França. Quartier Latin vai a votos com medo da ingovernabilidade

Os habitantes do Quartier Latin, bairro histórico de estudantes em Paris, começaram hoje a ir às urnas pedindo que os partidos se entendam e formem uma coligação após as legislativas para impedir que o país se torne ingovernável.

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Lusa
07/07/2024 14:33 ‧ 07/07/2024 por Lusa

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França

Num dia nublado em Paris, com nuvens a ameaçar chuva, os habitantes do Quartier Latin começaram esta manhã a convergir para a Câmara Municipal do 5.º bairro da capital, à frente do Panteão francês, com muitas críticas à campanha feita pelos partidos nas últimas três semanas.

"Foi um espetáculo desolante, foram todos lamentáveis. Acho que ninguém esteve à altura dos desafios atuais, são só manobras eleitorais, foi uma campanha fraquíssima", critica à Lusa Véronique, de 62 anos, que considera que o país não devia estar orgulhoso da imagem que está a transmitir ao mundo.

Apesar das críticas a esta campanha relâmpago, a mais curta da história da Quinta República francesa, os eleitores franceses parecem estar mobilizados e a ir às urnas: segundo os dados do Ministério do Interior francês, a taxa de participação até às 12:00 (11:00 em Lisboa) foi de 26,63%, a mais elevada desde 1981 (28,3%).

Saído da assembleia de voto e com uma 'kippah' na cabeça, Yohannan, de 73 anos, considera que a campanha foi "rápida e intensa" e não ajudou a esclarecer os franceses, porque não houve tempo suficiente para que percebessem bem os argumentos dos diferentes partidos.

"Sou judeu e agora só espero que a União Nacional (Rassemblement National, em francês) não ganhe, porque conheço bem as suas origens e sei que são contra os judeus e o judaísmo", diz o senhor.

Ao medo da extrema-direita, Yohannan acrescenta também o receio de que a França saia das urnas ingovernável, "com três blocos que não se entendem" e, sobretudo, "uma cultura política avessa a compromissos e consensos".

"Vai-se tornar seguramente ingovernável. É bem provável que venha a ser uma grande confusão", concorda Marie, de 85 anos, que sai da assembleia de voto de óculos de sol e com um carrinho de compras, e assume que votou na candidata da coligação de esquerda, convencida pela neta.

Outros, como Julien, de 33 anos, são mais otimistas e consideram que uma configuração parlamentar mais fragmentada pode até ser benéfica para a democracia francesa, por obrigar os partidos a aprenderem a dialogar e a chegar a consensos.

"Há muitos países que têm coligações. Em Portugal já houve e não me parece que vocês se tenham tornado ingovernáveis. Acho que vai ser uma situação benéfica: não vai ser fácil, mas vai forçar os deputados a encontrar soluções e a pararem de se insultar uns aos outros", refere.

Um primeiro esboço desses eventuais entendimentos pós-eleitorais pode ter começado a desenhar-se precisamente durante esta campanha eleitoral, em que vários candidatos da coligação de esquerda e dos partidos do centro desistiram da sua candidatura para dar mais hipóteses aos candidatos considerados republicanos de derrotar a extrema-direita.

No círculo eleitoral do Quartier Latin, deu-se um caso paradigmático: o antigo deputado e líder parlamentar do partido de Macron, Gilles Le Gendre - que entrou em conflito com o partido devido à lei da imigração -, decidiu desistir e apelar ao voto na candidata da esquerda, contra o da coligação presidencial, conotado como sendo mais de direita.

Violette, de 85 anos, manifesta-se desiludida com a postura do seu ex-deputado, salientando que gostou muito do seu trabalho na Assembleia Nacional, mas considerando que o seu apelo a votar na esquerda "não o engrandece", por ser muita crítica da Nova Frente Popular (Nouveau Front Populaire, em francês).

"Para mim, o essencial era impedir que a União Nacional ficasse omnipresente no parlamento. Acho que isso está feito. Agora, acredito muito numa coligação, que vá dos republicanos mais até ao centro. Mas não quero que inclua os socialistas, sobretudo os da França Insubmissa", diz à Lusa a octogenária, que, como muitos neste círculo eleitoral, pede uma coligação, mas é prova viva da dificuldade de estabelecer pontes num ambiente polarizado.

Os franceses votam hoje na segunda volta das eleições legislativas francesas, que vai determinar a composição da Assembleia Nacional do país.

Leia Também: França. Embaixadora em Portugal destaca importância das eleições

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