O Índice de Perceção da Corrupção (IPC), organizado pela organização Transparência Internacional (TI), classifica 180 países e territórios pelos níveis de perceção da corrupção no sector público, numa escala de zero (altamente corrupta) a 100 pontos (limpa da perceção de corrupção).
A média da África Subsariana é de 33 pontos, a mais baixa do mundo, e 44 países classificam-se abaixo dos 50 pontos. Entre os países lusófonos, Portugal surge no índice na 33ª posição com 62 pontos, seguido por Cabo Verde (39ª posição, 58 pontos); São Tomé e Príncipe (68ª posição, 45 pontos); Timor-Leste (82ª posição, 41 pontos); Angola (136ª posição, 29 pontos), Guiné Bissau (162ª posição, 21 pontos) e Guiné Equatorial, que ocorre na 171ª posição, com apenas 17 pontos, e merece algumas considerações particularmente críticas no relatório anual da organização não-governamental (ONG) sediada em Berlim.
Angola - que no IPC 2021 tem 29 pontos, mais 7 pontos desde o índice de 2012 - regista "uma melhoria significativa" na sequência da eleição do Presidente, João Lourenço, em 2017, que tomou medidas significativas para quebrar a corrupção, assinala o relatório da TI.
"As autoridades têm levado a cabo investigações de corrupção de alto nível a membros da antiga família dominante, entre eles, a filha do ex-presidente e ex-chefe da companhia petrolífera estatal Sonangol, Isabel Dos Santos -- exposta pela investigação 'Luanda Leaks' e recentemente indicada pelo governo dos EUA por 'corrupção significativa'", assinala a Transparência Internacional.
O relatório ressalva, porém, outra circunstância: "As investigações raramente são abertas noutros casos, levantando dúvidas sobre a existência de justiça seletiva".
A organização sublinha mesmo que "num inquérito de 2019, 39 por cento dos angolanos disseram que o Presidente estava a utilizar a luta contra a corrupção como um instrumento contra rivais políticos e a maioria disse também que aqueles que denunciaram corrupção correm o risco de retaliação".
No outro lado do espectro, a Guiné Equatorial estagnou no fundo do IPC com 17 pontos, e o país "continua a ser uma cleptocracia", acusa o relatório, que ilustra a recente acusação.
O relatório da TI dá relevo à investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla em inglês), cujo projeto "Organized Crime and Corruption Reporting Project" acusou no início do ano Gabriel Mbega Obiang Lima, filho do Presidente Teodoro Obiang e ministro para as Minas e Hidrocarbonetos da Guiné Equatorial, de "desviar para o estrangeiro milhões provenientes de fundos estatais e subornos".
O texto da Transparência Internacional saúda, por outro lado, a decisão definitiva da justiça francesa, cuja sentença em julho último determinou o confisco de 150 milhões de euros em bens arrestados em França a outro filho do chefe de Estado da Guiné Equatorial, o vice-presidente 'Teodorin' Obiang.
"Foi feita alguma justiça no caso de outro membro da família Obiang", assinala a Transparência Internacional, num processo judicial em que a organização fez parte do conjunto de entidades queixosas.
O relatório da Transparência Internacional faz uma referência a outro país da lusofonia, o Brasil, na pessoa do seu Presidente, Jair Bolsonaro, que "usou a luta contra a corrupção como bandeira de campanha para atrair um eleitorado desiludido com a política tradicional, cansado da corrupção e a exigir o respeito pelos direitos humanos".
Porém, "ao contrário das promessas", não só a TI não regista "progressos na luta contra a corrupção", como assinala a tomada de "medidas antidemocráticas, violadoras dos direitos e regressivas no combate àquele mal", de acordo com o texto, que não pormenoriza as mesmas.
Quanto à África Subsariana, em termos gerais, a TI sublinha que, de acordo com os últimos inquéritos do Afrobarómetro, a maioria da população africana acredita que a corrupção está a aumentar, ao mesmo tempo que expressa insatisfação com a forma como a democracia funciona.
"Isto não é surpreendente", assinala a TI, explicando que "a corrupção persistente tem andado de mãos dadas com mudanças inconstitucionais de poder em várias partes do continente".
Noutro domínio, também nesta região do mundo os governos impuseram restrições desproporcionadas às liberdades civis em muitos países - muitas vezes sob o pretexto de conter a expansão da pandemia de covid-19.
"Os resultados do IPC 2021 devem servir como um alerta para as sociedades de toda a África Subsariana. A magnitude dos desafios da corrupção exige as respostas mais arrojadas de sempre", defende a TI.
"Os governos devem reconhecer que o progresso sustentável na luta contra a corrupção só pode ser alcançado se forem garantidos os controlos societais e institucionais do poder", acrescenta.
A pandemia de covid-19, por outro lado, "não pode ser usada como desculpa para os governos restringirem o direito das pessoas à informação ou à liberdade de expressão", acrescenta a ONG.
Os líderes de toda a África Subsaariana "devem envidar esforços para acelerar a recuperação de ativos" e aumentar novamente a ação global contra os fluxos financeiros ilícitos, ajudando a evitar a fuga de capitais, "para que os recursos naturais e os fundos públicos possam ser utilizados para apoiar as pessoas que vivem na região, não as elites", sugere a TI.
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