"Alguns [deslocados] eram sujeitos a sevicias, uma vez que não tinham documentos. Esse foi um dos problemas que se levantou e que constatámos", disse à Lusa, Fanito Salatiel, coordenador do consultório jurídico da Universidade Católica de Moçambique (UCM) em Pemba.
Humilhação, extorsão ou detenção foram alguns dos casos reportados durante o trabalho de campo feito junto das populações em fuga.
Salatiel é um dos supervisores da Caravana Jurídica, iniciativa de assistência jurídica gratuita a quem tudo perde durante o conflito, incluindo documentos.
A ação é organizada pela Faculdade de Gestão de Turismo e Informática da UCM, Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), juntamente com os serviços de identificação civil, registos e notariado e outras organizações humanitárias.
"Constatámos que os deslocados internos não tinham documentos e estavam preocupados com as abordagens pelos agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM) a nível local", detalhou - além da necessidade de documentos para diversos outros atos do quotidiano e para reestabelecer a vida nas novas zonas consideradas seguras.
A Lusa contactou a Polícia da República de Moçambique (PRM) em Cabo Delgado, mas não obteve comentários.
A equipa promotora da Caravana Jurídica organizou uma primeira fase da iniciativa durante novembro e dezembro de 2020 no bairro Josina Machel, em Pemba, e atendeu 7.600 deslocados.
Equipas móveis de dois advogados em voluntariado e estudantes de direito receberam e encaminharam sobretudo mulheres e crianças cujas principais preocupações passavam pela falta de certidões de nascimento e bilhetes de identidade, a par da necessidade de registo de óbitos e casamentos,
Uma segunda fase está em curso desde abril e decorre até agosto no bairro de Mahate, em Pemba, e nos centros de reassentamento do distrito de Metuge, prevendo-se abranger cerca de 20 mil deslocados.
"Nesta segunda fase, além do tratamento de bilhetes de identidade, iremos regulamentar certidões de nascimentos em parceria com os registos e notariados" destacou Salatiel.
Grupos armados aterrorizam a província desde 2017, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo 'jihadista' Estado Islâmico, numa onda de violência que já provocou mais de 2.800 mortes segundo o projeto de registo de conflitos ACLED e 732.000 deslocados de acordo com a ONU.
Leia Também: Moçambique quer depender menos de exportações de matérias-primas