Uso do Pegasus "é uma afronta à privacidade e à liberdade de expressão"

A alta-comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, considerou hoje que o uso de programas de espionagem como o Pegasus ou o Candiru "é uma afronta à privacidade e uma obstrução à liberdade de expressão".

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Lusa
03/05/2022 13:09 ‧ 03/05/2022 por Lusa

Mundo

Michele Bachelet

Num discurso gravado por ocasião do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, que hoje se assinala, Bachelet lembrou que o uso crescente desse tipo de programas de vigilância "levou à prisão, intimidação e até assassinato de jornalistas", colocando também em risco as suas fontes e famílias.

"O 'software' Pegasus está a ser usado em pelo menos 45 países, muitas vezes de forma completamente secreta e fora de qualquer enquadramento legal", disse no discurso proferido num evento comemorativo do Instituto de Pós-Graduação de Estudos Internacionais de Genebra que contou com a presença dos dois recentes vencedores do Prémio Nobel da Paz, os jornalistas Maria Ressa (Filipinas) e Dmitri Muratov (Rússia).

A alta-comissária referiu ainda que muitos jornalistas tiveram de recorrer à autocensura devido à crescente utilização deste tipo de ferramentas de vigilância, e pediu uma moratória sobre a sua utilização, exportação, venda e transferência.

"Peço a todos os Estados que adquiram este tipo de tecnologia de vigilância que o façam em conformidade com os padrões de direitos humanos e que se perguntem se são ferramentas legais, necessárias e proporcionais face aos riscos que acarretam", sublinhou.

Bachelet pediu também regras para o uso destas tecnologias, dada a quase inexistência de limitações no mercado atual, criando legislação que permita que as empresas que as desenvolvem possam ser responsabilizadas, exigindo, assim, maior transparência.

"Não é apenas uma obrigação dos Estados, também encorajo as empresas privadas de vigilância a expressarem publicamente o seu compromisso de respeitar a liberdade de expressão e a privacidade", acrescentou.

A responsável das Nações Unidas pelos direitos humanos lembrou ainda que muitos jornalistas continuam a enfrentar sérios riscos, especialmente aqueles que trabalham em zonas de conflito, em países onde o espaço cívico é muito restrito ou onde os níveis de crime organizado são muito elevados.

Bachelet lembrou que, apesar de o número jornalistas assassinados ter caído para 55 no ano passado, o número de detidos subiu para pelo menos 293.

"A impunidade continua e uns chocantes 87% dos assassínios desde 2006 continuam sem resolução", lamentou, referindo-se a crimes cometidos contra profissionais da imprensa.

A utilização indevida do Pegasus tem sido noticiada nos últimos meses, com a última atualização a acontecer na segunda-feira, quando um relatório do Centro de Criptologia Nacional informou que os telefones móveis do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, e da ministra da Defesa, Margarita Robles, foram alvo de escutas "ilícitas e externas".

Segundo o ministro da Presidência do Governo espanhol, Félix Bolaños, verificaram-se duas intrusões no telemóvel de Pedro Sanchéz em maio de 2021 e uma escuta ao telefone móvel de Robles em junho do ano passado.

A "intervenção ilegal" foi confirmada na sequência de uma investigação que ainda está em curso sobre as comunicações de todos os membros do Governo espanhol.

Fabricado por uma empresa privada israelita, o programa Pegasus só pode ser vendido e usado por governos e tem estado no centro de vários escândalos de espionagem contra políticos, jornalistas e defensores de direitos humanos em todo o mundo, nomeadamente Espanha, Marrocos e França. 

O programa, que só pode ser vendido após autorização do Governo de Israel, já foi proibido nos Estados Unidos.

Leia Também: Programa de espionagem Pegasus usado para espiar políticos de relevo

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