"A Esquerda Unida não vai tolerar que nenhuma verba financie um Estado genocida. Não é suficiente pedir explicações. (...) O PSOE [Partido Socialista] abriu a maior crise desde que formámos o Governo em 2023", disse o líder da Esquerda Unida (IU, na sigla em espanhola), Antonio Maíllo, em declarações a jornalistas em Valladolid.
Também o líder parlamentar da IU, Enrique Santiago, admitiu a possibilidade de o Somar sair total ou parcialmente do Governo e defendeu a demissão de dois ministros socialistas, a da Defesa, Margarita Robles, e o da Administração Interna, Fernando Grande-Marlaska, que autorizou o contrato de compra de balas a Israel, no valor de 6,6 milhões de euros, destinadas a serem usadas pela força policial Guarda Civil.
Para os dirigentes da IU, esta compra de munições, contrariando um compromisso público do Governo, soma-se ao anúncio de terça-feira do primeiro-ministro, Pedro Sánchez, de que Espanha aumentará os gastos com defesa até 2% do Produto Interno Bruto (PIB) já este ano, algo de que o Somar também discorda.
Enrique Santiago acusou o PSOE de estar a entrar numa "dinâmica muito perigosa" ao impor decisões "de maneira unilateral e sistematicamente" no seio do Governo em matéria de segurança e defesa.
"É uma situação muito grave", afirmou o dirigente da IU, numa conferência de imprensa em Madrid.
O Somar tem cinco ministros no Governo liderado pelo socialista Pedro Sánchez. A IU, em concreto, tem uma ministra, Sira Rego, que tem a pasta da Juventude e Infância e é filha de pai palestiniano.
Sira Rego enviou hoje uma carta ao ministro da Administração Interna a pedir que seja cancelada a compra das balas a uma empresa isabelita, num texto em que considera "de uma gravidade extrema" que se tenha concretizado este contrato "sem qualquer tipo de explicação em público ou no seio do Governo".
A dirigente do Somar com maior protagonismo e peso no Governo é Yolanda Díaz, ministra do Trabalho e uma das vice-presidentes de Pedro Sánchez, que hoje não falou em crise na coligação ou na possibilidade de abandonar o cargo, mas considerou estar em causa uma "violação flagrante dos acordos" assumidos no seio do Governo e pediu explicações ao colega da Administração Interna, assim como um recuo na compra das balas a Israel.
O Ministério da Administração Interna confirmou hoje que avançou com a aquisição de 15,3 milhões de balas a uma empresa de Israel, apesar do embargo de compra de armas a este país anunciado pelo Governo espanhol, por causa da guerra em Gaza, e de em outubro de 2024 o executivo ter garantido que ia cancelar este contrato em concreto, depois de ter sido noticiado que a Guarda Civil tinha adjudicado a aquisição a uma empresa israelita.
Segundo fontes oficiais do ministério citadas hoje por vários meios de comunicação social espanhóis, o Governo tentou cancelar a adjudicação, mas acabou por avançar com a compra seguindo um parecer da Advocacia Geral do Estado, um órgão que, em Espanha, está integrado na estrutura do Governo e que noutros países, como Portugal, está dentro das competências do Ministério Público.
A Advocacia do Estado recomendou que não fosse rescindido o contrato atendendo ao custo que teria por causa da "fase adiantada" de operacionalização em que já estava.
A adjudicação final do contrato foi publicada oficialmente na sexta-feira passada, feriado nacional, noticiou hoje a rádio Cadena SER.
Antes de a Cadena SER ter divulgado a notícia da compra de balas a Israel, Yolanda Díaz garantiu, numa entrevista à televisão pública espanhola (RTVE) hoje de manhã, que a coligação de Governo "goza de muito boa saúde", apesar das discrepâncias em matéria de gastos com a defesa.
Yolanda Díaz reiterou que o Somar defende um novo modelo de defesa e segurança europeias, o que não é sinónimo de "somar orçamentos" nacionais, sublinhando que os países da União Europeia no conjunto já têm orçamentos destinados à defesa que são três vezes os da Rússia.
"O Governo de coligação progressista goza de muito boa saúde, vamos concluir a legislatura", garantiu a dirigente do Somar.
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