O Idai foi um dos ciclones mais violentos de sempre no hemisfério sul desde que há registos meteorológicos fiáveis, mas, localmente, aquele bairro foi mais massacrado desta vez, arrasado pela corrente dos rios, contam à Lusa vários sobreviventes.
A tempestade Ana já fez, pelo menos, 20 mortos em Moçambique, seis dos quais em Tete, num balanço ainda por terminar.
Uma corrente do rio Revuboé, um dos que delimita Chingodzi, virou do avesso centenas de casas e campos agrícolas, agora mergulhados num mar de lama, onde Trinital Amade, camponês de Moatize, tenta recuperar o milho de uma horta por onde parece ter passado um rolo compressor.
"Essa água era muito violenta, tinha mais corrente do que em 2019", descreve à Lusa, no local ao qual regressou pela primeira vez após a enxurrada.
No campo agrícola, tenta remover lama, caniço, postes de energia e condutores elétricos, uma amálgama arrastada após a tempestade.
A horta fica a poucos metros do local em que viaturas de uma comitiva governamental foi arrastada e não distante de onde foi encontrado o corpo do administrador do distrito de Tete, José Mandere.
Na outra margem do rio Revuboé, em Nhakumbi, Anastácia Nicolau lembra que em 2019 a corrente não chegou a inundar a sua casa, construída por cima de um ninho de térmitas, para ficar mais alta.
Mas, desta vez, só conseguiu salvar a filha e uma pasta com documentos.
"Mesmo que fosse um homem grande" não conseguiria enfrentar a corrente, descreve Anastácia Nicolau, numa alusão a pescadores e canoeiros que tentavam ajudar pessoas no curso do rio, bem como um militar, mas que não sobreviveram à fúria das águas.
"Aquela água veio com muita pressão: começou no rio Revuboé, como ondas a estragar casas e à frente as pessoas a correrem, para se salvarem" conta.
Carolina Paulo, que também tem lembranças cruéis do ciclone Idai, diz que a força da tempestade Ana foi pior do que se poderia imaginar.
"A água arrastou pessoas", explica a empregada doméstica, abrigada em tendas da Cruz Vermelha num espaço improvisado no pátio do Instituto Industrial de Tete.
De acordo com as Nações Unidas, entre 2016 e 2021, o país enfrentou duas grandes secas e oito tempestades tropicais, incluindo os grandes ciclones Idai e Kenneth, em 2019, que num período de seis semanas afetaram 2,5 milhões de pessoas.
A época chuvosa de 2018/2019 foi das mais severos de que há memória em Moçambique: 714 pessoas morreram, incluindo 648 vítimas dos dois maiores ciclones de sempre a atingir o país.
Segundo a ferramenta de avaliação de risco de desastres Inform, Moçambique ocupa o nono lugar entre 191 países quanto à vulnerabilidade a perigos, exposição a riscos e falta de capacidade de resposta.
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