Os bispos católicos da Venezuela alertaram hoje para o facto de a covid-19 e as crises da economia e democracia no país estarem a levar a população "a uma situação dramática".
"Dois anos após o início da pandemia causada pela covid-19 (...) Para além de causar sofrimento, dor e morte entre a população, a pandemia aprofundou os males que já afligiram os venezuelanos no passado", sublinhou a Conferência Episcopal Venezuelana (CEV) num comunicado.
Segundo a CEV, os venezuelanos "vivem uma situação dramática e extremamente grave devido à deterioração do respeito pelos seus direitos e pela sua qualidade de vida, submersos numa pobreza crescente e sem ninguém a quem recorrer".
"É um pecado que clama ao céu querer manter o poder a todo o custo e tentar prolongar o fracasso e a ineficiência destas últimas décadas: é moralmente inaceitável!", criticaram.
Os bispos denunciaram "tristes e escandalosas realidades" como "o desmantelamento das instituições democráticas e das empresas estatais", o "êxodo dramático da emigração forçada" de seis milhões de venezuelanos, especialmente jovens em idade produtiva, e a pobreza da maioria do povo, com particular ênfase na subnutrição entre as crianças e situações de injustiça vividas pelos idosos".
Há ainda "danos psicológicos, morais e espirituais" que passam pela "perda da liberdade individual e social, em formas facilmente percetíveis como perseguição, prisão, tortura ou expatriação devido a problemas políticos", acrescentaram.
"Há um objetivo subjacente: transformar o ser humano, criado por Deus como um ser livre e responsável, num simples executor de centros idolátricos de poder", nota-se ainda no documento.
No económico, os bispos disseram que se está "a assistir a uma grande contradição", porque enquanto "a economia está atolada em grandes deficiências que impedem um trabalho decente e um salário justo, enormes investimentos estão a ter lugar no país".
Estes investimentos "beneficiam apenas algumas pessoas ou grupos" em áreas "não são acessíveis à maioria empobrecida da população" como "os casinos e casas de jogo, 'bodegones' [lojas de produtos importados], restaurantes e hotéis, edifícios e casas ostentosas", destacaram.
Para a Igreja Católica, "o luxo e o desperdício que ostentam uns poucos ofende a Deus e aos irmãos, mas ainda mais nesta época de pandemia e de crise global no país".
No documento chama-se a atenção para a crise educativa que se generalizou, "causando uma profunda deterioração com graves repercussões nas condições em que estudantes e professores realizam as suas atividades, na qualidade do seu desempenho e expetativas".
"Sem educação de qualidade, não há transformação. Muitos professores emigraram por causa dos salários de miséria, insuficientes para sustentar as famílias ou para continuar a sua educação", explica-se no documento.
Segundo a CEV, a Venezuela está "numa grave crise global e democrática (...) os pobres são postos de lado pelo regime político para dar relevância a um sistema ideológico exclusivo, perdendo-se o sentido da democracia como poder do povo, uma vez que é substituída por elites e grupos reduzidos que assumem um poder populista e autocrático, que controlam todos os poderes públicos e militares, dependendo cada vez menos da legitimidade eleitoral e com a astúcia de retirar do seu seio os contrapesos institucionais ou políticos".
"Quando uma ideologia se antepõe como um sistema de poder que viola os direitos humanos e rejeita a dignidade da pessoa, gera injustiça e violência institucional", explicaram.
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