Esta semana, Trump compareceu em tribunal, pela segunda vez no espaço de dois meses, para responder sobre novas acusações relativas a 37 processo, por desvio de documentos classificados, declarando-se inocente e insistindo na tese de que está a ser alvo de uma perseguição política.
Trump - que se recandidata à Casa Branca em 2024 - tornou-se assim o primeiro ex-Presidente dos Estados Unidos a ser indiciado criminalmente pela justiça federal, por se ter apropriado ilegalmente de documentos confidenciais e ter dificultado os esforços do Departamento de Justiça para recuperar esses registos.
Nas horas seguintes ao momento de entrada de Trump no tribunal de Miami, algumas figuras de referência do Partido Republicano não esconderam o embaraço com a situação, incluindo o ex-secretário de Estado norte-americano Mike Pompeo, que criticou o ex-presidente por não ter corrigido o erro de ter desviado documentos classificados.
"Todos podemos cometer falhas, tendo levado documentos para lugares errados. Mas quando nos apercebemos disso, devemos devolvê-los de imediato", disse o chefe da diplomacia norte-americana durante o mandato presidencial de Trump.
Também o congressista Republicano Ken Buck, eleito para a Câmara de Representantes pelo influente estado do Arizona, deixou bem claro que não se sentiria confortável a apoiar alguém que fosse condenado judicialmente, no comentário aos processos de Trump.
Em abril, o ex-Presidente compareceu em tribunal em Nova Iorque para responder sobre acusações de utilização indevida de fundos de campanha para subornar uma atriz de filmes pornográficos, mas a comparência esta semana no tribunal em Miami envolve-se numa matéria bem mais sensível, que implica a possibilidade de ter sido posta em causa a segurança nacional.
O ex-Presidente tem ainda pendentes outros casos judiciais, nomeadamente um que envolve a sua responsabilidade na invasão do Capitólio pelos seus apoiantes, em 06 de janeiro de 2021, que terá particular impacto na opinião pública norte-americana.
Estes processos estão a dividir os líderes Republicanos, entre aqueles que desvalorizam a relevância dos casos judiciais, e partilham da versão de Trump de que tudo não passa de perseguição política, e aqueles que temem que o desenrolar das investigações prejudique a imagem do partido e comprometa a possibilidade de uma vitória eleitoral em 2024.
Após a audiência em Miami, o senador JD Vance, que foi apoiado por Trump nas eleições intercalares de 2022, não se coibiu de reagir às acusações ao ex-presidente, denunciando que este se tornou "a mais recente vítima do Departamento de Justiça, que se preocupa mais com a política do que com a aplicação da lei".
De igual forma, a candidata Republicana Nikki Haley, ex-embaixadora nas Nações Unidas no governo Trump, disse que o ex-presidente foi "imprudente com a segurança nacional", se as alegações na recente acusação forem verdadeiras.
Numa posição mais neutral ficou o líder da minoria Republicana no Senado, Mitch McConnell, que disse não querer comentar o mais recente processo judicial de Trump, alegando que não quer interferir nas eleições intercalares do seu partido.
Na semana passada, o ex-vice-Presidente Mike Pence, que também se propõe concorrer nas eleições intercalares no Partido Republicano, disse esperar que os procuradores federais não apresentassem acusações contra Donald Trump.
Na quarta-feira, um dia depois de Trump ter sido indiciado no caso dos documentos confidenciais, Pence descreveu as alegações como "um assunto muito sério" e aproveitando para se demarcar da atitude do ex-Presidente.
Alguns líderes Republicanos demonstram uma cada vez mais visível disposição para criticar Trump sobre a seriedade das acusações, que incluem o manuseio incorreto de segredos de Estado que, como comandante-em-chefe, foi encarregado de proteger.
Mas quem está no terreno das primárias tem mais cuidado nas referências críticas a Trump.
O governador da Florida, Ron DeSantis, principal rival de Trump nas primárias Republicanas, preferiu criticar o comportamento do Departamento de Justiça, dizendo que está ao serviço da Casa Branca e das ambições de reeleição do atual Presidente, Joe Biden.
Perante a popularidade de Trump entre os eleitores do Partido Republicano, os seus adversários internos temem desafiá-lo num terreno em que o ex-presidente se mostra muito à vontade, desvalorizando os riscos de uma condenação.
Contudo, figuras do partido, como Mitch McConnell e Pompeo têm chamado a atenção para o facto de estes casos judiciais poderem causar danos nos 'swing voters', os eleitores que com mais facilidade transitam entre o Partido Republicano e o Partido Democrata e que podem vir a ser decisivos para o desfecho das eleições presidenciais do próximo ano.
Por outro lado, o 'establishment' Republicano tentou e falhou em rejeitar a figura de Trump e a sua política divisiva durante grande parte da última década.
Mas, desta vez, o Partido Republicano enfrenta a possibilidade real de que um homem que foi sujeito a dois processos de 'impeachment' no Congresso e acusado de dezenas de crimes possa tornar-se o porta-estandarte do partido em 2024.
"Com base nos dados que estamos a coligir, mais de dois terços das pessoas que dizem apoiar Trump também são recetivas a argumentos de que ele é um candidato fraco, e que pode ter dificuldade em angariar novos eleitores", comenta Emily Seidel, líder de uma influente organização Republicana.
"E isso pode ser fatal para as nossas aspirações de tirar Biden da Casa Branca", concluiu Seidel.
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