do primado deste direito", a "não aplicar essas alterações", vigorando antes "as disposições nacionais anteriormente em vigor".
O acórdão hoje publicado surge após o Supremo Tribunal Administrativo da Polónia ter questionado o TJUE sobre a conformidade das duas revisões legislativas com o direito europeu.
Em causa estava uma queixa avançada por cinco juízes que tinham sido descartados pelo KRS num processo de nomeação para o Supremo Tribunal da Polónia e que referiam que a nova legislação os impedia de recorrer da decisão.
Desde que chegou ao poder em 2015, o Partido Lei e Justiça (PiS) tem introduzido uma série de reformas judiciais por considerar que o sistema de justiça polaco era "ineficiente" e precisava de uma mudança abrangente.
Face ao que os críticos consideram uma tentativa inconstitucional de controlar o sistema judicial, a Comissão Europeia já abriu vários processos de infração à Polónia, o último em data tendo sido em abril de 2020, devido a uma lei que, segundo o executivo, "mina a independência dos juízes".
Em 2017, a Comissão Europeia ativou também o artigo 7.º contra a Polónia, que contempla sanções aos Estados-membros caso se verifique "um risco claro de violações sérias" aos valores da UE, entre os quais "o respeito pela dignidade humana, liberdade, democracia, igualdade, Estado de Direito e respeito pelos direitos humanos".