Cheias em Porto Alegre. "Era como se fosse o início da pandemia"

O Notícias ao Minuto ouviu o testemunho de uma residente de Porto Alegre, cidade fortemente atingida por cheias que já fizeram mais de cem mortos no estado de Rio Grande do Sul.

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José Miguel Pires
09/05/2024 17:34 ‧ 09/05/2024 por José Miguel Pires

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Pelo menos 108 pessoas morreram devido às fortes chuvas que atingiram o sul do Brasil nos últimos dias. Dessas, 107 foram registadas no estado de Rio Grande do Sul, e uma outra no estado vizinho de Santa Catarina, também devido à intempérie que tem assolado a região. 

Segundo as autoridades do Rio Grande do Sul, citadas pela agência Lusa, contam-se 136 pessoas desaparecidas e 374 pessoas feridas devido às inundações, que afetam diretamente cerca de 1,5 milhões de pessoas e mais de 80% do território do estado.

O Notícias ao Minuto falou com uma residente da cidade de Porto Alegre, capital do estado de Rio Grande do Sul, onde a falta de água e a escassez de bens essenciais nos mercados é um desafio diário, bem como o medo e o receio de saqueios e um aumento da violência nas ruas, caso a rede elétrica da cidade falhe.

A água "tomou a cidade de um jeito que ninguém nunca viu na vida"

Aline Krenzinger, de 40 anos, vive no bairro de Petrópolis, na capital gaúcha, e relata uma longa lista de preocupações com as cheias que atingiram a cidade, onde vivem também vários familiares seus.

A água "tomou a cidade de um jeito que ninguém nunca viu na vida", disse, referindo que vários amigos tiveram de abandonar as suas casas no centro da cidade. "Porto Alegre foi inundada por baixo, os esgotos começaram a estoirar, os bueiros começaram a estoirar, então as águas começaram a subir muito", explicou.

Foi quando se voluntariou para ajudar equipas de resgate que realmente se "assustou". "Estás praticamente ilhado. Olhas para a frente, tem água, olhas para o lado, tem água, e não tens por onde sair", comentou.

Aline revelou, também, que das 23 estações de drenagem de água que Porto Alegre tem, só quatro estão a funcionar, "então 90% da cidade está desabastecida, não tem água".

"O governo local lançou um alerta para as pessoas racionarem a água porque iria faltar, isso causou um pânico na situação", continuou. Quando começaram a surgir os primeiros alertas de que o nível da água do rio Guaíba - que banha a cidade - iria subir intensivamente, Aline deslocou-se a um mercado para comprar água e bens essenciais, "mas o que se via era como se fosse o início da pandemia, em 2020".

"Via-se uma quantidade de pessoas a levar carrinhos e carrinhos cheios de água e papel higiénico. Faltou um senso de comunidade, porque muita gente está a precisar de água e não tem nem onde comprar", lamentou, assegurando que, atualmente, "não se encontra água mineral para comprar" nos mercados.

Quando há uma desistência de uma compra online, a água regressa para a prateleira do supermercado e "acaba em minutos"

"Virou produto de luxo, porque não tem. Há pessoas que vivem em prédios e nem têm caixa de água, dependem da água mineral para beber, para fazer comida, e não têm", acrescentou, detalhando situações inusitadas: Quando há uma desistência de uma compra online, a água regressa para a prateleira do supermercado e "acaba em minutos".

Água por todo o lado e medo de... saqueios

Para além das preocupações com a falta de água e com as inundações, Aline elenca um outro perigo que se corre, atualmente, nas ruas de Porto Alegre: o receio de saqueios, caso a rede elétrica da cidade falhe, levando a que os seus cidadãos fiquem às escuras e os sistemas de alarme comecem a deixar de funcionar.

"Hoje [quinta-feira], o meu pai ligou-me e disse que vai continuar lá porque está com medo dos saqueios. Se a água invade um local, têm de desligar a energia para não ter problemas. Só que estão a começar a haver saqueios, as pessoas aproveitam-se e saqueiam imóveis, lojas... então o grande medo é esse", disse.

Caso não houver luz, vamos sair, porque vai virar um caos. Vai ter muitos saqueios, muitos roubos. A polícia está mobilizada para os resgates, então não tem como cuidar

Na mesma onda, vem o receio da proliferação de 'fake news'. "O ponto que fiquei mais 'stressada' foi quando o meu tio disse que ia faltar a luz em Porto Alegre, que iam desligar a luz de forma geral, porque supostamente a água iria até às centrais de energia da cidade. Aí fiquei mesmo com medo, porque sem água e sem luz não tem como", alertou Aline.

A residente de Porto Alegre tem, aliás, um plano de contingência preparado com as suas irmãs, que vivem na mesma cidade. "Caso não houver luz, vamos sair, porque vai virar um caos. Vai ter muitos saqueios, muitos roubos. A polícia está mobilizada para os resgates, então não tem como cuidar".

Até ao momento, no entanto, a 'ameaça' não se cumpriu, mas as malas estão feitas, caso à falta de água se junte a falta de energia. Só que a fuga pode também ser, em si, um pesadelo. É que, a título de exemplo, Aline deu conta da atual situação numa das rotas de saída da cidade, que, numa situação normal, demoraria uma ou duas horas a percorrer.

"Agora, com a quantidade de pessoas que estão a sair da cidade, com medo, está a demorar-se oito, nove horas. Ainda correm o risco de haver um arrastão pelo caminho", alertou, concluindo: "Se falta a luz... no nosso prédio, o portão ficaria aberto, entra quem quiser, então essa é a preocupação. Caso falte a luz, a gente vai embora".

Sublinhe-se que autoridades e voluntários continuam a trabalhar arduamente para resgatar as pessoas que ainda estão isoladas devido ao alto nível das águas e que começam a sofrer com a falta de alimentos.

O forte temporal começou na segunda-feira da semana passada e continuou nos dias seguintes, causando grandes danos em estradas, pontes, residências e deixando grande parte da população gaúcha sem luz nem água potável.

Com 11 milhões de habitantes, o Rio Grande do Sul tem sido bastante afetado pelas mudanças climáticas. 

Leia Também: Inundações no sul do Brasil já fizeram 108 mortos

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