Na opinião deste especialista em política russa, Putin sabe que pode correr perigo se tentar sair voluntariamente do Kremlin porque, "no momento em que ele se demitir, entrega o controlo do destino ao sucessor".
"A tentação de usar Putin como bode expiatório ou mesmo como moeda de troca, estaria invariavelmente presente", explicou, durante um encontro com jornalistas hoje em Londres, incluindo a Agência Lusa.
Segundo este analista e académico, o chefe de Estado russo de 71 anos, reeleito na semana passada para um quinto mandato, "está agora numa posição em que vai ter de governar o máximo de tempo possível, até que o destino ou algum acontecimento específico o derrube".
Putin está no poder desde 2000, tendo ocupado o cargo de primeiro-ministro entre 2008 e 2012.
Em 2020 alterou a Constituição para permitir a sua reeleição, a qual poderá repetir dentro de seis anos e, assim, permanecer no Kremlin até 2036.
Galeotti, autor de vários livros sobre o líder russo, nomeadamente "Putin's Wars" ("As guerras de Putin", 2022) e "We Need To Talk About Putin" ("Precisamos de falar sobre Putin", 2019), diz que Putin "tal como tantos outros líderes autoritários, ao longo do tempo tornou-se numa caricatura de si mesmo" e o seu círculo está cada vez mais pequeno e envelhecido.
Perante uma economia sob pressão devido ao esforço na guerra e o elevado número de mortes, existe o potencial de um movimento protesto se acumular lentamente e ser catalisado subitamente, disse.
A rebelião liderada por Yevgeny Prigozhin, no ano passado, mostrou que "o controlo do aparelho de segurança por Putin não é tão sólido como se poderia supor" e o analista também considera "impressionante o facto de dezenas de milhares de pessoas terem comparecido no funeral de [Alexei] Navalny, não apenas nesse dia, mas noutros dias, sem que as autoridades as tenham impedido".
Na ausência de uma figura da oposição democrata, Galeotti apontou o nacionalista Igor Girkin, líder do "Clube dos Patriotas Zangados" e crítico de Putin, como alguém que poderá mobilizar um eventual levantamento.
"Atualmente não são um número grande, mas estão desproporcionadamente representados no seio das forças militares e de segurança", vincou.
Quanto à guerra na Ucrânia, o historiador argumenta que Putin terá de encontrar algo que possa mostrar ao país como uma vitória, pelo que poderá ser convencido a lançar uma nova vaga de mobilização militar "porque este é provavelmente o melhor ano para a Rússia definir o campo de batalha".
"Este é o ano em que os efetivos ucranianos estão fortemente sobrecarregados, especialmente depois das baixas na contraofensiva do ano passado, e os russos terão vantagem em termos de munições, tropas e de política, porque a ajuda continua num impasse em Washington e na Europa", vincou.
Ainda assim, Galeotti não acredita que as forças russas consigam tomar o país todo e considera que o pior cenário possível seria um avanço até ao rio Dnipro, que atravessa a Ucrânia e a capital, Kiev.
"Os russos podem ganhar algum território, mas não o suficiente para ser decisivo de alguma forma", estimou.
O historiador admite que o impasse continue durante mais dois anos, e avisa que "ambos os lados terão de sangrar muito antes que qualquer um dos países se mostre capaz e disposto a fazer concessões necessárias a alguma forma de paz".
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