As conclusões da comissão foram hoje divulgadas, meses após uma investigação da agência Associated Press (AP) ter noticiado que a direção da OMS tinha sido informada de múltiplas alegações de abuso em 2019.
O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, criou a comissão em outubro, após terem surgido notícias sobre abusos sexuais, durante os esforços da OMS para conter a epidemia de Ébola na RDCongo, de 2018 a 2020. Na altura, o diretor-geral disse que estava "indignado" e que iria agir rapidamente para punir os responsáveis.
Fontes diplomáticas citadas pela agência noticiosa norte-americana afirmaram que quatro pessoas foram despedidas e duas foram suspensas, baseando-se num 'briefing' à porta fechada distribuído a funcionários diplomáticos em Genebra.
A comissão obteve a identidade de 83 alegados perpetradores, congoleses e estrangeiros, tendo, em 21 casos, estabelecido com certeza que os alegados perpetradores eram funcionários da OMS durante a resposta ao Ébola.
A maioria dos alegados perpetradores, de acordo com as conclusões, eram funcionários congoleses contratados de forma temporária que tiraram partido da sua aparente autoridade para obterem favores sexuais.
Em maio, a AP publicou provas de que o médico Michel Yao, um alto funcionário da OMS que supervisionou a resposta ao surto na RDCongo, foi informado de múltiplas alegações de abuso sexual. O médico foi mais tarde promovido e liderou a resposta da OMS ao surto de Ébola na Guiné-Conacri, que terminou em junho.
Também o médico da OMS Jean-Paul Ngandu e outros dois funcionários da agência da ONU assinaram um contrato em que prometiam a compra de terras para uma jovem que Ngandu teria, alegadamente, engravidado. Ngandu disse que tinha sido pressionado a fazê-lo para proteger a reputação da OMS.
Outro médico, Boubacar Diallo, gabou-se da sua relação com o chefe Tedros, da OMS, e ofereceu às mulheres empregos em troca de sexo, disseram três mulheres à AP.
Nas conclusões, a comissão destacou também a entrevista com o líder da OMS, que disse ter sido informado das alegações de abuso apenas após a sua publicação na comunicação social e que desconhecia o caso de Ngandu.
O painel criticou a tendência da OMS para "rejeitar todas as denúncias de exploração e abusos sexual, a menos que sejam feitas por escrito".
Cerca de 50 países, entre os quais Reino Unido, Estados Unidos da América, Canadá e Países Baixos, emitiram, mais tarde, uma declaração em que expressaram a sua "profunda preocupação" sobre a forma como a OMS tem lidado com o abuso sexual.
Em maio, a OMS reconheceu que a sua resposta às suspeitas de abusos sexuais envolvendo funcionários na RDCongo foi "lenta".
Alguns funcionários da OMS mostraram-se insatisfeitos com a forma como a agência lidou com as reclamações.
"Não podemos dar-nos ao luxo de ignorar os sinais de fracasso sistemático e repetido da nossa organização para evitar tais alegados comportamentos e para os abordar de forma justa e atempada", escreveu o comité de pessoal da OMS num 'email' ao pessoal e aos quadros superiores, no mesmo mês.
A décima epidemia de Ébola, a segunda mais mortífera de sempre e que atingiu o país entre agosto de 2018 e junho de 2020, provocou 2.287 mortes em 3.470 casos oficiais.
O vírus Ébola, que provoca febres altas, vómitos e diarreias, foi identificado pela primeira vez em 1976 na RDCongo e deve o seu nome a um rio no norte do país, perto do qual teve origem o primeiro surto.
O Ébola é transmitido entre humanos através de fluidos corporais como sangue ou fezes e tem uma taxa de letalidade muito elevada, que varia entre 50% e 90%, de acordo com a OMS.
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