França prepara lei para restituir a cidadãos fundos apreendidos a líderes

O parlamento francês prepara-se para adotar um mecanismo para a restituição à população dos fundos apreendidos nos chamados "bens mal adquiridos" por líderes estrangeiros depois de 15 anos de pressão por organizações não-governamentais (ONG).

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Lusa
12/07/2021 18:55 ‧ 12/07/2021 por Lusa

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França

A medida será votada na terça-feira na Assembleia Nacional e no dia 21 de julho no Senado e pretende implementar um vasto projeto nos países em causa através de projetos de desenvolvimento.

O caso dos "bens mal adquiridos" refere-se a bens públicos desviados por líderes estrangeiros para os seus familiares para uso pessoal, incluindo bens imobiliários, automóveis, relógios, contas bancárias.

França tem sido um dos principais destinos para estes bens, levando ONG como a Sherpa e a Transparência Internacional a apresentarem queixas contra líderes de Guiné Equatorial, Gabão e República do Congo, que resultaram em investigações.

O caso mais avançado diz precisamente respeito ao filho do Presidente da Guiné Equatorial e vice-presidente, Teodoro Nguema Obiang Mangue, que em fevereiro de 2020 foi condenado, em segunda instância, a três anos de prisão suspensa e ao pagamento de uma multa efetiva de 30 milhões de euros ao Estado francês.

Neste caso, espera-se ainda uma decisão do Tribunal da Cassação em 28 de julho.

A Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, promulgada pela Assembleia-Geral da ONU em outubro de 2003, estabeleceu o princípio de restituição dos frutos da corrupção aos países afetados, mas os mecanismos para que tal aconteça são ainda raros.

Atualmente, entre os casos mais funcionais neste aspeto, estão Estados Unidos, Reino Unido e, em especial desde 2015, a Suíça, tida como o exemplo mais bem-sucedido.

A Suíça foi também um dos países onde 'Teodorín' enfrentou -- e perdeu contra -- a justiça. Neste Estado nos Alpes, 25 dos seus carros de corrida foram arrestados e vendidos por 21 milhões de euros, que foram então doados a um programa de ajuda social na Guiné Equatorial.

Agora, França prepara-se para estabelecer e definir um mecanismo através de um projeto de lei sobre o desenvolvimento solidário, que deverá ser adotado em definitivo em 21 de julho.

Este projeto prevê "a restituição, tão próxima quanto possível da população do Estado estrangeiro em causa", dos "rendimentos e bens confiscados a pessoas condenadas em definitivo por branqueamento de capitais" ou outros crimes fiscais.

Na prática, o Orçamento francês deverá prever uma linha orçamental específica, complementada pela revenda de mercadorias sob o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Esta linha deverá financiar "ações de cooperação e desenvolvimento" e atuar "caso a caso" nos países em questão em áreas como saúde, educação e igualdade de género.

No entanto, há entraves que podem dificultar a aplicação deste projeto.

Um dos principais envolve o respeito que estas restituições têm de ter pela "soberania" dos Estados envolvidos, assim como pela inclusão de organizações da sociedade civil para, assim, evitar que os fundos voltem a entrar nos circuitos de corrupção de onde foram retirados.

Para a analista da Transparência Sara Brimbeuf, esta é uma tarefa complicada na Guiné Equatorial, onde "quase não há sociedade civil independente".

"Os nossos parceiros no terreno estão quase todos exilados, pode ser complicado", afirmou à agência France-Presse (AFP).

A agência noticiosa francesa refere que foram já estabelecidos contactos entre Paris e Malabo para a explicar este mecanismo de restituição.

Alguns deputados franceses estão preocupados com o facto de este mecanismo estar sob a alçada dos Negócios Estrangeiros.

"Não devemos permitir que as restituições se misturem com outras questões diplomáticas", alertou a deputada Emilie Cariou.

Já o advogado Nicola Bonucci, antigo especialista da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), sublinhou que para que França devolva os "bens mal adquiridos", estes "têm primeiro de ser identificados".

Na opinião do advogado, tal "só fará sentido se França adotar uma política proativa" para a deteção de fluxos financeiros ilícitos.

Teodoro Nguema Obiang Mangue, 50 anos, conhecido como 'Teodorín', foi considerado culpado de ter adquirido indevidamente património considerável em França com dinheiro desviado dos cofres da Guiné Equatorial, país presidido pelo seu pai.

Segundo a justiça francesa, os juízes estimam um branqueamento de capitais na ordem dos 160 milhões de euros.

Leia Também: Governo francês pode apanhar multa recorde por poluição atmosférica

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