O relatório sobre Tráfico Humano de 2021, hoje apresentado pelos Estados Unidos da América sobre 188 países, consultado pela agência Lusa, conclui que a pandemia de covid-19 criou condições para o aumento do tráfico humano e exploração sexual dos mais vulneráveis em todo o mundo.
Apesar de os números não corresponderem ao número verdadeiro de vítimas de tráfico humano, mas sim a registos estatais, notaram-se diferentes tendências em diferentes zonas geográficas.
Em 2020 foram identificadas 109.216 vítimas de tráfico humano em todo o mundo, das quais cerca de 14.500 dizem respeito a trabalho escravo, segundo se pode ver num gráfico.
O número, porém, é menor do que as vítimas identificadas em 2019, cerca de 119.000, que se pode explicar pela redução de recursos na identificação de vítimas e no combate ao tráfico humano devido à pandemia de covid-19.
Com os governos a "desviarem recursos" para a recuperação da pandemia, segundo se lê no documento, as operações de combate ao tráfico foram interrompidas, o que possibilitou também aos traficantes a "adaptarem-se rapidamente para capitalizar vulnerabilidades expostas e exacerbadas pela pandemia".
As conclusões alertam também que sobreviventes de tráfico enfrentaram um risco ainda maior de voltarem a ser vítimas, "devido a dificuldades financeiras e emocionais durante a crise".
Antony Blinken, secretário de Estado norte-americano, sublinhou a mensagem de que "crises globais, como a pandemia de covid-19, mudanças climáticas e a discriminação têm um efeito desproporcional sobre os indivíduos já oprimidos por outras injustiças".
Segundo Blinken, o relatório pretende "melhorar esforços coletivos" para combater o tráfico humano em todo o mundo.
A diretora do escritório responsável pela autoria do relatório, Kari Johnstone, sublinhou que a pandemia de covid-19 resultou num "ambiente ideal para o tráfico humano florescer e evoluir".
São realçados exemplos dos Estados Unidos, Reino Unido ou Uruguai, em que os proprietários de casas forçavam os inquilinos, geralmente mulheres, a relações sexuais quando o aluguel não podia ser pago.
Os autores descobriram também que "durante o confinamento, os traficantes na Amazónia do Brasil mudaram padrões" e, em vez de levar as crianças para os locais habituais onde eram vendidas, passaram a enviar as vítimas diretamente para "aposentos privados dos perpetradores ou locais específicos".
Na Índia e no Nepal, segundo o relatório norte-americano, meninas de áreas pobres ou rurais foram postas em casamentos forçados em troca de dinheiro. No Haiti, Níger e Mali, campos para pessoas deslocadas foram palco de "atos sexuais comerciais" forçados.
As famílias também se tornaram vulneráveis ao tráfico, por exemplo na Birmânia, onde se registaram reduções drásticas dos rendimentos familiares.
Na região de Ásia Central e do Sul, que inclui países do Cazaquistão para o sul, até Índia e países insulares de Sri Lanka e Maldivas, foi identificado o maior número de vítimas de tráfico dos últimos sete anos: 45.060 vítimas de tráfico humano identificadas em 2020.
Na região de Ásia oriental e Pacífico, o número de vítimas identificadas em 2020 diminui consideravelmente, para 2.884 pessoas, uma diferença de 12 mil pessoas desde 2019.
África registou a identificação de 28.538 vítimas, apesar de o número representar uma redução de 14 mil pessoas desde 2019.
Já o Médio Oriente e países do norte da África registaram 3.461 vítimas identificadas em 2020.
O número de vítimas identificadas aumentou de forma pronunciada na Europa, onde, no último ano, foram registadas 18.173 vítimas, o maior número desde 2014.
O hemisfério ocidental, que inclui a América do Norte e do Sul, teve 11.100 vítimas identificadas em 2020.
"Procuraremos usar nosso envolvimento durante todo o ano com governos, defensores e o setor privado para construir uma estratégia de combate ao tráfico mais eficaz, baseada na equidade", declarou o secretário de Estado, citado no relatório.
"Isso deve incluir o reconhecimento do nosso papel como perpetradores de violência e desumanização de pessoas, e devemos trabalhar para corrigir esses erros do passado", acrescentou Antony Blinken.
Leia Também: Autarca holandesa pede desculpa por papel de governantes na escravatura