Em entrevista à Lusa, o chefe de gabinete adjunto da Presidência da Ucrânia, Ihor Zhovkva, lembrou que no verão passado o chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, deixou a garantia de "promover bons contactos" entre os seus homólogos brasileiro, Lula da Silva, e ucraniano, Volodymyr Zelensky, o que agora volta a ser referido a propósito do Plano de Paz proposto por Kyiv.
Segundo o responsável de política externa da Bankova (Presidência ucraniana), Zelensky e Lula da Silva tiveram "uma reunião muito positiva e proveitosa" em Nova Iorque, durante a última Assembleia-Geral da ONU, sustentando que a Ucrânia precisa do Brasil, membro do grupo BRICS (com Rússia, Índia, China e África do Sul), e de outros países do chamado sul global, para a Cimeira da Paz que está a ser planeada para um futuro próximo.
"O meu Presidente [Zelensky] chegou a um acordo com a Suíça para realizar a primeira Cimeira Mundial de Paz, e contamos certamente com a participação de Portugal", referiu, bem como os países do sul global, entre os quais o Brasil, cujo Presidente tem defendido o fim das hostilidades na Ucrânia e a abertura de um processo negocial, até agora rejeitada por ambas as partes.
Ihor Zhovkva aludiu às "boas relações históricas" de Portugal com o Brasil e com outros países da região da América Latina, com vista "convencer os seus dirigentes países de que esta é a única fórmula de paz que pode trazer paz" ao território da Ucrânia. "Não é possível utilizar fórmulas provenientes de outros países", vincou.
"É por isso que o meu Presidente, ao falar com os líderes do sul global, os convenceu de que esta é uma fórmula de paz que é aplicável e que pode ser instrumental durante esta primeira cimeira de paz", referiu, esperando que, após as discussões, seja possível alcançar um plano de ação e implementar esta fórmula.
Segundo o responsável da Presidência ucraniana, estes países, em conjunto, "podem exercer uma pressão coletiva sobre a Rússia", frisando que o Kremlin "tem medo da força e tem medo de uma voz unificada" e foi isso que "recebeu como resposta à sua agressão aberta contra a Ucrânia em 2022", ao contrario do sucedido oito anos antes, no seguimento da anexação da Crimeia e ocupação de parte do Donbass (leste).
"Portanto, agora os países têm de se unir para pôr fim a esta guerra", apelou o responsável ucraniano, adicionando que os motivos são óbvios para a Ucrânia, "porque o seu povo está a morrer", mas deveriam sê-lo igualmente para o resto do mundo.
Ihor Zhovkva referiu que, quando Volodymyr Zelensky esteve em Jeddah no ano passado para conversações sobre o seu Plano de Paz, vários líderes do mundo árabe expressara-lhe que "também estão a sofrer por causa da agressão russa contra a Ucrânia" o mesmo se verificou nos encontros que manteve com o Presidente argentino, Javier Milei, e outros dirigentes latino-americanos e também africanos.
Todos os países estão a sofrer de vários modos com a invasão da Ucrânia, seja nas cadeias de abastecimento, nos aumentos de preços ou na disponibilidade de recursos energéticos, avaliou e, por isso, "toda a comunidade internacional deve unir-se e dizer basta" a Moscovo.
"Um país nuclear não deve ditar as regras ao resto do mundo, não pode chantagear um país não nuclear, que é a Ucrânia", afirmou Zhovkva, insistindo que, "se todos os países exercerem pressão coletiva sobre a Rússia, para que não utilize instrumentos de agressão noutros domínios, e não apenas no campo de batalha, isso terá resultados".
O chefe de gabinete adjunto avaliou que hoje a consciencialização para a ameaça russa é superior à verificada nos primeiros momentos da invasão encetada há quase dois anos, o que se deveu também à "forma incansável" como Zelensky tem dialogado com dirigentes do mundo inteiro, "apesar do desejo russo ou da narrativa russa de que o mundo vai desviar os olhos da Ucrânia após os acontecimentos no Médio Oriente".
Desde o início do conflito entre Israel e o movimento islamita palestiniano Hamas, iniciado em 07 de outubro do ano passado, "a Ucrânia e Presidente ucraniano mostraram a sua posição clara", na medida em que "têm consciência do que é o sofrimento de civis" durante uma guerra.
"O meu Presidente reiterou claramente a sua posição de que o que não pode acontecer na guerra é que os civis estão a sofrer, incluindo as crianças", comentou, assegurando que Kyiv mantém a sua atenção em relação à região do Médio Oriente.
Ihor Zhovkva reconheceu que a atenção ao conflito ucraniano pode ter sido parcialmente desviada pela guerra na Faixa de Gaza, mas apontou que, nas conversações com as lideranças norte-americanas, por exemplo, é sublinhado que "os Estados Unidos apoiarão a Ucrânia e podem apoiar Israel e outros países" em simultâneo.
"Quando olhamos para a avaliação de quem está mais satisfeito no que respeita à evolução dos acontecimentos no Médio Oriente, verificamos que se trata do mesmo país", analisou, referindo-se à Rússia.
As atenções estão agora recentradas, reiterou, o que é mensurável no financiamento de 50 mil milhões de euros a Kyiv, recentemente aprovado pelos 27 estados comunitários europeus em Bruxelas, apesar da ameaça de veto da Hungria.
Isso significa que "o cálculo russo de que poderia desmantelar a União Europeia falhou" e o mesmo deverá suceder em relação ao pacote de apoio de cerca de 60 mil milhões de dólares (56 mil milhões de euros) de ajuda norte-americana, que se encontrava bloqueado há meses no Congresso em Washington, devido à resistência de uma minoria de congressistas.
"Tenho a certeza absoluta de que este mesmo facto positivo irá acontecer nos Estados Unidos e isto não infundado", disse o responsável da Presidência ucraniana, mencionando vários contactos de Zelensky em Washington, com a Casa Branca e com as duas partes em ambas as câmaras do Congresso, "e nem um só representante expressou o desejo de não enviar um financiamento suplementar para a Ucrânia", pelo que "as disputas internas nos Estados Unidos serão resolvidas".
Estes avultados financiamentos são essenciais, antes de mais, para a assistência militar à Ucrânia, tratando-se de "um novo instrumento e uma nova 'arma' para ganhar a guerra", ao mesmo tempo que, no caso da ajuda UE, servirá para apoiar o sistema social e a balança de pagamentos na Ucrânia e os salários dos funcionários públicos.
"Portanto, somos sustentáveis com este dinheiro e é por isso que é muito importante que este ano tenhamos, pelo menos, o mesmo montante que tivemos no ano anterior", declarou Ihor Zhovkva, apontando igualmente outros apoios bilaterais essenciais para a sobrevivência da Ucrânia.
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